Educação musical infantil

Existem muitas formas de ensinar música para as crianças. Pode-se começar com simples brincadeiras até chegar aos exercícios técnicos dos instrumentos musicais. Apresento algumas dessas alternativas para que a criança, com o apoio de um professor, ou de um familiar, desenvolva o seu aprendizado musical.

VIOLÃO

Trabalhar com notas naturais na primeira, segunda e terceira cordas, flexionando os dedos indicador e médio da mão direita alternadamente. Assim, ela aprenderá as notas sol e lá na terceira corda; si, dó e ré na segunda corda; mi, fá, sol e lá na primeira corda (sol – lá – si – dó – ré – mi – fá – sol – lá). Com esse grupo de notas naturais é possível tocar muitas melodias, o que dará ao aluno motivação para continuar estudando.

Arpejos simples dedilhados – blocos harmônicos palhetados

Arpejos dedilhados simples (ex.: p i m a // p i m a m i) em acordes fáceis como Em, A7, D7, etc..

Desenvolver os acordes utilizando a palheta para facilitar o aprendizado dos mesmos.

TEORIA MUSICAL COLORIR FIGURAS

TEORIA MUSICAL COPIAR FIGURAS

TEORIA MUSICAL CLAVE DE SOL

TEORIA MUSICAL EXPOSIÇÃO CASA DE CULTURA

Trabalhos desenvolvidos por alunos do projeto musical da Secretaria de Cultura do Município de Piraí – RJ. Apresentados em dezembro de 2017 na Casa de Cultura de Piraí, como parte do evento de encerramento anual.

CHOCALHO E CANTO ACOMPANHADO

Obs.: com crianças de qualquer faixa etária, é preciso ter muita paciência. Além disso, é muito importante ter alguém da família acompanhando as aulas.
A partir desses três exemplos básicos, é possível fazer variações ampliando muito o leque de material didático. Utilize-se da criatividade para produzir elementos que facilitem e motivem a criança.

DESENVOLVENDO O CANTO INFANTIL

Músicas com frases curtas e repetitivas favorecem o exercício do canto infantil, pois podem ser decoradas facilmente, tanto a melodia, quanto as palavras. No exemplo abaixo, um clássico da música brasileira, de Antônio Carlos e Jocáfi, com um refrão simples e alegre, na cadência do samba, diz: você abusou, tirou partido de mim, abusou.

Na sequência, a música modula para a tonalidade menor paralela, as frases são feitas com notas curtas e sílabas muito variadas, o que a torna difícil para a criança cantar, portanto, somente o refrão é objeto do nosso estudo.

Um refrão clássico e fácil como repertório infantil

O canto infantil prioriza canções singelas porque melodias com notas curtas, e em série, são difíceis de se cantar. Nesse caso a criança pode trocar sílabas, ou até mesmo palavras, como no vídeo abaixo. Mesmo assim devemos trabalhar essas canções com crianças.

A música de Djavan trabalhada como repertório infantil

A bossa de Tom Jobim trabalhada como repertório infantil

TECLADO COM AS DUAS MÃOS

No vídeo abaixo, a canção “Anunciação” – Alceu Valença, é exercitada com as duas mãos, para solo e acompanhamento. Observa-se que a postura das mãos ainda está em desenvolvimento, mas a canção já está em evidência rítmica.

PANDEIRO E CANTO

A canção cantada foi feita para a criança, o que a estimula a cantar, pois sabe que é um presente imaterial para ela. Neste exercício está dividido em duas tarefas: tocar o pandeiro na primeira parte da canção e cantar na segunda parte dela.

Pandeiro com movimento contínuo na ordem polegar, dedos, base e dedos, em cada quarto de tempo do compasso binário, que é tipicamente brasileiro.

O PANDEIRO – SAMBA

Pandeiro na ordem polegar, dedos, base e dedos, em cada quarto de tempo do compasso binário, com pausa de um tempo no meio da música. Neste exercício, da obra de Chico Buarque, “Gente Humilde”.

FLAUTA DOCE

Exercício com notas “naturais”, na ordem ascendente: mi, fá, sol, lá, si e dó; e descendente: dó, si, lá, sol, fá e mi. A flauta doce utilizada é do tipo germânica. As notas dó e ré, mais baixas ainda não fazem parte deste exercício devido ao maior grau de dificuldade gerado pelos furos duplos. Embora a maioria dos professores recomendem a flauta doce barroca, pode-se observar bons resultados com a flauta doce germânica também.

Alecrim Dourado – ainda sem usar os furos duplos

VASSOURINHAS E PANDEIRO

O uso das vassourinhas pode ser uma boa tática para o aprendizado musical, por sua sensibilidade coordenativa prática, bem como, sua sonoridade agradável e sutil. No exemplo abaixo, observamos sua aplicação no pandeiro, mas pode ser aplicada em outros instrumentos percussivos com pele. Observa-se a postura deve ser mantida sem apoiar os braços nas pernas, porém, ao impor muita rigidez pode desmotivar a criança.

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A formação das escalas explicada pelo método do relógio tonal

  1. Escalas diatônicas maiores e menores pelo relógio tonal 
  2. Escalas menores harmônica e melódica pelo relógio tonal
  3. Escalas pentatônicas maiores e menores pelo relógio tonal

 

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A relação entre dinheiro e ética

Todas as pessoas precisam de dinheiro para sua sobrevivência, principalmente no tempo do chamado capitalismo financeiro e do consumismo. Produtos e serviços de todos os tipos e valores são oferecidos massivamente pelos veículos de comunicação para todas as classes sociais. Para facilitar o acesso a esses produtos e serviços, os bancos oferecem seus empréstimos e financiamentos a juros altos maquiados por boa propaganda.

Partindo desta necessidade de ter o dinheiro para sobreviver nesse contexto, ou se adequar a ele, surgem os meios para se adquirir os recursos financeiros. Então, as pessoas passam a se relacionar com as fontes geradoras, e é neste ponto que surge a relação entre dinheiro e ética. Muitas dessas fontes podem fugir às noções éticas proporcionando, por meios escusos, benefícios indevidos que colocam o beneficiário às margens da legalidade, portanto, sujeito ao rigor das leis.

Por isso, toda pessoa deve preservar os valores éticos para todos os propósitos, inclusive na relação com o dinheiro.

As notas graves e agudas no canto – a voz humana: pressão, articulação e vibração

Introdução

Foto: Cottonbro no Pexels

A qualidade e as propriedades da voz humana são resultantes de um amplo e complexo conjunto natural de fatores. Entretanto, este artigo trata resumidamente da mecânica que envolve a laringe quando a pressão do ar enviado pelos pulmões passa por ela gerando as vibrações das pregas vocais no processo de produção de frequências baixas e altas correspondentes às notas graves e agudas.

Objetivo

O objetivo é proporcionar àqueles estudantes da arte de cantar, que se dedicam objetivamente à prática, um conhecimento mínimo sobre esse amplo, complexo e sensível sistema que envolve a produção da voz humana. Para que tomem os cuidados necessários para a boa manutenção de todo o sistema, inclusive psicológico. De forma geral, orientar aos alunos que não receberam informações, ou que as receberam distorcidamente, e ainda, aos cantores e cantoras que se guiam unicamente pelo talento e pela intuição.

A produção do som

Cada frequência da voz tem sua posição na laringe estabelecida por meio da ação da musculatura intrínseca da laringe, que é responsável pela resistência do ligamento vocal na modulação da frequência. Isso ocorre sobre a pressão do ar que é enviado pelos pulmões. Em outras palavras, a vibração que produz este som realiza-se pela mecânica resultante da tensão muscular e pressão do ar equilibradas, sob o comando de um arco estimulado por controle periférico.

A laringe

A perfeita movimentação dos músculos da laringe se refletirá no resultado produzido nas pregas vocais. Portanto, a saúde da laringe é fundamental para o perfeito funcionamento desse sistema, bem como, a de todos os demais sistemas integrados a ele. A laringe é responsável por parar o fluxo de ar durante a deglutição impedindo que líquidos e alimentos entrem na via respiratório, ela é um canal de ar respiratório e, além disso, possui função vocalizadora.

A prega vocal

A prega vocal constitui-se do músculo vocal e da mucosa vocal. As pregas vocais, comumente chamadas de cordas vocais, possuem mobilidade e elasticidade capazes de gerar vibração com o fluxo de ar enviado pelos pulmões. Elas esticam ou relaxam pela ação de músculos adequados e atuam integradamente com articuladores, como lábios, língua, palato etc., permitindo a emissão de sons e palavras. As cordas vocais atuam como válvulas de ar.

A glote

É simplesmente a abertura entre as duas pregas vocais que são localizam em cada lado da parede interna da laringe, reguladora do fluxo de ar.

A produção de notas agudas

A produção de notas agudas se dá com um aumento da tensão das “cordas vocais” através da ação muscular, pela aproximação das cartilagens. Elas são alcançadas por diminuição do diâmetro faríngeo sob ação dos músculos constritores, também pela subida da laringe, e ainda, por alongamento das cordas vocais. As notas agudas são produzidas em alta frequência de vibrações nas pregas, elas são as notas altas.

A produção de notas graves

Para a obtenção das notas graves é necessário o encurtamento das pregas vocais, isso ocorre pela ação de um músculo extrínseco. As notas graves, ou baixas, são produzida em baixa frequência de vibrações nas pregas.

Conclusão

A pressão que o ar enviado pelos pulmões exerce na laringe, as articulações musculares e as vibrações nas pregas vocais, são os fatores que estão diretamente ligados à emissão das notas baixas e altas. O equilíbrio entre os fatores pressão, articulação e vibração, exige cuidados específicos e práticas adequadas.

REFERÊNCIAS

Emissão Vocal, Especialização em Canto, Suzana Vale, 2011

Falsas Cordas Vocais e as Cordas Verdadeiras, Júlio Doin Vieira, Revista Científica – Arquivos Catarinenses de Medicina.

Laringe, Márcio A. Cardoso e Ezequiel Rubinstein,  depto.icb.ufmg.br/dmor/anatmed/laringe.htm – em 14/01/2017

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Violão para inciante – noções básicas

Inicialmente é fundamental contar 4 tempos para cada acorde – 4 tempos é a fórmula mais usada. Cada tempo tem a mesma duração (aproximadamente 1 segundo – para exemplo). Pode tocar com uma palheta ou com as unhas dos dedos indicador, médio e anelar da mão esquerda.
Os acordes maiores são cifrados apenas com a letra correspondente a ele. Ex.: acorde de dó maior = C || acorde de mi maior = E
Os acordes menores são cifrados com a letra correspondente ao seu nome e com um m (eme) minúsculo ou um traço ( – ).
Os acordes são formados por três notas basicamente: fundamental, terça e quinta.
A fundamental dá nome ao acorde. Ex.: no acorde de dó a fundamental é a nota dó.
A terça é a terceira nota a partir da fundamental (primeira). Ex.: no acorde de dó a terça é mi, porque na escala a ordem é dó (1ª) ré (2ª) mi (3ª).
O diferencia o acorde maior do menor é a terça, pois ela pode ser maior ou menor. Para entender isso é preciso saber que existem sete notas musicais com intervalos (distâncias) entre si, essas distâncias, ou intervalos, são chamados de tons e semitons. Veja as doze notas e os intervalos:
DÓ (1 tom) RÉ (1 tom) MI (1/2 tom) FÁ (1 tom) SOL (1 tom) LÁ (1 tom) SI 1/2 (tom) DÒ.

A nota DÓ é a fundamental do acorde C
A nota MI é a terça do mesmo acorde C
Para saber se é maior ou menor somam-se os valores dos intervalos existentes entre a fundamental (dó) e a terça (mi) do acorde: DÓ (1 tom) RÉ (1 tom) MI = 2 tons.
Para acordes maiores a terça tem 2 tons
Para acordes menores a terça tem 1 tom e 1/2. Veja o exemplo: DÓ (1 tom) RÉ (1/2 tom) MIb (mi bemol)

A nota mib (mi bemol) está localizada entre as notas ré e mi: RÉ (1/2 tom) MIb.

Na verdade existem doze notas, porém, cinco delas não têm nomes definidos, elas recebem os nomes das notas vizinhas acrescidas do sinal # (sustenido) ou do b (bemol).

Para melhorar esse entendimento veja as aulas:
Pauta ou pentagrama com espaços e linhas suplementares – link
Intervalos – link

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A unidade de tempo não representa o andamento

Quando muda a unidade de tempo muda o valor de tempo das notas?
Caso queira uma resposta com sim ou não, eu respondo sim, porém, é preciso entender que a unidade de tempo não tem nenhuma importância musical se não for analisada juntamente com a unidade de compasso, ou seja, tem que se considerar o denominador em relação ao numerador.
Então, vamos considerar uma canção cujo compasso é 4/4, mas em cada compasso tem dois acordes durando dois tempos cada, suponhamos que seja um samba, mas você quer tocar como choro, por exemplo, acentuando igualmente os dois acordes de cada compasso. Como escrever isso no papel ou num editor digital como o MuseScore.

Leia e compare:

Original 4/4 C A7 | Dm G7 ||… numerador 4 = 4 tempos || denominador 4 = figura semínima

1ª adaptação 2/4 C | A7 | Dm | G7 ||… numerador 2 = 2 tempos || denominador 4 = figura semínima

2ª adaptação 2/2 C | A7 | Dm | G7 ||… numerador 2 = 2 tempos || denominador 2 = figura mínima

A diferença prática entre a versão original e as adaptações é a seguinte: na original os acordes C e Dm terão que ser acentuados, pois, eles estão no tempo forte de cada compasso, ou seja, no primeiro tempo, diferentemente dos acordes A7 e G7; e nas adaptações todos os acordes serão acentuados, pois, todos estão no tempo forte de cada compasso.
Eu expliquei com acordes para ficar mais fácil de entender e de explicar, mas com a melodia é a mesma lógica aplicada, o primeiro tempo de cada compasso é sempre mais forte que os demais.

E a diferença entre a 1ª e 2ª adaptação, é simples, no compasso 2/4 cada tempo corresponde a uma semínima, e no compasso 2/2 cada tempo corresponde a uma mínima, o que muda é só a figura escrita. Então, a nota que tinha uma semínima como figura de valor passa ter uma mínima, e consequentemente a nota que tinha uma colcheia como figura de valor passa a ter uma semínima, e assim acontece com todas as notas da melodia, ou seja, elas tem sua figuras de valores originais substituídas por outras figuras com o dobro de seus valores originais.

Entenda que essas adaptações não terão influência no andamento da canção, ou seja, na velocidade. O andamento não é regulado pelo signo de compasso.

Como descrever os valores das figuras nos compassos compostos

Em resposta a uma pergunta feita no dia 27 de setembro de 2016 na aula Fórmulas de compassos e figuras de valores musicais publicada em 25/04/2015.

Os compassos compostos são aqueles cujos tempos são acrescido de metade de seu valor original, isso torna cada tempo parecido com pequenos compassos ternários.
Por exemplo, no compasso simples 2/4, o numerador 2 sinaliza que o compasso é binário, e o denominador 4 sinaliza que a figura representativa de cada tempo é a semínima (para 2/4 temos 2 = binário e 4 = semínima).
Agora vamos transformar esse compasso binário simples em binário composto. Para isso comecemos acrescentando à cada tempo metade seu valor. Como vimos, no compasso 2/4 cada tempo é representado por uma semínima, logo, acrescentar metade de seu valor significa juntar a ela uma concheia, porque a colcheia vale metade da semínima.
Falta explicar a mudança na representação do numerador, ou seja, trocar o 2 pelo 6. Essa troca acontece simplesmente porque um compasso composto, na prática, possui uma quantidade de tempos três vezes maior que o compasso simples, qualquer que seja.
Então, o binário simples tem 2 tempos, e o binário composto tem 6 tempos.
Leio partitura a alguns anos e nunca precisei pensar em um terço de tempo, porque logo de início entendi que os compassos compostos devem ser analisados como múltiplos de tempos dos compassos simples, eles têm independência, pois são outros tipos de compassos.
Na execução de ritmos com compassos compostos acentua-se o primeiro tempo porque é regra comum a todos os compassos, mas é comum acentuar-se também os primeiros tempos de cada grupo de três. Assim: pensando no 6/8 como compasso de seis tempos, acentua-se o 1º e o 4º tempo, porém o 1º deve ser mais forte que o 4º. Isso ajuda a identificar, ou caracterizar, os compassos compostos, se são binário, ternário ou quaternário. Veja

1 2 3 4 5 6 —————- binário: acentua-se o 1º e 4º tempos;
1 2 3 4 5 6 7 8 9 ———– ternário: acentua-se o 1º, 4º e 7º tempos;
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 — quaternário: acentua-se o 1º, 4º, 7º e 10º tempos.

Em cada um deles, o 1º tempo deve ser mais acentuado que os demais.

Uma semínima pontuada sem um compasso de referência vale uma semínima e meia, ou seja, uma semínima acrescida de uma colcheia, porque o ponto aumenta metade do valor da figura pontuada.

Analisando o compasso de forma independente

Em 6/8 a semínima pontuada vale três tempos, ou seja, três colcheias, considerando que o compasso é de seis tempos. Mas o compasso 6/8 não é binário? Sim, mas é composto, logo não pode seguir o mesmo critério de análise.
Em 2/4 a semínima pontuada vale um tempo e meio, as mesmas três colcheias, lembrando que 2/4 é um compasso binário simples, isso quer dizer que possui dois tempos.
Exemplo de resumo: em 6/8 temos 6 colcheias, mas em 2/4 temos 2 semínimas. Em ambos os compassos, as figuras representativas podem se trocadas por outras de maior ou menor valor, obviamente para construir a melodia e o ritmo.

Ao analisar um compasso composto usando como referência seu relativo simples, core-se sempre o risco gerar embaraços que não correspondem à prática musical em qualquer gênero.

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Os modos gregos no estudo de improvisação na guitarra

Eu ainda não havia abordado este tema diretamente nas aulas que publico aqui porque não considero relevante para quem quer tocar um instrumento, desde o iniciante até o mais técnico e experiente. Todavia, são constantes as perguntas sobre o assunto, talvez por ser uma linguagem muito admirada pelos guitarristas atuais e pelos amantes da linguagem musical americana. Em cursos de música de nível acadêmico, aparece o assunto, talvez de forma mais teórica e histórica, porém, nos cursos livres voltados para a improvisação, passam-se a ideia de que entender os modos gregos é fundamental para solar e improvisar, e ainda mais, que é muito importante alterar ou adaptar os diagramas convencionais utilizados nas guitarras para fazer surtir os efeitos dos ditos modos gregos da teoria da improvisação. Alguns professores, principalmente de guitarra, costumam apresentar esse tópico como um estudo de nível avançado e complexo, causando no aluno uma ansiedade pela compreensão do assunto que o leva a gastar um precioso tempo numa busca frustrante que acaba causando ainda mais dúvidas. 

A mística dos modos gregos na improvisação

Os nomes são sete: Jônico, Dórico, Frígio, Lídio, Mixolídio, Eólico e Lócrio.

  • Nessa ordem eles estão diretamente ligados às escalas diatônicas maiores, ou seja: 1ª, 2ª, 3ª, 4ª, 5ª, 6ª e 7ª notas de quaisquer escalas maiores (lembrando que a 1ª nota é igual à 8ª, completando a escala). Então, em escala, temos:

Jônico = 1ª nota, Dórico = 2ª nota, Frígio = 3ª nota, Lídio = 4ª nota, Mixolídio = 5ª nota, Eólico = 6ª nota e Lócrio = 7ª nota.

  • Nessa ordem eles estão também diretamente relacionados com as escalas maiores harmonizadas, na seguinte progressão: I, IIm, IIIm, IV, V, VIm e VIIm(b5). Então, em escala harmonizada, temos: 

Jônico = I, Dórico = IIm, Frígio = IIIm, Lídio = IV, Mixolídio = V, Eólico = VIm e Lócrio = VIIm(b5)

Resumidamente, o que temos acima é a associação dos nomes gregos com as escalas em progressão melódica e harmônica. Ao meu ver, sem nenhuma utilidade do ponto de vista da improvisação. 

Vamos tomar como exemplo a escala de Dó maior para ilustrar com mais clareza:

Jônico = I = C , Dórico = IIm = Dm, Frígio = IIIm = Em, Lídio = IV = F, Mixolídio = V = G, Eólico = VIm = Am e Lócrio = VIIm(b5) = Bm(b5)

Análise dos modos no contexto da escala diatônica

Tomemos como exemplo a canção Espanhola do compositor Flávio Venturine tocada no tom Dó maior (escala). Ela começa com o acorde Fá maior (IV), então diz-se que ela começa ou está no modo Lídio, ou seja, o primeiro acorde a ser executado é o quarto do tom e não o primeiro. Em termos práticos isso significa que a escala principal a ser usada para criar frases improvisadas nesta canção continuará sendo a escala de Dó maior. Neste ponto pode-se criar uma complexa teoria ao afirmar que se deve utilizar a escala no modo Lídio ou Escala Lídia. Porém, pode-se também seguir uma regra básica e lógica que considera a melodia uma parceira da harmonia, em composição e improvisação. Alguns professores afirmam que é preciso tocar os diagramas começando pela nota correspondente ao modo. Por que eles ensinam assim: porque a nota melódica correspondente ao modo é também a primeira nota do acorde correspondente ao modo, ou seja, a escala a ser usada continua sendo a mesma, porém muda-se a nota inicial, obviamente seguindo o acorde. 

Análise da relação entre melodia e harmonia

Ao observar a melodia como parceira da harmonia, conclui-se que todas as notas da melodia estão ligadas diretamente aos acordes da harmonia. As frases da melodia destacam algumas notas basicamente de duas maneiras: pela iniciação ou pela duração. Essas notas destacadas estão sempre em sintonia com o acorde que as acompanham, e a forma mais clara de se fazer essa sintonia é dando destaque à nota fundamental do acorde que é a primeira nota dele, é aquela que o nomeia. Secundariamente, pode-se destacar outras notas do acorde como terça, quinta, sétima, etc, porém, quanto mais distante da primeira (fundamental) menor a percepção de elo entre melodia e harmonia. Assim sendo, para o acorde fá (F) a nota mais provável para se destacar é a própria nota fá em qualquer tom (escala). 

Análise dos modos no contexto das seções tonais

A seções tonais são formas de se analisar acordes secundariamente ao tom real, isso quer dizer que os acordes podem ser interpretados como se pertencessem a outro tom e não ao que a música foi composta. Por exemplo, em um compasso de uma música composta em Dó maior temos o acorde ré menor (Dm), obviamente a principal escala a ser usada na improvisação é a diatônica de Dó maior, porém, esse mesmo acorde pertence também aos tons de Si bemol maior (Bb) e Fá maior abrindo margem para que as escalas respectivas sejam usadas também como alternativa para improvisação sobre o acorde Ré menor. Assim sendo diríamos que podemos analisar esse Ré menor como Dórico (IIm em dó maior), Frígio (IIIm em Si bemol maior) e Eólico (VIm em Fá maior). Essas possibilidades utilizam notas atonais que podem gerar percepções desagradáveis causadas pela própria dissonância. Essas dissonâncias serão menos perceptíveis quando as frases forem de notas curtas ou quando a nota atonal for usada de passagem.

Análise de improvisação sobre acordes atonais

A análise seccional relacionada à escala a ser usada na improvisação quando o acorde ou um conjunto de acordes não pertencem ao tom da música proporciona melhor escolha da escala a ser empregada, uma vez que as notas da escala do tom real da composição não atendem às necessidades de relação sonora imprimida por esses acordes atonais.

As harmonias modais dos gregos

Os filósofos gregos procuravam encontrar nos modos das escalas uma associação com a moral e a ética. O trecho abaixo é um diálogo entre Sócrates e seu amigo Glauco em busca do melhor caráter expressado no canto e na melodia para aplicação na cidade imaginária que estavam construindo na obra A República (380 a.C.) de Platão.

Sócrates — Quais são as harmonias plangentes? Diz-nos, visto que és músico.
Glauco — São a lídia mista, a aguda e outras semelhantes.
Sócrates — Convém, pois, suprimi-las, não é verdade? Porque são inúteis para as mulheres honradas e, com maior razão, para os homens.
Glauco — Certamente.
Sócrates — Nada há mais inconveniente para os guardiães do que a embriaguez, a moleza e a indolência.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Quais são harmonias efeminadas usadas nos banquetes?
Glauco — A jânica e a lídia que se denominam harmonias lassas.
Sócrates — De tais harmonias, meu amigo, tu te servirás para formar guerreiros?
Glauco — De maneira nenhuma. Receio que não te restem senão a dórica e a frígia.
Sócrates — Não conheço todas as harmonias, mas deixa-nos aquela que imita os tons e as entonações de um valente empenhado em batalha ou em qualquer outra ação violenta, quando, por infortúnio, corre ao encontro dos ferimentos, da morte ou é atingido por outra infelicidade, e, em todas essas circunstâncias, firme no seu posto e resoluto, repele os ataques do destino. Deixa-nos outra harmonia para imitar o homem empenhado numa ação pacífica, não violenta mas voluntária, que procura persuadir, para obter o que pede, quer um deus por intermédio de suas preces, quer um homem por intermédio das suas lições e conselhos, ou, ao contrário, solicitado, ensinado, convencido, se submete a outro e, tendo por estes meios sido bem-sucedido, não se enche de orgulho, mas se comporta em todas as circunstâncias com sabedoria e moderação, feliz com o que lhe acontece. Estas duas harmonias, a violenta e a voluntária, que imitarão com mais beleza as entonações dos infelizes, dos felizes, dos sábios e dos valentes, estas deixa-as ficar.
Glauco — As harmonias que me pedes para deixar não são senão aquelas que mencionei há pouco.
Sócrates — Não precisaremos pois, para os nossos cantos e as nossas melodias, de instrumentos com muitas cordas, que reproduzem todas as harmonias.
Glauco — Não, por certo.
Sócrates — Nem tampouco precisaremos de fabricantes de triângulos, pedis e outros instrumentos de muitas cordas e harmonias.
Glauco — Não, aparentemente.
Sócrates — Admitirás em nossa cidade os fabricantes e os tocadores de flauta? Não é este instrumento que pode emitir mais sons, e os instrumentos que reproduzem todas as harmonias não são imitações da flauta?

A REPÚBLICA – 380 a.C. – PLATÃO
Leia: O CARÁTER DO CANTO E DA MELODIA NA ANÁLISE DE SÓCRATES – LINK
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Dicionário de acordes para contrabaixo

Modelos de acordes maiores e menores

Os iniciantes, quase sempre, tem dúvidas sobre a execução de acordes no contrabaixo. É comum pensarem que não se usam acordes nesse instrumento. Por isso, resolvi publicar esse pequeno dicionário para iniciantes no contrabaixo e que tem essa dúvida: tocam-se, ou não, acordes no contrabaixo? Os acordes são os mesmos para qualquer instrumento, porém, há diferenças na aplicação deles por vários fatores. No caso do contrabaixo, as notas graves são o fundamento desse instrumento, então é para isso que ele foi criado. Ao emitir várias notas gravas simultaneamente é possível que o ouvido não as identifiquem com clareza, perdendo o sentido sonoro musical, e, consequentemente, aproximando-se dos ruídos sonoros (leia: O som – link). Por isso, o mais comum é tocar as notas dos acordes de forma melódica, ou seja, alternadamente (arpejos melódicos). Entretanto, alguns contrabaixistas executam acordes no contrabaixo da mesma forma que se tocam no violão, utilizando um técnica tal que não permite que as notas graves do contrabaixo se misturem de forma desagradável. O contrabaixo é um instrumento de apoio a outros de características sonoras médias e agudas, por exemplo: guitarras, teclados, cavaquinho, etc. Os modelos abaixo são apenas alguns exemplos que servirão para o iniciante ter mais alternativas de movimentação no acompanhamento com seu contrabaixo.

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Escala natural para contrabaixo de cinco cordas em PDF – clique

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Mini dicionário de acordes para teclados

Acordes maiores e menores para execução com ambas as mãos

Os acordes a seguir são formados por três notas (tríades), essas três notas podem ser tocadas pelas duas mãos, isso proporcionará dobragem das notas, então teremos seis notas em pares distanciadas em oitavas, o que não muda o fato de serem tríades, porque as notas em oitavas são as mesmas, o que muda é a altura entre elas, mais agudas ou mais graves. Se fossemos analisar a diferença das oitavas utilizando medição em Hertz, poderíamos dizer que em relação a uma nota com frequência X (qualquer nota), uma oitava abaixo tem metade de sua frequência, e ainda, que oitava acima tem o dobro de sua frequência. veja mais detalhes nas seguintes aulas: Notas musicais (link) e O som (link).

São doze acordes maiores e doze menores, e a diferença entre maiores e menores está em uma nota apenas. Em termos visuais é fácil observar que a diferença está na segunda nota da estrutura do acorde (a nota do meio), porém, analisando a formação dos acordes, entendemos que é um intervalos é a terça. Entenda melhor em: Intervalos (link). Por exemplo, a diferença entre dó maior e dó menor é que o primeiro tem as notas dó, mi e sol, e o segundo tem as notas dó, mib e sol. Então o que os difere é a nota do meio, ou seja, a segunda nota visual mi e mib, que é chamada de terça, parque na formação do acorde há uma nota intermediária que não é usada, que é a nota ré. Em ordem escalar temos: dó ré mi fá sol, porém, somente dó, mi e sol são usadas para formar o acorde, segundo a regra de harmonia.

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Como “tocar de ouvido”, violão, teclado, baixo, etc.

Resolvi escrever este artigo porque muitos me perguntam sobre o assunto. Geralmente são iniciantes interessados em tocar em igrejas pentecostais, algumas vezes porque o ensaio não é possível ou não é uma prática comum nessas comunidades, o que gera a necessidade do músico se adequar para conseguir tocar nessas igrejas. Ao analisar as diversas dicas expostas na internet e outras que venho ouvindo ao longo da minha convivência com músicos experientes de muitas denominações de igrejas cristãs, percebi que não há objetividade nas informações, talvez pelo fato de não existir interesse pelo assunto por parte doas acadêmicos e também por não se ter literaturas técnicas específicas sobre o tema. Outro ponto importante é que as congregações têm repertórios que variam muito, acompanhando seus estilos religiosos, suas variações regionais e os domínios midiáticos. Baseado nessa carência, este trabalho objetiva sintetizar o assunto de forma clara utilizando-se de definições e conceitos universais, e negando parcialidades ou tendenciosismos naturais de minhas preferências, para que o músico interessado neste assunto saiba como proceder com segurança e alcançar o resultado que anseia, que é ter habilidades para tocar de ouvido em suas vivências musicais. Vamos às orientações:

Conhecer muito bem o repertório típico

Os ritmos predominantes no repertório pentecostal são poucos, a maioria nas variações nordestinas, ou seja, o forró, com destaque maior para o xote, e as variedades de toadas e baladas românticas arranjadas com muitas imitações de sopros e cordas. Entra também o pop rock, em menor escala, para atender aos jovens que resistem aos ritmos anteriores. Costuma-se encontrar também, alguns outros ritmos mistos, porém, em pequena escala. Para quem quer se enveredar por esse caminho musical, é fundamental conhecer e ouvir muito as canções desses gêneros, principalmente as que são sucesso nas rádios. Além disso, as congregações têm um repertório próprio caracterizado por seus líderes, correligionários e grupos que cantam seus hinos preferidos.

Tocar esse repertório com acordes simples nos tons mais usados

Ao mesmo tempo em que se familiariza com esse repertório por meio da audição, é importante também, começar a tocá-lo no instrumento musical que se pretende. Deve-se buscar a forma rítmica, a tonalidade e os acordes. Esses três pontos podem ser analisados da seguinte forma:

  • Forma rítmica: ao escolher a música deve-se observar como o músico a toca em seu instrumento, tentar copiar a sonoridade, inicialmente pode-se fazer isso sem mudanças de acordes, para facilitar. Pode-se fazer isso por meio de audição, mas também visualmente, utilizando vídeos de internet, DVD, apresentações ao vivo, observando algum músico que já saiba, o acompanhado de um professor seria mais o apropriado para o quem está começando, mas é possível fazer autodidaticamente também.
  • A tonalidade: o tom da música se dá basicamente pelo acorde inicial e final, com poucas exceções, logo se ela começa e termina com Dó maior, esse é o tom dela, se começa e termina com Sol menor, esse é seu tom, e assim acontece com quase todas as canções. É muito importante tocar uma mesma música em vários tons, auxiliado por um professor, por um músico amigo, ou, até mesmo, pelo site Cifraclub.com.br, que tem uma ferramenta ótima para troca de tons.
  • Acordes: para facilitar a iniciação musical, independente do objetivo, deve-se simplificar os acordes, observando apenas se eles são maiores ou menores, pois, as canções mais simples se resumem a esses dois tipos de acordes, embora seja comum maquiá-los com intervalos de 7, 9 e outros. Depois de trabalhar muito esses dois tipos de acordes, o próximo passo é se dedicar aos acordes com 7ª (ex.: C7, F7, Bb7…).

Memorizar os caminhos harmônicos mais comuns

Os caminhos dos acordes são parte do estudo da harmonia, mas são conhecidos na prática por músicos que têm repertório amplo, pois, nas canções estão todos os exemplos práticos estudados na teoria. Para memorizá-los de forma prática, buscando o objetivo deste estudo, a escolha de uma canção qualquer pode servir de início, pois nela, seja qual for, está descrito um caminho harmônico que é utilizado por um número infinito de outras canções. Por exemplo, não são poucas as canções que seguem o seguinte caminho: Dó maior, Sol maior, Lá menor e Fá maior, repetindo esta sequência por dois ou três minutos, e finalizando com o acorde Do maior. Este padrão pode se apresentar em qualquer tom maior. (Existem doze tons maiores e doze tons menores). Para ajudar a memorizar esses caminhos harmônicos, é recomendável anotar os caminhos encontrados, principalmente aqueles que já foram percebidos em mais de um a música.

Encontrar o tom quando alguém começar a cantar

O mais difícil é manter a calma, quando se está começando, mas até mesmo músicos experientes em tocar de ouvido passam constrangimentos por demorarem a encontrar o tom da música. A canção pode ter uma melodia complexa, o cantor pode não estar cantando com boa afinação, o músico pode ter perdido a concentração, etc. O que dará ao músico a confiança para procurar o tom da música após alguém ter iniciado o canto, será o hábito de fazer isso, portanto, deve-se começar a exercitar com CD, DVD, rádio, ou internet, para só depois começar a fazer isso publicamente. Outra maneira, é iniciar ao lado de um músico experiente e generoso, que permita ao iniciante tentar encontrar o tom, dando a ele a tranquilidade para tentar, sabendo que se não conseguir, esse músico experiente resolverá. Melhor ainda, se conseguir conciliar as duas formas para iniciar, ou seja, treinar muito em particular, e estar acompanhado publicamente.

Esta é a minha contribuição para o tema. Se quiser, pode perguntar, ou acrescentar.

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GRUPO ECBA ANO 2016 – Embaixadores de Cristo da Bem Aventurança

Não os impeçais

A festa do Grupo ECBA, aconteceu nos dias 03 e 04  de setembro e foi uma benção muito especial na alegria do Espírito Santo.
No dia 03, sábado, a pregação foi com a irmã Juliana Gomes, de Piraí. Ela utilizou criativamente os elementos da ornamentação para trabalhar com as crianças, introduziu a história de Zaqueu de forma interativa, além disso, ela utilizou o tema da festa em sua pregação para falar diretamente aos pais.
No dia 04, domingo, foi uma festa de muita alegria com o irmão Lucas Lima, de Volta Redonda, que ofereceu para as crianças e toda a congregação, músicas com movimentos e cantos interativos, brincadeiras com papeis coloridos e bonecos, além de pregar e contar seu testemunho de conversão.
Somos gratos à irmã Juliana Gomes e ao irmão Lucas Lima por se disporem a colaborar muito com a festa das nossas crianças. Que Deus os abençoe.
Muito obrigada ao Evangelista Leandro Fontes por fotografar nos dois dias do evento, possibilitando a criação desta galeria de fotos.
Um agradecimento a Daniel Ferreira pela confecção dos ornamentos, e aos meus pais, irmãos e esposo pelo apoio constante.
Obrigada à pastora Edneia Pereira por todo o crédito concedido.
Direção do grupo: Érica Barcellos e Lília Pereira – Direção pastoral: Edneia Pereira

Informações sobre as imagens expostas em juarezbarcellos.wordpress.com

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Editor de partitura para Linux

O editor de partitura que eu uso há alguns anos é o MuseScore, ele é um software livre que atende muito bem as necessidades de quem quer trabalhar com partituras das mais variadas formas, pois, possui um amplo leque de recursos. A questão é que para instalar no Linux é preciso um pouco de paciência. Eu utilizo um Linux Mandriva, e com os resultados das pesquisas feitas na internet achei que seria impossível utilizá-lo no Mandriva. Então resolvi fazer um contato direto com o Suporte MuseScore, e tive resposta rápida (menos de 48 horas) e objetiva nos termos:
Oi Juarez,
Obrigado por entrar em contato conosco.
Você pode instalar o MuseScore 2.0.3 através do AppImage. https://musescore.org/en/handbook/install-linux#AppImage

Confesso que, mesmo seguindo as orientações, não consegui, pois, estava cometendo um pequeno erro numa das páginas. Pedi ajuda de um colega que trabalha com computação, com experiência em Linux, então ele seguiu as orientações do link acima e concluiu para mim. Já estou a cinco meses utilizando o MuseScore no Linux Mandriva da mesma forma que usava no Windows.

Forte abraço.

O significado da justiça, uma imagem da justiça e o efeito da moderação – segundo Sócrates

Uma imagem da justiça

Sócrates — Aqui está, portanto, perfeitamente realizado o nosso sonho, a respeito do qual declarávamos ter dúvidas, a saber, que seria bastante provável que, logo que iniciássemos a fundação da cidade, nos depararíamos com determinado princípio e modelo da justiça.
Glauco — Assim é, de fato.
Sócrates — Portanto, meu amado Glauco, quando exigíamos que o sapateiro, o carpinteiro ou qualquer outro artesão exercesse bem seu oficio sem intrometer-se em outras atividades, estávamos estabelecendo sem querer uma imagem da justiça.
Glauco — Aparentemente.
Sócrates — Com efeito, a justiça se parece perfeitamente com esta imagem, com a única diferença de que ela não governa os assuntos externos do homem, mas apenas seus assuntos internos, seu ser verdadeiro, não deixando que nenhum dos elementos da alma exerça uma tarefa que não lhe é específica, nem que os outros elementos usurpem mutuamente suas respectivas funções. Ela pretende que o homem coloque em perfeita ordem os seus reais problemas domésticos, que assuma o comando de si mesmo, se discipline e conquiste a sua própria amizade; que institua um acordo perfeito entre os três elementos da sua alma, assim como entre os três tons extremos de uma harmonia — o mais agudo, o mais grave, o médio, e os intermédios, se os houver —, e que, ligando-os uns aos outros, se transforme, de múltiplo que era, em uno, moderado e harmonioso; que somente então se preocupe, se precisar se preocupar, em obter riquezas, em cuidar do corpo, em exercer sua atividade na política ou nos assuntos privados, e que em todas essas ocasiões considere justa e honesta a ação que salvaguarda e contribui para completar a ordem que implantou em si mesmo, e sábia a ciência que governa essa ação; que, ao contrário, considere injusta a ação que destrói essa ordem, e ignorante a opinião que governa esta última ação.
Glauco — Tudo isso é a mais pura verdade, meu caro Sócrates.

A moderação como uma harmonia poem em uníssono de oitavas todas as classes.

Sócrates — Vês que era bem fundada nossa conjectura, quando dizíamos que a moderação se assemelha a uma harmonia.
Glauco — Por que razão?
Sócrates — Porque não se dá com ela o mesmo que com a coragem e a sabedoria, que, residindo respectivamente numa parte da cidade, tornam esta corajosa e sábia. A moderação não atua assim: espalhada no conjunto do Estado, põe em uníssono da oitava os mais fracos, os mais fortes e os intermédios, sob a relação da sabedoria, se quiseres, da força, se também quiseres, do número, das riquezas ou de qualquer outra coisa semelhantes. De sorte que podemos dizer, com toda a razão, que a moderação consiste nessa concórdia, harmonia natural entre o superior e o inferior quanto à questão de saber quem deve mandar, tanto na cidade como no indivíduo.
Glauco — Estou de pleno acordo contigo.
Sócrates — Temos assim três virtudes que foram descobertas na nossa cidade: sabedoria, coragem e moderação para os chefes; coragem e moderação para os guardas; moderação para o povo. No que diz respeito à quarta, pela qual esta cidade também participa na virtude, que poderá ser? E evidente que é a justiça.
Glauco — É evidente.

Justiça significa guardar apenas os bens que nos pertencem e em exercer unicamente a função que nos é própria.

Sócrates — Se fosse necessário decidir qual dessas virtudes (sabedoria, coragem e moderação) é a que, pela sua presença, contribui em maior dose para a perfeição da cidade, seria difícil dizer se é a conformidade de opinião ‘entre os governantes e os governados; ou, nos guerreiros, a salvaguarda da opinião legítima a respeito das coisas que se deverão ou não temer; ou a sabedoria e a vigilância entre os que governantes, ou se o que contribui, sobretudo, para essa perfeição é a presença, na criança, na mulher, no escravo, no homem livre, no artesão, no governante e no governado, dessa virtude pela qual cada um se ocupa da sua tarefa própria e não interfere na dos outros.
Glauco — Difícil, por certo, decidir tal questão.
Sócrates — Assim, ao que me parece, a virtude que mantém cada cidadão nos limites da sua própria tarefa concorre, para a virtude de uma cidade, com a sabedoria, a moderação e a coragem dessa cidade.
Glauco — Não há dúvida.
Sócrates — Mas não dirás que é a justiça essa força que concorre com as outras para a virtude de uma cidade?
Glauco — Sim, por certo.
Sócrates — Examina ainda a questão da seguinte maneira, para veres se a tua opinião continua a ser a mesma: encarregaras os magistrados de julgar os processos?
Glauco — Certamente.
Sócrates — E procurarão eles, ao fazê-lo, outra felicidade que não seja esta: impedir que cada parte fique com os bens da outra ou seja privada dos seus?
Glauco — Não, nenhuma outra finalidade.
Sócrates — E isso é justo?
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Mais uma prova, pois, de que a justiça significa guardar apenas os bens que nos pertencem e em exercer unicamente a função que nos é própria.
Glauco — Perfeitamente.
Sócrates — Nesse caso, vejamos se pensas igual a mim. Se um carpinteiro resolver exercer o oficio de sapateiro ou um sapateiro o de carpinteiro e trocarem entre si as ferramentas ou os respectivos salários — ou se um mesmo homem exercesse a um só tempo estes dois ofícios e se todas as mudanças possíveis, exceto aquela que vou dizer, se produzirem, — crês que com isto possam advir muitos danos à cidade?
Glauco — Não, por certo.
A confusão gerada pela ganância homem causa a ruína da cidade.
Sócrates — Se, por outro lado, um homem que a natureza predispôs para ser artesão ou a exercer qualquer outra atividade lucrativa, orgulhoso de sua riqueza, do grande número das suas relações, da força ou de outra vantagem semelhante, tenta elevar-se à categoria de guerreiro, ou um guerreiro à categoria de magistrado, sem que ambos possuam aptidão para tal, ou se um mesmo homem procura desempenhar todas estas funções ao mesmo tempo, crês, como eu, que estas mudanças e esta confusão provocam a ruína da cidade?
Glauco — Infalivelmente.
Sócrates — A confusão entre essas três classes acarreta para a cidade o máximo da deterioração e, com toda a razão, pode-se considerar esta desordem o maior dos malefícios.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Então, não é a injustiça o maior malefício que se pode cometer contra a cidade?
Glauco — Sim, é.
Sócrates — Logo, é nisso que consiste a injustiça. Ao contrário, quando a classe dos homens de negócios, a dos guerreiros e a dos magistrados exercem a sua função própria e só se ocupam dessa função, não é o inverso da injustiça e o que torna a cidade justa?
Glauco — Acredito que não pode ser de outra maneira.

A República – Platão – Livro IV

O cuidado com a música na educação da criança e do jovem para gerar pessoas honradas capazes de descobrir por si só as regras do bem viver

Sócrates — Finalmente, resumindo, faz-se necessário que os responsáveis pela cidade se esforcem para que a educação não se altere em seu conhecimento, que velem por ela a todo o momento e, com todo o cuidado possível, evitem que nada de novo, no que diz respeito à ginástica e à música, se introduza contra as regras estabelecidas com receio de que, se alguém disser: os homens apreciam mais os cantos mais novos”, vá se imaginar talvez que o poeta se refere não a árias novas, mas a uma nova maneira de cantar, e que disso se faça o elogio. Ora, hão se deve nem louvar nem admitir semelhante interpretação porque é de recear que a passagem a um novo gênero musical ponha tudo em perigo. Com efeito, nunca se atacam as formas da música sem abalar as maiores leis das cidades, como diz Damon, e eu concordo com ele.

Adimanto — inclui-me também entre os que assim pensam.

Sócrates — Pois é nela, na música, segundo parece, que os magistrados devem edificar o seu corpo de guarda.

Adimanto —. Sem dúvida, o desprezo das leis insinua-se aí facilmente sem que se dê conta.

Sócrates — Sim, sob a forma de jogo e como se não causasse nenhum mal.

Adimanto — A princípio, não faz senão introduzir pouco a pouco e infiltrar-se suavemente nos usos e costumes, daí, sai mais forte e passa às relações sociais; em seguida, das relações sociais marcha sobre as leis e as constituições com muita insolência, Sócrates, até que, finalmente, haja consumado a ruína total dos cidadãos e do Estado.

Sócrates .— É realmente assim?

Adimanto — É o que me parece.

Sócrates — Mais uma razão, pois, como dizíamos no começo, para que os nossos jovens devam participar de jogos mais legítimos? Se os seus jogos são desregrados eles também o serão e não poderão tornar-se quando adultos, homens obedientes às leis e virtuosos.

Adimanto — Sem dúvida.

Sócrates — Ao passo que, quando as crianças jogam honestamente desde o começo, a ordem, por meio da música, penetra nelas e, ao contrário do que acontece no caso que citavas, acompanhando-as por toda a parte, aumenta-lhes a força e revigora na cidade o que nela estiver em declínio.

Adimanto — É a pura verdade.

Sócrates — E também descobrem essas regras que parecem de pouca importância e que os seus predecessores deixaram cair em desuso.

Adimanto — Quais são elas?

Socrates — Por exemplo, as que ordenam aos jovens que respeitem o silêncio, quando convém, em presença dos anciãos; que os ajudem a sentar-se, que se levantem para lhes cederem o lugar, que rodeiem os pais de cuidados — e as que respeitam ao corte dos cabelos, às roupas, ao calçado, ao aspecto exterior do corpo e outras coisas semelhantes. Não a-és que descobrirão estas regras?

Adimanto — Creio que sim.

Sáaates — Tolice seria, pois, legislar sobre estas matérias, dado que os decretos promulgados, orais ou escritos, não teriam efeito e não poderiam ser cumpridos.

Adimanto — E como o poderiam ser, então?

Sócrates — O impulso dado pela educação, Adimanto, determina tudo o que se segue. Por isso, o semelhante não apela sempre para o seu semelhante?

Adimanto — Sim.

Sócrates — Poderíamos dizer que, no fim, este impulso conduz a um grande e perfeito resultado, seja para o bem ou para o mal.

Adimanto — Sem dúvida.

Sócrates — Tal a razão pela qual não irei mais longe e não empreenderei legislar acerca disso.

Adinianto — Tens razão.

Sócrates — Mas agora, em nome dos deuses, que faremos no que concerne aos negócios da ágora, aos contratos que os cidadãos das diversas classes aí celebram entre si e, se quiseres, aos contratos de mão-de-obra? Que faremos no que concerne às injúrias, às violências, à apresentação das solicitações, à organização dos juízes, à instituição e ao pagamento das taxas que poderiam ser necessárias sobre os mercados e nos portos e, em geral, à regulamentação do mercado, da cidade, do porto e do resto? Ousaremos legislar sobre tudo isto?

Adimanto — Não convém fazer tais prescrições a pessoas honradas; elas mesmas descobrirão facilmente a maior parte das regras que é preciso estabelecer nessas matérias.

Sócrates — Sim, meu amigo, se Deus lhes conceder manter intactas as leis que enumeramos mais acima.

Adimanto — Do contrário, todos passarão a vida a fazer um grande número de tais regras e a reformá-las, na suposição de que chegarão à melhor.

Platão, A República – Livro IV

PROJETO MULTIMUSICAL

“A compreensão dos diversos instrumentos musicais, inclusive o canto, utilizados na formação de grupos e bandas é fascinante e necessário para o mundo contemporâneo.”

APRESENTAÇÃO

O “Projeto Multimusical” é o aprendizado de música por meio dos instrumentos característicos de grupos e bandas musicais populares, e do canto popular para execuções de canções populares da música popular brasileira dos mais diversos gêneros que a compõem, tais como, as serestas, os diversos tipos de sambas, o baião, as baladas românticas, pop-rock e outros.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

– Oferecer ao iniciante a possibilidade de escolher o instrumento de seu interesse dentro das seguintes opções: violão, guitarra, teclado, baixo, cavaquinho, bandolim, pandeiro, canto popular, teoria musical e teoria da harmonia.
– Ensinar música diretamente no instrumento de interesse de cada aluno;
– Iniciar o aluno ao instrumento por meio de elementos básicos da técnica, da harmonia e do ritmo.
– Proporcionar através desta experiência, o ingresso dos alunos na arte musical;
– Desenvolver a sensibilidade ao ritmo, percepção auditiva, coordenação e memória;
– Conhecer as diversidades musicais;
– Estimular os talentos naturais por meio de elementos técnicos musicais;
– Estimular a linguagem e respiração correta;
– Desenvolver a sociabilidade e a cooperação por meio de trabalhos em grupo;
– Trabalhar o desenvolvimento da concentração, atenção e criatividade;

OBJETIVO GERAL

Espera-se que o aluno adquira conhecimentos musicais capazes de lhe introduzir na arte dos sons de modo consciente principalmente em relação à importância da música na formação do caráter e na motivação das expressões de comportamento humano no seu cotidiano, para que ele possa usufruir desse conhecimento para seu próprio bem viver e também influenciar positivamente a outros pelo compartilhamento desse conhecimento adquirido ao longo de sua experiência no “Projeto Multimusical”. Serão elaborados elementos representativos da música brasileira em sua pluralidade por meio da formação de grupos, bandas, trios, duetos, solistas vocais e instrumentais, canto acompanhado do tipo voz e violão, voz e teclado. Esses resultados serão apresentados, parcialmente, a cada ano, considerando a boa frequência de cada aluno e a disponibilidade dos recursos oriundos para tal.

METODOLOGIA

Tocar músicas populares brasileiras formando um repertório com progressão do grau de dificuldades harmônicas e melódicas, buscando, por meio delas, transmitir o conhecimento da teoria da harmonia e da leitura rítmica e melódica utilizando cifras alfanumérica e figuras musicais em pauta. Aplicar conteúdo de apoio a esse repertório formulado em quatro módulos, com apostilas impressas e conteúdo digital mais amplo exposto no site juarezbarcellos.com.

JUSTIFICATIVA

Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte têm como objetivo levar a Música, bem como, as artes visuais, a dança e o teatro para serem aprendidos nas escolas, na busca de proporcionar ao aluno maior contato com artes que até então não eram aprendidas nas escolas. Este dado mostra a valorização dada à música pelos educadores contemporâneos brasileiros, seguindo os bons exemplos europeus e norte-americanos. Isto amplia no adolescente e no jovem o desejo de aprender um instrumento musical e de cantar afinadamente, seja para iniciar uma banda musical de lazer socialização, ou até mesmo para profissionalização. As famílias de adolescente e jovem de classes sociais de baixa renda encontram dificuldades para financiar os custos dos cursos musicais de instrumento e de canto, devido à necessidade de aquisição de instrumentos e materiais didáticos, locomoção, e ao próprio preço das mensalidades que são, em média, de dez a vinte por cento do salário mínimo em cidades do interior. Desses aspectos econômicos surgem a necessidade de as instituições diversas subsidiarem projetos e cursos voltados para esta área e para este público específico.

INVESTIMENTOS

1. Aquisição de três violões modelo padrão clássico (sugestão de marcas: Giannini, Vogga ou
Michael). Valor unitário estimado: R$200,00 – valor total: R$600,00.
2. Aquisição de um teclado musical modelo estudo sensitivo (sugestão de marcas: Cássio, Yamarra ou CSR). Valor unitário estimado: R$550,00.
3. Aquisição de um contrabaixo elétrico capitação passiva (sugestão de marcas: Giannini, Eagle ou Yamaha). Valor unitário estimado: R$600,00.
4. Aquisição de uma guitarra elétrica modelo stratocaster: (sugestão de marcas: Giannini, Eagle ou Strinberg). Valor unitário estimado: R$600,00.
5. Um cavaquinho com capitação eletrônica (sugestão de marcas: Giannini, Vogga ou Strinberg). Valor unitário estimado: R$500,00.
6. Um bandolim acústico (sugestão de marcas: Rozzini, Giannini ou Eglea). Valor unitário estimado: R$800,00.
7. Uma bateria eletrônica (sugestão de marcas: Shelter, Medeli ou Michael). Valor unitário estimado: R$2.500.
8. Um pandeiro de 10” em madeira (sugestão de marcas: Izzo, Contemporânea ou Torelli). Valor unitário estimado: R$200,00.
9. Um microfone profissional com fio (sugestão de marcas: Shure, Behringer ou Leson). Valor unitário estimado: R$250,00.
10. Uma caixa de som ativa com alto-falantes de 10” (marcas sugeridas: CSR, Novik ou Frahm). Valor unitário estimado: R$900,00.
11. Um mesa de som (misturador) com 16 canais – “mesa” (marcas sugeridas: Behringer, Ciclotron ou OMX). Valor unitário estimado: R$2.000,00)
12. Cinco cabos P10 de cinco metros para instrumentos musicais (marcas sugeridas: Santo Ângelo, Golden ou Wireconex). Valor unitário estimado: R$30,00 – valor total: R$150,00.
13. Um pedestal para microfone (marcas sugeridas: Vector, RMV ou Visão). Valor unitário estimado: R$50,00.
14. Um suporte para teclado musical (marcas sugeridas: Ibox, Ask ou PMX). Valor unitário estimado: R$60,00.
* Total dos investimentos em instrumentos musicais: R$9.760,00 – Nove mil e setecentos e sessenta Reais.
15. Preço para prestação de serviço de aulas de músicas para os diversos instrumentos atendendo aos alunos do projeto Multimusical: R$40,00 por hora/aula, sendo 10 horas semanais, totalizando 40 horas mensais. Valor total mensal: R$1.600,00 – Um mil e seiscentos reais. Contratação estimada para 12 meses.
* Total do investimento anual em contratação do professor: R$19.200,00 – Dezenove mil e duzentos reais.
* Total do investimentos anual inicial – equipamento + contratação: R$28.960,00 – Vinte e oito mil, novecentos e sessenta reais.

REFERÊNCIAS

ALBIN, Ricardo Cravo. Coleção: Música popular brasileira nas escolas.
BRASIL, Parâmetros Curriculares Nacionais, Curso Completo de Teoria Musical e Solfejo (Belmira Cardoso Mario Mascarenhas).
Modelo de projeto cultural – www2.correios.com.br/…culturais/…/Anexo_II_Modelo_de_projeto
PLATÂO: A República – “A educação pela música segundo Sócrates” em juarezbarcellos.wordpress.com
VIVAMUSICA, Projeto: Música na Escola – vivamusica.wikispaces.com

Juarez Barcellos de Paula
Projeto Multimusical
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CC BY-NC-ND

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Opções de trabalho com música

Introdução

Existem muitas maneiras de se trabalhar com música, e há também, um enorme abismo entre as diferenças de rendas possíveis. Essas duas características são comuns em muitas outras profissões, das mais diversas áreas. É assim com os médicos, os advogados,  dentistas, publicitários, atletas, empresários, etc. Neste trabalho quero apresentar para o iniciante em música, alguns caminhos possíveis para se realizar seu sonho de viver de música. Está direcionado também para pais de adolescentes e jovens aspirantes, no sentido de colaborar na orientação destes para que seus sonhos não se transformem numa obsessão utópica, ou numa decepção frustrante. Para realizar este trabalho, não posso me basear apenas em experiências pessoais, desta forma ele seria limitado e egoísta, mas me apoiei nas experiências de colegas que se envolveram com a música no meu tempo, pessoas com as quais eu tive algum convívio, ou mesmo um breve contato. Secundariamente, terei que recorrer a exemplos de músicos famosos para que o trabalho seja completo em sua proposta, afinal, a fama e a riqueza também fazem parte dos sonhos musicais de muitas pessoas.

O sonho de uma banda

Há vinte anos atrás, alguns amigos ensaiavam com suas bandas num projeto de sucesso que que se desfez junto com as bandas. A ideia era comum em qualquer época, montar um repertório próprio e buscar os meios para divulgar, que passava por encontrar uma gravadora que acreditasse, ou gravar um disco e divulgá-lo em eventos. Duas coisas muito difíceis de se fazer, principalmente para pessoas que estão acostumadas com a calmaria do interior. Por isso, as gravadoras não conheciam os projetos, e os eventos eram poucos e frustrantes, em termos de público. Algumas bandas, principalmente de pagode, conseguiam algum destaque regional, e apresentavam alguma organização, ao ponto de comprarem veículos para transporte pago com dinheiro de eventos e contratos com bares e casas noturnas. Mesmo assim não houvia continuidade no trabalho, por diversos motivos: desentendimento entre os integrantes, frustração por não conseguir o estrelato, mesmo estando aparentemente no caminho certo, problemas pessoais envolvendo familiares, problemas com alcoolismo, enfim, tropeçavam nas dificuldades criadas por eles mesmos.

O sonho gospel

Paralelamente havia um grupo de bandas, cantores e cantoras solistas que acreditavam no foco gospel, participando de festivais, cantando em igrejas, investindo em gravações; sonhando igualmente com os estrelato, embora, camuflado na religiosidade. Nessa busca, muitos gastaram dinheiro e tempo, sem retorno; talvez se possa dizer que a experiência tenha valido a pena, e tenha sido agradável do ponto de vista religioso. Posso afirmar que eles lutaram muito para realizar seus sonhos, porém, tiveram que desistir deles, ou redirecioná-los. As dificuldades maiores eram: conquistar o favor das gravadoras, conseguir recurso para investir em gravações, e a pior delas, investir recurso próprio e não conseguir vender seus produtos na medida necessária para cobrir custos e recuperar o capital investido. A questão não estava no campo da fé, pois eles a tinham, e foi por terem fé que fizeram tantas coisas. Creio que Deus os abençoou dando a eles novos rumos, não lhes permitindo se tornarem pessoas frustradas, mas felizes por terem tentado.

Voz e violão em bares

Havia ainda uma terceira categoria de sonhadores que buscavam nos bares um espaço para apresentar um repertório apropriado ao estilo do bar, ou da pizzaria, ou churrascaria, cervejaria; vários nomes para fins musicais comuns, ou seja, voz e violão, ou ainda, voz violão e percussão, um ou dois músicos para dividir um cachê pequeno. Esse, talvez seja o método mais procurado por quem quer ingressar na carreira musical. Muitos cantores e músicos famosos, inclusive internacionalmente, começaram cantando e tocando em bares.

Orquestras instrumentais

Outra categoria de músicos que buscava um espaço era a dos instrumentistas de sopro iniciados, principalmente, na Igreja Assembleia de Deus, e aperfeiçoados em orquestra municipais com características, recursos e objetivos bem definidos. Essas orquestras aproveitavam os talentos musical existentes, aperfeiçoava esses músicos e os remuneravam. Elas fizeram muitas apresentações acompanhando cantores brasileiros renomados que vieram à região para participar de projetos em parceria. Posso afirmar que nessas orquestras muitos músicos desta região Sul-fluminense encontraram um espaço confiável e rentável para se expressarem artisticamente. A renda deles era pequena, mas lhes permitia ter família com dignidade, casa e transporte próprios. Alguns aproveitavam bem o longo tempo livre que tinham para gerar outras fontes de renda e estudar. Nesse seguimento, alguns conseguiram progredir e trabalhar integralmente com música, alcançando rendas acima da média regional. Outras orquestras bem organizadas estruturalmente existiam com caráter de voluntariado, ou seja, o músico não era remunerado, e conquistavam uma certa tradição municipal ao ponto de receber incentivos para aquisição de instrumentos, manutenção, porém o músico continuava como voluntário. Obviamente, o envolvimento com a boa música é enriquecedor, mesmo sem remuneração, porém, não é sobre esse aspecto que estamos tratando neste trabalho, mas sim, da música como fonte de renda.

Bandas de bailes

Esse segmento era aparentemente muito bom, tinham muitos bailes em diversos clubes da região, e algumas bandas faziam muito sucesso. Elas eram comentadas por sua capacidade de executarem músicas com muito aproximação da versão original, em diversos ritmos, por cantarem músicas internacionais, elas eram realmente boas bandas de bailes. Do ponto de vista financeiro, eram rentáveis, tanto que algumas existem há mais de vinte anos, porém, essa rentabilidade era muito favorável aos proprietários, que quase sempre tinham nomes artísticos que davam nomes às bandas e exerciam a função de empresários delas, negociando diretamente com o contratante e contratando músicos para as integrarem.

Aulas de violão e guitarra

Ganhar a vida como professor de instrumento musical pode ser uma boa alternativa para quem sonha “viver de música”. Existe um amplo leque de possibilidades dentro dessa área, o que permite ao músico fazer algumas experimentações sem mudar muito o foco. Sem dúvida, o violão é o instrumento mais procurado para aulas, muito mais que a guitarra elétrica, por isso, muitos músicos especializados em outros instrumentos aprendem a tocar violão para atender esse público. É possível ter uma renda satisfatória nesse ofício e trabalhar exclusivamente com ele, porém, a maioria desses profissionais tem outras atividades, primárias ou secundárias, sejam elas musicais ou não. Por exemplo, alguns dão aulas e tocam em bandas, outros dão aulas e trabalham em indústria, ou comércio, etc. Existem algumas fontes de trabalho para essa categoria de músicos: aulas particulares em sua própria residência, na residência do aluno, em instituições como igrejas e associações de moradores, em escolas de música. Além disso, o professor pode ser contratado por órgãos governamentais como secretarias de cultura, de educação, e ainda, por escolas de música e ONG’s subsidiadas por órgãos públicos. Alguns músicos professores são contratados, dão aulas particulares, e ainda têm uma terceira fonte de renda, musical ou não.

O canto

O canto merece um cuidado especial, pois é por meio dele que surgem os maiores sonhos relacionados à música, e, consequentemente, as maiores frustrações, entretanto, é por maio dele que muitos conseguem grande acensão financeira, tanto quanto, fama e sucesso. As aulas de canto se estabelecem basicamente em escolas de música e igrejas, porém, muitos professores oferecem aulas particulares em suas residências. Há também os corais financiados por órgãos públicos ou privados, como os de terceira idade, os infantis e outros, que contratam o profissional de canto para ensinar e ensaiar. Atualmente, muitos membros de igrejas estão ingressando em aulas de canto buscando melhorar a afinação vocal para cantar nos grupos de suas igrejas, tornando as aulas particulares uma boa alternativa para os profissionais dessa área.

Faculdade de Música

A mãe de uma aluna de violão me disse há alguns anos com certa empolgação: – Minha filha quer cursar faculdade de música, eu disse a ela que será muito bom, mas acho que ela deve fazer outra faculdade antes. Qual a tua opinião, Tio Juarez? Então, eu disse à aluna: – Alegro-me muito por você gostar tanto de música, mas, penso da mesma forma.

Muitas pessoas ingressaram em faculdades de música na esperança de que, em 2011, as escolas voltassem a ter aulas de música em suas grades curriculares, todavia, isso não aconteceu. Conheço alguns músicos que se formaram em licenciatura em música, mas esses mesmos não estão trabalhando em escolas, ou em qualquer outro segmento do ensino da música fazendo uso de seu diploma. Existem exceções, por exemplo: conheço um músico multi-instrumentista que, ainda jovem, se formou por uma universidade federal carioca e conseguiu seguir carreira utilizando, de fato, sua formação acadêmica. Esse mesmo músico já trabalhava com música antes de se formar, e possuía muita experiência e técnica.

As escolas inserem a música em seu contexto de várias maneiras, mas não há nada nelas que seja atraente para o músico, do ponto de vista profissional. O que existe nas escolas funcionando bem são as fanfarras, mas as secretarias de educação não exigem faculdade de música para se trabalhar nelas como músico instrutor. A remuneração é baixa, mas a carga horária é pequena, o que permite ao músico ter mais de um contrato, ou até mesmo, trabalhar em outras áreas da música.

Cursar música em faculdade, pode ser muito bom, mas é preciso ter um objetivo específico muito bem elaborado, e, como na maioria dos casos, estar disposto a mudar-se de cidade, ou estado, e, em casos mais extremos, mudar-se de país. Isso para alcançar o objetivo traçado, doutra forma, ela poderá valer tanto quanto, um curso livre.

A educação pela música na visão de Sócrates – análise dos discursos poéticos

A PRIMEIRA REGRA

As fábulas, Deus, deuses, a regra e a exceção

Sócrates — Tu admites que os discursos fazem parte da música ou não?
Adimanto — Admito.
Sócrates — E existem dois tipos de discursos, os verdadeiros e os falsos?
Adimanto — Sim, existem.
Sócrates — Ambos entrarão na nossa educação ou começaremos pelos falsos?
Adimanto — Não estou entendendo.
Sócrates — Nós não começamos contando fábulas às crianças? Geralmente são falsas, embora encerrem algumas verdades. Utilizamos essas fábulas para a educação das crianças antes de levá-las ao ginásio.
Adimanto — É verdade.
Sócrates — Este é o motivo por que eu dizia que a música deve preceder a ginástica.
Adimanto — E tens razão.
Sócrates — E não sabes que o começo, em todas as coisas, é sempre o mais importante, mormente para os jovens? Com efeito, é sobretudo nessa época que os modelamos e que eles recebem a marca que pretendemos imprimir-lhes.
Adimanto — Com certeza.
Sócrates — Sendo assim, vamos permitir, por negligência, que as crianças ouçam as primeiras fábulas que lhes apareçam, criadas por indivíduos quaisquer, e recebam em seus espíritos entender, quando forem adultos?
Adimanto — De forma alguma permitiremos.
Sócrates — Portanto, parece-me que precisamos começar por vigiar os criadores de fábulas, separar as suas composições boas das más. Em seguida, convenceremos as amas e as mães a contarem aos filhos as que tivermos escolhido e a modelarem-lhes a alma com as suas fábulas muito mais do que o corpo com as suas mãos. Mas a maior parte das que elas contam atualmente devem ser condenadas.
(Naquela época, costumava-se massagear as crianças, para que adquirissem uma boa conformação.)
Adimanto — Quais?
Sócrates — Julgaremos as pequenas pelas grandes, porquanto umas e outras devem ser calcadas nos mesmos moldes e produzir o mesmo efeito; concordas?
Adimanto — Concordo. Mas não sei quais são essas grandes fábulas de que falas.
Sócrates — São as de Hesíodo, Homero e de outros poetas. Eles compuseram fábulas mentirosas que foram e continuam sendo contadas aos homens.
Adimanto — Quais são essas fábulas e o que há nelas de condenável?
Sócrates — O que antes e acima de tudo deve ser condenado, mormente quando a mentira não possui beleza.
Adimanto — E quando não possui?
Sócrates — Quando os deuses e os heróis são mal representados, como um pintor que pinta objetos sem nenhuma semelhança com os que pretendia representar.
Adimanto — E com razão que se condenem tais coisas. Mas como dizemos isso e a que estamos nos referindo?
Sócrates — Em primeiro lugar, aquele que criou a maior das mentiras a respeito dos maiores dos seres criou-a sem beleza, quando disse que Urano fez o que relata Hesíodo e como Cronos se vingou. Mesmo que o comportamento de Cronos e a maneira como foi tratado pelo filho fossem verdadeiros, penso que não deviam ser narrados com tanta leviandade a seres desprovidos de razão e às crianças, mas que seria preferível enterrá-los no silêncio; e, se é necessário falar nisso, deve-se fazê-lo em segredo, diante do menor número possível de ouvintes, depois de ter imolado, não um porco, mas uma vítima grande e difícil de conseguir, para que haja muito poucos iniciados.
Adimanto — De fato, essas histórias são abomináveis.
Sócrates — E não devem ser contadas na nossa cidade. Não se deve dizer diante de um jovem ouvinte que, cometendo os piores crimes e castigando um pai injusto da forma mais cruel, não faz nada de extraordinário e age como os primeiros e os maiores dos deuses.
Adimanto — Não, por Zeus! A mim também parece que tais coisas não se devam dizer!
Sócrates — Deve-se também evitar contar que os deuses fazem guerra entre si e que armam ciladas recíprocas, porque não é verdade, se quisermos que os futuros guardiães da nossa cidade considerem o cúmulo da vergonha discutir levianamente. E ainda menos se lhes deve contar ou representar em tapeçarias as lutas dos gigantes e esses ódios de toda a espécie que armaram os deuses e os heróis contra os seus parentes e amigos. Ao contrário, se quisermos convencê-los de que jamais a discórdia reinou entre os cidadãos e que tal coisa é ímpia, devemos fazer com que os adultos lhes digam isto desde a infância. Cumpre ainda cuidar para que poetas componham para eles fábulas que tendam para o mesmo objetivo. Que jamais se lhes conte a história de Hera acorrentada pelo filho, de Hefesto precipitado do céu pelo pai, por ter defendido a mãe, que aquele maltratava, e os combates de deuses que Homero imaginou, quer essas ficções sejam alegóricas, quer não. Pois uma criança não pode diferenciar uma alegoria do que não é, e as opiniões que recebe nessa idade tornam-se indeléveis e inabaláveis. E devido a isso que se deve fazer todo o possível para que as primeiras fábulas que ela ouve sejam as mais belas e as mais adequadas a ensinar-lhe a virtude.
Adimanto — Tudo que dizes é profundamente sensato.
Porém, se alguém nos indagasse o que entendemos por isso e que fábulas são essas, que responderíamos?
Sócrates — Mas, Adimanto, nem tu nem eu somos poetas, mas fundadores de cidade. Compete aos fundadores conhecer os modelos que devem seguir os poetas nas suas histórias e proibir que se afastem deles; mas não lhes compete criar fábulas.
Adimanto — Está bem. Mas, ainda assim, gostaria de saber quais são os modelos que se devem seguir nas histórias que se referem aos deuses.
Sócrates — Vou dizer-te. Deve-se representar Deus sempre tal como é, quer seja representado na epopeia, na poesia lírica ou na tragédia.
Adimanto — Perfeitamente de acordo.
Sócrates — Não é certo que Deus é essencialmente bom e não é assim que se deve falar dele?
Adimanto — Sem dúvida.
Sócrates — Mas nada do que é bom pode ser prejudicial, não é mesmo?
Adimanto — É o que penso.
Sócrates — Pode prejudicar aquilo que em si não é prejudicial?
Adimanto — De modo algum.
Sócrates — Pode fazer mal aquilo que não prejudica?
Adimanto — Também não.
Sócrates — E o que não faz mal pode ser causa de algum mal?
Adimanto — Impossível.
Sócrates — E aquilo que é bom é benéfico? O bem é benéfico?
Adimanto — Sim.
Sócrates — E, por conseguinte, é a causa do êxito?
Adimanto — E.
Sócrates — Então, o bem não é a causa de todas as coisas; é a causa do que é bom e não do que é mau.
Adimanto — Necessariamente.
Sócrates — Assim, Deus, dado que é bom, não é a causa de tudo, como se pretende vulgarmente; é causa apenas de uma pequena parte do que acontece aos homens, e não o é da maior, já que os nossos bens são muito menos numerosos que os nossos males e só devem ser atribuídos a Ele, enquanto para os nossos males devemos procurar outra causa, mas não Deus.
Adimanto — Nada mais certo, penso eu.
Sócrates — E impossível, portanto, admitir, de Homero ou de qualquer outro poeta, erros acerca dos deuses tão absurdos como estes:

Dois tonéis se encontram no palácio de Zeus,
Um repleto de fados felizes, e outro, infelizes,
e aquele a quem Zeus concede dos dois
ora experimenta do mal, ora do bem;
mas o que só recebe do segundo, sem mistura,
a devoradora fome persegue-o sobre a terra divina;
e ainda que Zeus é para nós
dispensador tanto dos bens como dos males.

E, se algum poeta nos disser, a respeito da violação dos juramentos e dos tratados de que Pandaro se tomou culpado, que foi cometida por instigação de Atena e de Zeus, não o aprovaremos, assim como não aprovaremos aquele que tomou Artemis e Zeus responsáveis pela querela e julgamento das deusas; da mesma forma não permitiremos que ouçam os versos de Ésquio onde se diz que:
Deus engendra o crime entre os mortais quando quer arruinar inteiramente uma casa.
(Menção à pendência entre as três deusas: Hera, Atena e Afrodite, e ao julgamento de Páris a respeito. Tratava-se de saber qual das três deusas era a mais bela, O prêmio, um pomo de ouro, foi atribuído a Afrodite, o que provocou que as deusas derrotadas planejassem a perdição dos troianos, consumada por intermédio do rapto de Helena por Pária.)
Se alguém compõe um poema a respeito das desgraças de Níobe, dos pelópidas, dos troianos ou acerca de qualquer outro tema semelhante, não deve dizer que tais desgraças são obra de Deus ou, se o disser, deve justificá-lo, mais ou menos como nós, agora, tentamos fazer. Deve declarar que, com isso, Deus só fez o que era justo e bom, e que aqueles a quem castigou tiraram proveito daí; mas nós não devemos dar ao poeta a liberdade de afirmar que os homens punidos foram infelizes e que Deus foi o autor dos seus males. Ao contrário, se ele disser que os maus precisavam de castigo, sendo infelizes, e que Deus lhes fez bem castigando-os, devemos deixá-lo livre. Portanto, se disserem que Deus, que é bom, é a causa das desgraças de alguém, combateremos tais palavras com todas as nossas forças e não permitiremos que sejam proferidas ou ouvidas pelos jovens ou pelos velhos, em verso ou em prosa, numa cidade que deve ter boas leis, porque seria pecaminoso, abusivo e absurdo.
Adimanto — Tal regra me agrada.
Sócrates — Assim, esta é a primeira regra e o primeiro modelo a que devemos obedecer nos discursos e nas composições poéticas: Deus não é a causa de tudo, mas tão-somente do bem.
Adimanto — Isso basta.

A REPÚBLICA – PLATÃO

Títulos e subtítulos meus

A educação pela música na visão de Sócrates – análise de canto, melodia, harmonia e ritmo

Sócrates — Agora, meu amigo, parece-me que acabamos com esta parte da música que se refere aos discursos e às fábulas, porque tratamos tanto do conteúdo quanto da forma.
Adimanto — Também me parece.

O CARÁTER DO CANTO E DA MELODIA

A melodia se compõe de três elementos: as palavras, a harmonia e o ritmo.

Sócrates — Resta-nos tratar do caráter do canto e da melodia, concordas?
Adimanto — Sim, evidentemente.
Sócrates — Haveria alguém que não dissesse, de pronto, o que devemos dizer acerca deles e o que devem ser, se nos quisermos manter de acordo com as ideias precedentes?
Então, Glauco, sorrindo, disse:
— Por mim, Sócrates, corro o risco de ser a exceção, porque não estou muito em condições de inferir, neste momento, o que devem ser essas coisas; no entanto, suspeito-o.
Sócrates — Estás ao menos em condições de fazer esta primeira observação, que a melodia se compõe de três elementos: as palavras, a harmonia e o ritmo.
Glauco — Quanto a isso, sim.
Sócrates — Quanto às palavras, diferem das que não são cantadas? Não devem ser compostas segundo as regras que enunciamos há pouco e de forma semelhante?
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — E a harmonia e o ritmo devem corresponder às palavras?
Glauco — Sim.
Sócrates — Já dissemos que não deveriam existir queixas e lamentações nos nossos discursos.
Glauco — Com efeito, por serem desnecessárias.
Sócrates — Quais são as harmonias plangentes? Diz-nos, visto que és músico.
Glauco — São a lídia mista, a aguda e outras semelhantes.
Sócrates — Convém, pois, suprimi-las, não é verdade? Porque são inúteis para as mulheres honradas e, com maior razão, para os homens.
Glauco — Certamente.
Sócrates — Nada há mais inconveniente para os guardiães do que a embriaguez, a moleza e a indolência.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Quais são harmonias efeminadas usadas nos banquetes?
Glauco — A jânica e a lídia que se denominam harmonias lassas.
Sócrates — De tais harmonias, meu amigo, tu te servirás para formar guerreiros?
Glauco — De maneira nenhuma. Receio que não te restem senão a dórica e a frígia.
Sócrates — Não conheço todas as harmonias, mas deixa-nos aquela que imita os tons e as entonações de um valente empenhado em batalha ou em qualquer outra ação violenta, quando, por infortúnio, corre ao encontro dos ferimentos, da morte ou é atingido por outra infelicidade, e, em todas essas circunstâncias, firme no seu posto e resoluto, repele os ataques do destino. Deixa-nos outra harmonia para imitar o homem empenhado numa ação pacífica, não violenta mas voluntária, que procura persuadir, para obter o que pede, quer um deus por intermédio de suas preces, quer um homem por intermédio das suas lições e conselhos, ou, ao contrário, solicitado, ensinado, convencido, se submete a outro e, tendo por estes meios sido bem-sucedido, não se enche de orgulho, mas se comporta em todas as circunstâncias com sabedoria e moderação, feliz com o que lhe acontece. Estas duas harmonias, a violenta e a voluntária, que imitarão com mais beleza as entonações dos infelizes, dos felizes, dos sábios e dos valentes, estas deixa-as ficar.
Glauco — As harmonias que me pedes para deixar não são senão aquelas que mencionei há pouco.
Sócrates — Não precisaremos pois, para os nossos cantos e as nossas melodias, de instrumentos com muitas cordas, que reproduzem todas as harmonias.
Glauco — Não, por certo.
Sócrates — Nem tampouco precisaremos de fabricantes de triângulos, pedis e outros instrumentos de muitas cordas e harmonias.
Glauco — Não, aparentemente.
Sócrates — Admitirás em nossa cidade os fabricantes e os tocadores de flauta? Não é este instrumento que pode emitir mais sons, e os instrumentos que reproduzem todas as harmonias não são imitações da flauta?
Glauco — E evidente.
Sócrates — Assim, restam a lira e a citara, úteis à cidade; nos campos, os pastores terão o pífaro.
Glauco — E o que se infere do nosso raciocínio.
Sócrates — De resto, meu amigo, não inovamos ao preferirmos Apolo e os instrumentos de Apoio a Mársias e seus instrumentos.
Glauco — Não, por Zeus! Não creio que estejamos inovando.
Sócrates — Mas, pelo cão! Sem nos darmos conta disso, purificamos a cidade que ainda há pouco dizíamos mergulhada na languidez.
Glauco — E o fizemos sabiamente.

OS RITMOS

Sócrates — Vamos concluir nossa reforma. Depois das harmonias, resta-nos examinar os ritmos; não devemos procurá-los variados, nem formando cadências de toda a espécie, mas diferenciar os que exprimem uma vida regulada e corajosa; quando os tivermos diferenciado, obrigaremos a cadência e a melodia a adequarem-se às palavras, e não as palavras à cadência e à melodia. Que ritmos são esses, compete a ti indicá-los como fizeste para as harmonias.
Glauco — Em verdade, não posso satisfazer-te. Que existem três espécies com as quais se entrelaçam todas as cadências, como existem quatro espécies de tons de onde se tiram todas as harmonias, posso afirmá-lo, visto que o estudei; mas quais são aqueles que imitem tal gênero de vida eu não sei.
Sócrates — Consultaremos depois Damoni e perguntar-lhe-emos quais são as cadências que convêm à baixeza, à insolência, à loucura e aos outros vícios, e que ritmos se devem deixar para os seus contrários. Creio tê-lo vagamente ouvido pronunciar os nomes de enópiio composto, dáctilo, heroico, mas não sei que arranjo dava a este último ritmo, em que igualava os tempos fracos e os tempos fortes e que terminava com uma breve ou uma longa. Também chamava, creio eu, a um “pé iambo”, a outro “troqueu” e os marcava com longas e breves. E, em alguns desses metros, censurava ou louvava, se bem me lembro, o movimento da cadência, não menos que os próprios ritmos — ou algo que participava dos dois —, porquanto não o sei ao certo; mas, como dizia, coloquemos estas questões a Damori, discuti-las exigiria muito tempo. Que dizes?
Glauco — Penso do mesmo modo.
Sócrates — Mas, ao menos, poderás convir em que a graça e a falta de graça dependem da perfeição ou da imperfeição do ritmo.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Mas o bom e o mau ritmo seguem e imitam, um, o bom estilo, o outro, o mau, e o mesmo acontece com a boa e má harmonia, quando o ritmo e a harmonia se harmonizam com as palavras, como dizíamos há pouco, e não as palavras com o ritmo e a harmonia.
Glauco — É claro que ambos devem harmonizar-se com as palavras.
Sócrates — Mas a maneira de dizer e o próprio discurso não dependem do caráter da alma?
Glauco — Como não?
Sócrates — E todo o resto não depende do discurso?
Glauco — Depende.
Sócrates — Assim, o bom discurso, a boa harmonia, a graça e a euritmia dependem da simplicidade do caráter, não dessa tolice a que denominamos amavelmente simplicidade, mas da simplicidade autêntica de um espírito que alie a bondade à beleza.
Glauco — Perfeitamente.
Sócrates — Não devem, pois, os nossos jovens procurar em tudo essas qualidades, se quiserem realizar a tarefa que lhes é própria?
Glauco — Sim.
Sócrates — Também a pintura está repleta dessas qualidades, assim como todas as artes da mesma natureza. Está repleta delas a arte do tecelão, do bordador, do arquiteto, do fabricante dos outros objetos, e até a natureza dos corpos e das plantas; em tudo isto, com efeito, há graça ou feiura. E a feiura, a arritmia, a desarmonia são irmãs da má linguagem e do mau caráter, ao passo que as qualidades opostas são irmãs e imitações do caráter oposto, da sabedoria e da bondade da alma.
Glauco — Certamente.

ARTISTAS DE MÉRITO SEGUEM A NATUREZA DO BELO

Sócrates — Mas bastará velar sobre os poetas e obrigá-los a não introduzirem nas suas criações senão a imagem do bom caráter? Não devemos vigiar também os outros artesãos e impedi-los de introduzirem o vício, a incontinência, a baixeza e a feiura na pintura dos seres vivos, na arquitetura ou em qualquer outra arte? E, se não puderem conformar-se a esta regra, não devemos proibi-los de trabalharem em nossa casa, com receio de que os nossos guardiães, criados no meio das imagens do vício como numa má pastagem, colham e pastem aí, um pouco cada dia, muita erva daninha e desta maneira reúnam, sem se darem conta, um grande mal na alma? Não devemos, ao contrário, procurar artistas de mérito, capazes de seguirem a natureza do belo e do gracioso, a fim de que os nossos jovens, a semelhança dos habitantes de uma terra sadia, tirem proveito de tudo que os rodeia, de qualquer lado que chegue aos seus olhos ou ouvidos uma emanação das obras belas, tal como uma brisa transporta a saúde de regiões salubres, e predispondo-os insensivelmente, desde a infância, a imitar e a amar o que é reto e razoável?
Glauco — Seria uma excelente educação.
Sócrates — E, decerto, por esta razão, meu caro Glauco, que a educação musical é a parte principal da educação, porque o ritmo e a harmonia têm o grande poder de penetrar na alma e tocá-la fortemente, levando com eles a graça e cortejando-a, quando se foi bem-educado. E também porque o jovem a quem é dada como convém sente muito vivamente a imperfeição e a feiura nas obras da arte ou da natureza e experimenta justamente desagrado. Louva as coisas belas, recebe-as alegremente no espírito, para fazer delas o seu alimento, e torna-se assim nobre e bom; ao contrário, censura justamente as coisas feias, odeia-as logo na infância, antes de estar de posse da razão, e, quando adquire esta, acolhe-a com ternura e reconhece-a como um parente, tanto melhor quanto mais tiver sido preparado para isso pela educação.
Glauco — Tais são as vantagens que se esperam da educação pela música.
Sócrates — Quando aprendíamos as letras, só considerávamos que as conhecíamos suficientemente ao nos darmos conta de que os seus elementos, em pequeno número, mas dispersos em todas as palavras, já não nos escapavam e, nem numa palavra curta nem numa comprida, não os desprezávamos, como inúteis de serem notados; então, ao contrário, esforçávamo-nos por distingui-los, convencidos de que não existia outra maneira de aprender a ler.
Glauco — É verdade.
Sócrates — É também verdade que não reconheceremos as imagens das letras, refletidas na água ou num espelho, antes de conhecermos as próprias letras, porquanto tudo isto é objeto da mesma arte e do mesmo estudo.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Assim também, pelos deuses, afirmo que não seremos músicos, nós e os guardiães que pretendemos educar, antes de sabemos reconhecer as formas da moderação, da coragem, da generosidade, da grandeza de alma, das virtudes, suas irmãs, e dos vícios contrários, onde quer que apareçam dispersos; antes de descobrirmos a sua presença, onde quer que se encontrem, elas ou as suas imagens, sem desprezarmos nenhuma, nem nas pequenas coisas nem nas grandes, convencidos de que elas são objeto da mesma arte e do mesmo estudo.
Glauco — Não pode ser de outra forma.

A MÚSICA CULMINA NO AMOR AO BELO

Sócrates — E, porventura, não seria o mais belo espetáculo, para quem o pudesse contemplar, o homem que reúne ao mesmo tempo boas disposições na sua alma e, no exterior, caracteres que se assemelham e harmonizam com essas disposições, porque participam do mesmo modelo?
Glauco — Sim, o mais belo.
Sócrates — O mais belo é também o mais digno de ser amado?
Glauco — Como não?
Sócrates — Assim sendo, o músico amará esses homens tanto quanto possível; mas não amará o homem desprovido de harmonia.
Glauco — Convenho em que isso aconteça, pelo menos se for a alma a ter algum defeito; porém, se for o corpo, tomará o seu partido e consentirá em amar.
Sócrates — Sei que tens amado ou amas, e eu te aprovo. Mas diz-me: o prazer excessivo harmoniza-se com a temperança?
Glauco — Como poderia isso acontecer, visto que o excessivo prazer não perturba a alma menos que a excessiva dor?
Sócrates — E com as outras virtudes?
Glauco — Tampouco.
Sócrates — E com a insolência e a incontinência?
Glauco — Muitíssimas vezes.
Sócrates — Sabes de um prazer maior e mais vivo do que o do amor sensual?
Glauco — Não, não há nenhum mais violento.
Sócrates — Por outro lado, o amor autêntico ama com sabedoria e medida a ordem e a beleza?
Glauco — Por certo.
Sócrates — Logo, nada de violento nem de parecido com a incontinência deve aproximar-se do amor autêntico.
Glauco — Nada.
Sócrates — Portanto, a volúpia não se deve aproximar dele; não deve entrar no comércio do amante e da criança que se amam com amor verdadeiro.
Glauco — Não, por Zeus, Sócrates, não deve se aproximar!
Sócrates — Por isso mesmo, tu decretarias como lei, na cidade cujo plano estamos a traçar, que o amante possa adorar, visitar, abraçar o jovem como se fora um filho, objetivando um fim nobre, se conseguir convencê-lo; mas, quanto ao resto, deve ter com o objeto dos seus cuidados relações tais que nunca seja acusado de ir demasiadamente longe, se não quiser incorrer na censura de homem sem educação nem sentimento do belo.
Glauco — Sim.
Sócrates — Parece-te agora, como a mim parece, que a nossa discussão sobre a música chegou ao fim? Acabou onde devia acabar; com efeito, a música deve culminar no amor ao belo.
Glauco — Sou da mesma opinião.

A República – Platão

Títulos e subtítulos meus.

A educação fundamentada na música e na ginástica na visão de Sócrates

Sócrates — Acreditarias, meu caro Glauco, que os que fundamentaram a educação na música e na ginástica fizeram-no para formar o corpo por meio de uma e a alma por meio de outra?
Glauco — Por que me fazes essa pergunta?
Sócrates — E que me parece que tanto uma como a outra foram criadas principalmente para a alma.
Glauco — Como assim?
Sócrates — Já notaste, certamente, qual é a disposição de espírito dos que se entregam à ginástica durante toda a vida e não se interessam pela música? Ou dos que fazem o contrário?
Glauco — De que disposição falas?
Sócrates — Da rudeza e dureza de uns, da moleza e brandura dos outros.
Glauco—Já notei que aqueles que se entregam unicamente à ginástica contraem demasiada rudeza e que os que cultivam os omitiria a decência.
Sócrates — Entretanto, é o elemento generoso da sua natureza que provoca a rudeza; bem dirigido, tornar-se-ia coragem, mas, demasiado tenso, degenera em dureza e mau humor, como é natural.
Glauco — Assim me parece.
Sócrates — E a brandura não faz parte do caráter do filósofo? Demasiado frouxa, amolece-o mais do que o permitido, mas, dirigida, abranda-o e ordena-o.
Glauco — Perfeitamente.
Sócrates — E nós queremos que os nossos guerreiros reúnam estas duas características.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Não devemos, então, colocá-las em harmonia uma com a outra?
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — E a sua harmonia não toma a alma ao mesmo tempo moderada e corajosa?
Glauco — Certamente.
Sócrates — Ao passo que a sua desarmonia a torna covarde e grosseira?
Glauco — Sim.
Sócrates — Logo, quando um homem permite que a música o encante com o som da flauta e lhe derrame na alma, pelos ouvidos, essas harmonias suaves, moles e plangentes de que falávamos há pouco, passa a vida distraído, exultante de alegria pela beleza do canto: em primeiro lugar, suaviza o elemento irascível da sua a]ma, como o fogo amolece o ferro e o torna útil, de inútil e dum que era antes; mas, se continua a entregar-se ao encantamento, a sua coragem não tarda a dissolver-se e a fundir-se, até se reduzir a nada, até ser extraída, como um nervo, da sua alma, tornando-o um guerreiro sem vigor.
Glauco — Tens razão.
Sócrates — E, se recebeu da natureza uma alma débil e frouxa, este resultado não se faz esperar; mas se, ao contrário, nasceu ardente, o seu coração enfraquece-se, toma-se impressionável e predisposto a irritar-se e a acalmar-se. Em vez de corajoso, ei-lo irritável, colérico e cheio de mau humor.
Sócrates — Porém, e se este homem se entrega inteiramente à ginástica e à boa mesa, sem se importar com a música e a filosofia? Em primeiro lugar, o sentimento das suas forças não o enche de orgulho e coragem e não se toma mais intrépido do que era?
Glauco — Não há dúvida.
Sócrates — Mas, se não fizer outra coisa e não mantiver contato com a musa? Ainda que tivesse na alma um certo desejo de aprender, como não participa em nenhuma ciência, em nenhuma pesquisa, em nenhuma discussão nem em nenhum exercício da música, esse desejo toma-se fraco, surdo e cego: não é despertado, nem cultivado, nem liberto dos grilhões das sensações.
Glauco — Assim e.
Sócrates — Ei-lo, pois, já feito inimigo da razão e das musas; já não se serve do discurso para persuadir; alcança em tudo os seus fins pela violência e a selvageria, como um animal feroz, e vive no seio da ignorância e da grosseria, sem harmonia e sem graça.
Glauco — E perfeitamente exato.
Sócrates — Existem na alma dois elementos: a coragem e a sabedoria; um deus, direi eu, deu aos homens duas artes, a música e a ginástica; não as deu para a alma e para o corpo, a não ser acidentalmente, mas para aqueles dois elementos, a fim de que se harmonizem entre si, sendo estendidos ou soltos até ao ponto conveniente.
Glauco — Assim parece.
Sócrates — Aquele, pois, que associa com mais beleza a ginástica à música e, com mais tato, as aplica à sua alma, é músico perfeito e possui a ciência da harmonia muito mais do que aquele que afina entre si as cordas de um instrumento.
Glauco — E com toda a justiça, Sócrates.
Sócrates — Portanto, Glauco, precisaremos também na nossa cidade de um líder capaz de regular esta associação, se quisermos salvar a nossa constituição.
Glauco — Por certo que precisaremos, e muito.
Sócrates — Tal é o nosso plano geral de educação e disciplina da juventude. Seria inútil nos estendermos a respeito das danças dos nossos jovens, as suas caças com ou sem cães as suas competições de ginástica e hípicas. É suficientemente claro que as regras a seguir nisso dependem das que já estabelecemos e não é difícil descobri-las.
Glauco — Certo que não.

A REPÚBLICA – SÓCRATES

A GINÁSTICA NA VISÃO DE SÓCRATES

Sócrates — Depois da música, é pela ginástica que é preciso educar os jovens.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — E preciso que por ela se exercitem desde a infância e ao longo da vida. Eis a minha ideia a este respeito: analisa-a comigo. Para mim, não é o corpo, por muito bem constituído que seja, que, por virtude própria, toma pura a alma boa, mas, ao contrário, é a alma que, quando é boa, dá ao corpo, pela sua própria virtude, toda a perfeição de que ele é capaz. Que te parece?
Glauco — O mesmo que te parece.
Sócrates — Se, depois de termos dado à alma todo o cuidado necessário, lhe confiássemos a tarefa de precisar o que se refere ao corpo, limitando-nos a indicar os modelos gerais, a fim de evitarmos longos discursos, não faríamos bem?
Glauco — Certamente.

O REGIME

Sócrates — Proibiremos a embriaguez aos nossos guerreiros, porque a um defensor da cidade, mais do que a qualquer outro, não é possível, estando embriagado, exercer seu mister.
Glauco — Seria ridículo que um guerreiro tivesse necessidade de ser defendido!
Sócrates — E que diremos a respeito da alimentação? Os nossos homens são os atletas da maior das disputas, não é assim?
Glauco — Sim.
Sócrates — É adequado para eles o regime dos atletas comuns?
Glauco — Talvez.
Sócrates — Mas é um regime que dá demasiada margem ao sono e expõe a saúde a muitos perigos. Não vês que esses atletas passam a vida a dormir e que, sempre que se afastam um pouco do regime que lhes foi prescrito, contraem graves doenças?
Glauco — Sim.
Sócrates — E necessário um regime mais apurado para os nossos atletas guerreiros, para que se mantenham, como os cães, sempre alerta, vejam e ouçam com a maior acuidade e, embora mudando frequentemente de bebida e comida, conservem uma excelente saúde.
Glauco — Sou da mesma opinião.
Sócrates — Pois a melhor ginástica não é irmã da música simples de que falávamos há pouco?
Glauco — Que queres dizer?
Sócrates — Que uma boa ginástica é simples, principalmente quando se destina a guerreiros.
Glauco — E em que consiste ela?
Sócrates — Pode-se aprendê-lo em Homero. Sabes que, quando faz os seus soldados comerem em campanha, não os farta de peixes, apesar de estarem próximos do mar, junto ao Helesponto, nem de carnes preparadas, mas apenas de carnes assadas, de preparação muito simples para os seus soldados; com efeito, é mais fácil assar diretamente no fogo do que levar consigo utensílios de cozinha.
Glauco — Sim, com certeza.
Sócrates — Não parece também que Homero se refira a temperos. Os outros atletas não sabem que para se manter em boa forma devem evitar tudo isso?
Glauco — Sabem e evitam.
Sócrates — Se consideras os nossos preceitos acertados, com certeza não aprovas a mesa siracusana e os variados pratos da Sicília.
Glauco — Não.
Sócrates — Também não aprovarás que homens que devem manter-se em boa forma tenham por amante uma jovem de Corinto?
Glauco — Não, por certo.
Sócrates — Nem que se entreguem às famosas delicias da pastelaria ática?
Glauco — Naturalmente.
Sócrates — Se comparássemos uma tal alimentação e um tal regime à melopeia e ao canto em que entram todos os tons e todos os ritmos, julgo que faríamos uma comparação correta.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Aqui, a variedade gera a desordem e o desregramento; ali, provoca a doença. Ao contrário, a simplicidade na música torna a alma moderada e na ginástica, o corpo saudável.
Glauco — Nada de mais certo.

A DESORDEM E AS DOENÇAS

Sócrates — Porém, se o desregramento e as doenças se multiplicarem numa cidade, não se abrirão muitos tribunais e clínicas? A justiça e a medicina serão apreciados quando os homens livres a eles se entregarem em grande número e com entusiasmo.
Glauco — Não poderia ser de outro modo.
Sócrates — E haverá para uma cidade maior prova do vício e da baixeza da educação do que a necessidade de médicos e juizes hábeis, não só para as pessoas rudes e os artesãos, mas também para os que se vangloriam de ter recebido uma educação liberal? Ou vês que não é uma vergonha e uma grande prova de falta de educação ser forçado a recorrer a uma justiça fictícia e tornar os outros senhores e juizes do seu próprio direito, na falta de justiça pessoal?
Glauco — Nada mais vergonhoso.
Sócrates — E não te parece ainda mais vergonhoso quando, não contentes com passarem a maior parte da vida nos tribunais a defender ou a propor processos, as pessoas se vangloriam, por vulgaridade, de ser hábeis em cometer a injustiça, em poder usar todos os subterfúgios, escapar de todas as maneiras e dobrar-se como o vime, para evitar o castigo? E isso, por interesses mesquinhos e desprezíveis, porque não sabem quanto é mais belo e melhor ordenar a vida de modo a não ter necessidade de um juiz?
Glauco — Isso, isso é ainda mais vergonhoso.

A MEDICINA

Sócrates — E acaso será menos vergonhoso recorrer à arte do médico, não para feridas ou para alguma dessas doenças próprias das estações, mas porque, devido à preguiça e ao regime que descrevemos, fica-se cheio de emanações e vapores como um pântano, obrigando os discípulos de Esculápio a dar a essas doenças os novos nomes de flatulências e catarros?
Glauco — Esses são, de fato, nomes de doenças novas e estranhas.
Sócrates — E desconhecidas, ao que parece, no tempo de Esculápio. O que me leva a supor que os seus filhos, em Tróia, não censuraram a mulher que, para curar os ferimentos de Eurípio, obrigou-o a beber vinho pramniano misturado com farinha de cevada e queijo ralado, o que parece inflamatório, assim como não desaprovaram o remédio de Pátrodo.
Glauco — Estranho, entretanto, que se desse uma beberagem tão inusitada para um homem naquele estado.
Sócrates — Não acharás estranho se refletires que a medicina atual, que segue as enfermidades passo a passo, não foi praticada pelos discípulos de Esculápio antes da época de Heródico. Heródico era pedótrofo; tendo se tornado valetudinário, criou uma mescla de ginástica com medicina, que serviu primeiro para atormentá-lo e, depois dele, a muitos outros.
Glauco — Como assim?
Sócrates — Procurando para si uma morte lenta. Porque, como a sua moléstia era mortal, seguiu-a passo a passo, sem conseguir, julgo eu, curá-la; renunciando a qualquer outra ocupação, passou a vida a tratar-se, devorado de inquietação sempre que se afastava um pouco do regime habitual; deste modo, levando uma vida langorosa, chegou à velhice à força de engenho.
Glauco — Belo serviço prestou-lhe a sua arte!
Sócrates — Bem o merecia ele por não ter compreendido que, se Esculápio não ensinou esta espécie de medicina aos seus descendentes, não foi nem por ignorância nem por inexperiência, mas porque sabia que, numa cidade bem governada, cada um tem uma tarefa fixada que é obrigado a desempenhar e ninguém tem tempo para passar a vida doente e a tratar-se. Sentimos o ridículo deste abuso nos artesãos, mas não o sentimos nos ricos e nos que se consideram felizes.
Glauco — Como?
Sócrates — Quando um carpinteiro fica doente, pede ao médico que lhe dê um remédio que, por vomitório ou purga, evacue a sua doença ou então que lhe faça uma cauterização ou uma incisão que o liberte dela. Mas, se alguém lhe prescrever um longo regime, com ligaduras em volta da cabeça e o que se segue, diz logo que não tem tempo para estar doente, que não vê nenhuma vantagem em viver assim, ocupando-se unicamente da sua doença e desprezando o trabalho que tem diante de si. Em seguida, manda embora o médico e, retomando o regime habitual, recupera a saúde e vive exercendo o seu oficio; ou então, se o seu corpo não resiste à enfermidade, vem a morte libertá-lo.
Glauco — E essa a medicina que parece convir a tal homem.
Sócrates — Não é porque tem um oficio e, se não o exercer, não encontra nenhuma vantagem em viver?
Glauco — Evidentemente.
Sócrates — Ao passo que o rico, conforme dizemos, não tem trabalho de que não possa abster-se sem que a vida lhe seja insuportável.
Glauco — Assim é, de fato.
Sócrates — Não conheces a máxima de Focilides: deve-se praticar a virtude quando se tem com que viver?
Glauco — Penso que também se deve praticá-la mesmo antes de ter com que viver.
Sócrates — Não discutimos a verdade desta máxima; mas vejamos por nós mesmos se o rico deve praticar a virtude e se lhe é impossível viver sem ela ou se a mania de alimentar as doenças, que impede o carpinteiro e os outros artesãos de se entregarem ao seu ofício, não impede também o rico de cumprir o preceito de Focilides.
Glauco — Não há dúvida de que o impede, por Zeus! E nada talvez o impeça tanto como esse cuidado excessivo do corpo, que vai além do que admite a ginástica; com efeito, é incômodo nos assuntos domésticos, nas expedições militares e nos empregos sedentários da cidade.
Sócrates — Mas o seu principal inconveniente está em tornar difícil qualquer estudo, qualquer reflexão ou meditação interior. Com efeito, temem-se sempre dores de cabeça e vertigens, que se imputam à filosofia; assim, esse cuidado, onde quer que se encontre, entrava o exercício e a provação da virtude, porque faz que as pessoas continuem a julgar que estão doentes e não cessem de queixar-se da sua saúde.
Glauco — Isso é muito comum.
Sócrates — Esculápio o sabia e foi para os homens que têm, pela natureza e o regime que seguem, uma boa constituição, mas sofrem de uma doença localizada, que ele inventou a medicina. Libertou-os das doenças mediante remédios e indicações, ordenando-lhes ao mesmo tempo que não mudassem em nada o seu regime habitual, a fim de não prejudicarem os negócios da cidade. Quanto aos indivíduos inteiramente minados pela doença, não tentou prolongar-lhes a miserável vida por meio de um lento tratamento de infusões e purgas e pô-los em condições de engendrar filhos destinados, provavelmente, a parecer-se com eles; não pensou que fosse necessário tratar um homem incapaz de viver no círculo de deveres que lhe é fixado, porque daí não é vantajoso nem para o doente nem para a cidade.
Glauco — Fazes de Esculápio um político.
Sócrates — Era-o evidentemente. Não vês que os seus filhos, ao mesmo tempo que combatiam valentemente diante de Tróia, exerciam a medicina como eu digo? Não te lembras que, quando Menelau foi atingido por uma flecha de Pandaro, sugaram o sangue da ferida e verteram-lhe em cima remédios calmantes, sem lhe prescreverem, tal como a Eurípio, o que devia beber ou comer depois? Sabiam que estes remédios bastavam para curar homens que, antes dos seus ferimentos, estavam sãos e cumpriam o seu regime, ainda que tivessem bebido naquele mesmo instante a beberagem de que falamos; quanto ao indivíduo enfermiço por natureza e incontinente, não pensavam que houvesse vantagem, para ele ou para os outros, em prolongar-lhe a vida, nem que a arte médica fosse feita em sua intenção, nem que fossem obrigados a tratá-los, ainda que fosse mais rico do que Midas.
Glauco — Coisas maravilhosas dizes dos filhos de Esculápio!
Sócrates — E não digo que não deva ser assim. Contudo, os poetas trágicos e Píndaro não compartilham da nossa opinião. Pretendem que Esculápio era filho de Apoio e que se deixou persuadir, a peso de ouro, a curar um homem rico atingido por uma doença mortal, pelo que foi ferido pelo raio. Quanto a nós, de acordo com o que dissemos atrás, não acreditamos simultaneamente nestas duas asserções: se Esculápio era filho de um deus, não podia ser ávido de lucros vergonhosos; e, se era ávido de um lucro sórdido, não era filho de um deus.

OS BONS JUÍZES E OS BONS MÉDICOS

Glauco — Tens toda a razão, Sócrates. Mas devemos ter bons médicos na cidade? Ora, os bons médicos são, principalmente, os que trataram o maior número de indivíduos saudáveis e não saudáveis; da mesma maneira, os bons juizes são os que têm convivido com homens de todos os caracteres?
Sócrates — Sem dúvida que são necessários bons juizes e bons médicos. Mas sabes quais são os que considero como tais?
Glauco — Sabe-lo-ei se me disseres.
Sócrates — E o que vou fazer; mas incluíste na mesma pergunta duas coisas diferentes.
Glauco — Como assim?
Sócrates — Os médicos mais hábeis seriam os que, começando logo na infância a aprender a sua arte, tivessem tratado o maior número de corpos e os mais doentes, e que, não sendo eles próprios de uma compleição saudável, tivessem sofrido todas as doenças. Pois, não curam, penso eu, o corpo pelo corpo — caso contrário, não conviria que fossem ou viessem a ser doentes —, mas o corpo pela alma, e a alma que foi ou está doente não pode ela própria tratar bem um mal, seja ele qual for.
Glauco — É verdade.
Sócrates — Mas o juiz, meu amigo, ainda que tenha de governar a alma de outrem pela sua, não tem necessidade de andar na companhia das almas perversas, nem que tenha percorrido a série de todos os crimes, com o único fim de poder, com acuidade, conjeturar por si mesma os crimes dos outros, como o médico conjetura as doenças do corpo; ao contrário, é preciso que se tenha mantido ignorante e pura do vício, se se quer que julgue corretamente o que é justo. Eis por que motivo as pessoas honradas se mostram simples na sua juventude e são facilmente enganadas pelos maus, visto que não há nelas modelos de sentimentos semelhantes aos dos perversos.
Glauco — A verdade é que se deixam seduzir amiúde.
Sócrates — Assim sendo, não convém que um juiz seja jovem, mas velho; é preciso que tenha aprendido tarde o que é a injustiça, que a tenha conhecido sem alojá-la em sua alma, mas estudando-a longamente, como uma estranha, na alma dos outros, e que a ciência, e não a sua própria experiência, lhe faça sentir claramente o mal que ela constitui.
Glauco — Um homem assim seria o verdadeiro juiz.
Sócrates — E mais: seria o bom juiz tal como tu o pedias, dado que quem tem a alma boa é bom. Quanto ao homem hábil e desconfiado, que cometeu muitas injustiças e se julga esperto e sábio, dá provas, certamente, de consumada prudência quando trata com os seus semelhantes, porque se refere aos modelos dos vícios que alojava dentro de si; mas, quando se encontra com gente já muito avançada em idade, revela-se tolo, incrédulo a despropósito, ignorante do que é um caráter são, porque não possui este modelo dentro de si. Contudo, como trata mais com os perversos do que com os honestos, passa mais por sábio do que por ignorante aos seus olhos e aos dos outros.
Glauco — É verdade.
Sócrates — Não é, pois, neste homem que devemos procurar o juiz bom e sábio, mas no primeiro. Com efeito, a perversidade não poderia conhecer-se a si mesma e conhecer a virtude, ao passo que a virtude de uma natureza cultivada pela educação conseguirá, com o tempo, conhecer-se a si mesma e conhecer o vício. Em minha opinião, pois, a verdadeira prudência é própria do homem virtuoso e não do mau.
Glauco — Sou do teu parecer.
Sócrates — Por consequência, estabelecerás em nossa cidade médicos e juizes tais como os descrevemos, para tratarem os cidadãos que são bem constituídos de corpo e alma; quanto aos outros, deixaremos morrer os que têm o corpo enfermiço; os que têm a alma perversa por natureza e incorrigível serão condenados à morte.
Glauco — E o que de melhor há a fazer com tais pessoas para o bem da cidade.
Sócrates — E também evidente que os nossos jovens se precaverão de ter necessidade de juízes se cultivarem essa música simples que, dizíamos nós, engendra a temperança.
Glauco — Não há dúvida.
Sócrates — E, se seguir as mesmas regras da ginástica, o músico que a pratica conseguirá dispensar o médico, exceto nos casos de urgência?
Glauco — Creio que sim.
Sócrates — Nos exercícios e trabalhos, propor-se-á estimular a parte generosa da sua alma, de preferência a aumentar a sua força, e, como os outros atletas, não regulará a sua alimentação e os seus esforços com vista ao vigor corporal.
Glauco — Muito bem.

A REPÚBLICA – PLATÃO

Obs.: títulos e subtítulos meus.

O CARÁTER DO CANTO E DA MELODIA NA ANÁLISE DE SÓCRATES

A melodia se compõe de três elementos: as palavras, a harmonia e o ritmo.

Sócrates — Resta-nos tratar do caráter do canto e da melodia, concordas?
Adimanto — Sim, evidentemente.
Sócrates — Haveria alguém que não dissesse, de pronto, o que devemos dizer acerca deles e o que devem ser, se nos quisermos manter de acordo com as ideias precedentes?
Então, Glauco, sorrindo, disse:
— Por mim, Sócrates, corro o risco de ser a exceção, porque não estou muito em condições de inferir, neste momento, o que devem ser essas coisas; no entanto, suspeito-o.
Sócrates — Estás ao menos em condições de fazer esta primeira observação, que a melodia se compõe de três elementos: as palavras, a harmonia e o ritmo.
Glauco — Quanto a isso, sim.
Sócrates — Quanto às palavras, diferem das que não são cantadas? Não devem ser compostas segundo as regras que enunciamos há pouco e de forma semelhante?
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — E a harmonia e o ritmo devem corresponder às palavras?
Glauco — Sim.
Sócrates — Já dissemos que não deveriam existir queixas e lamentações nos nossos discursos.
Glauco — Com efeito, por serem desnecessárias.
Sócrates — Quais são as harmonias plangentes? Diz-nos, visto que és músico.
Glauco — São a lídia mista, a aguda e outras semelhantes.
Sócrates — Convém, pois, suprimi-las, não é verdade? Porque são inúteis para as mulheres honradas e, com maior razão, para os homens.
Glauco — Certamente.
Sócrates — Nada há mais inconveniente para os guardiães do que a embriaguez, a moleza e a indolência.
Glauco — Sem dúvida.
Sócrates — Quais são harmonias efeminadas usadas nos banquetes?
Glauco — A jânica e a lídia que se denominam harmonias lassas.
Sócrates — De tais harmonias, meu amigo, tu te servirás para formar guerreiros?
Glauco — De maneira nenhuma. Receio que não te restem senão a dórica e a frígia.
Sócrates — Não conheço todas as harmonias, mas deixa-nos aquela que imita os tons e as entonações de um valente empenhado em batalha ou em qualquer outra ação violenta, quando, por infortúnio, corre ao encontro dos ferimentos, da morte ou é atingido por outra infelicidade, e, em todas essas circunstâncias, firme no seu posto e resoluto, repele os ataques do destino. Deixa-nos outra harmonia para imitar o homem empenhado numa ação pacífica, não violenta mas voluntária, que procura persuadir, para obter o que pede, quer um deus por intermédio de suas preces, quer um homem por intermédio das suas lições e conselhos, ou, ao contrário, solicitado, ensinado, convencido, se submete a outro e, tendo por estes meios sido bem-sucedido, não se enche de orgulho, mas se comporta em todas as circunstâncias com sabedoria e moderação, feliz com o que lhe acontece. Estas duas harmonias, a violenta e a voluntária, que imitarão com mais beleza as entonações dos infelizes, dos felizes, dos sábios e dos valentes, estas deixa-as ficar.
Glauco — As harmonias que me pedes para deixar não são senão aquelas que mencionei há pouco.
Sócrates — Não precisaremos pois, para os nossos cantos e as nossas melodias, de instrumentos com muitas cordas, que reproduzem todas as harmonias.
Glauco — Não, por certo.
Sócrates — Nem tampouco precisaremos de fabricantes de triângulos, pedis e outros instrumentos de muitas cordas e harmonias.
Glauco — Não, aparentemente.
Sócrates — Admitirás em nossa cidade os fabricantes e os tocadores de flauta? Não é este instrumento que pode emitir mais sons, e os instrumentos que reproduzem todas as harmonias não são imitações da flauta?
Glauco — E evidente.
Sócrates — Assim, restam a lira e a citara, úteis à cidade; nos campos, os pastores terão o pífaro.
Glauco — E o que se infere do nosso raciocínio.
Sócrates — De resto, meu amigo, não inovamos ao preferirmos Apolo e os instrumentos de Apoio a Mársias e seus instrumentos.
Glauco — Não, por Zeus! Não creio que estejamos inovando.
Sócrates — Mas, pelo cão! Sem nos darmos conta disso, purificamos a cidade que ainda há pouco dizíamos mergulhada na languidez.
Glauco — E o fizemos sabiamente.

A REPÚBLICA – PLATÃO

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O senhor de si mesmo – segundo Sócrates

Sócrates — Que faríamos para encontrar a justiça sem nos ocuparmos da temperança?
Glauco — Não sei, mas gostaria que ela não se apresentasse antes de examinarmos a temperança. Se queres me agradar, começa por analisar esta última.
Sócrates — Seria um erro recusar te agradar.
Glauco — Examina, pois.
Sócrates — E o que passo a fazer. Em verdade, ela se assemelha, mais do que as virtudes precedentes, a um acordo e a uma harmonia.
Glauco — Como assim?
Sócrates — A temperança, outra coisa não é que um domínio que se exerce sobre certos prazeres e paixões, como o indica — de uma forma que não considero exagerada — a expressão comum “senhor de si mesmo” e outras semelhantes, que são, por assim dizer, vestígios desta virtude. Não te parece?
Glauco — Certamente.
Sócrates — Mas a expressão “senhor de si mesmo” não é ridícula? Aquele que é senhor de si mesmo é também, acredito, escravo de si mesmo, e aquele que é escravo, é também senhor, porque ambas as expressões se referem à mesma pessoa.
Glauco — Não há dúvida.
Sócrates — Esta expressão parece-me querer dizer que existem duas partes na alma humana: uma superior em qualidade e outra inferior; quando a superior comanda a inferior, diz-se que é o homem senhor de si mesmo — o que é, sem dúvida, um elogio; mas quando, devido a uma má educação ou a uma má frequência, a parte superior, que é menor, é dominada pela massa dos elementos que compõem a inferior, censura-se este domínio como vergonhoso e diz-se que o homem em semelhante estado é escravo de si mesmo e corrupto.
Glauco — Parece-me sensata essa explicação.
Sócrates — Atenta agora para a nossa jovem cidade; verás uma dessas condições realizada e dirás que é com razão que se lhe chama senhora de si mesma, admitindo que se deve chamar moderado e senhor de si mesmo a tudo aquilo em que a parte superior comanda a inferior.
Glauco — Atento e vejo que falas verdade.
Sócrates — É claro que também descobrirás nela, em grande número e feitio, paixões, prazeres e dores, sobretudo nas crianças, nas mulheres, nos escravos e na turba de homens de baixa condição que são considerados livres.
Glauco — Sim, sem dúvida.
Sócrates — Porém, quanto aos sentimentos simples e moderados que o raciocínio dirige e que acompanham a inteligência e a reta opinião, só os encontrarás em raras pessoas, aquelas que, dotadas de excelente caráter, foram formadas por uma excelente educação.
Glauco — É verdade.
Sócrates — Não percebes também que, na tua cidade, os desejosa turba dos homens de baixa condição são dominados pelos desejo e pela sabedoria do número menor dos homens virtuosos?
Glauco — Percebo.
Sócrates — Se é possível dizer de uma cidade que é senhora dos seus prazeres, das suas paixões e de si mesma, é desta que é preciso dizê-lo.
Glauco — Não há dúvida.
Sócrates — E, por isso mesmo, pode-se concluir que ela possui temperança, não?
Glauco — Com toda a certeza.
Sócrates — E se, em qualquer outra cidade, os governantes têm a mesma opinião a respeito dos que devem mandar, na nossa cidade também residirá esse acordo, não é assim?
Glauco — Claro.
Sócrates — Ótimo! E quando os cidadãos alojam tais disposições, em quem dirias que se encontra a moderação: nos governantes ou nos governados?
Glauco — Em uns e em outros.
Sócrates — Vês que era bem fundada nossa conjectura, quando dizíamos que a moderação se assemelha a uma harmonia.
Glauco — Por que razão?
Sócrates — Porque não se dá com ela o mesmo que com a coragem e a sabedoria, que, residindo respectivamente numa parte da cidade, tornam esta corajosa e sábia. A moderação não atua assim: espalhada no conjunto do Estado, põe em uníssono da oitava os mais fracos, os mais fortes e os intermédios, sob a relação da sabedoria, se quiseres, da força, se também quiseres, do número, das riquezas ou de qualquer outra coisa semelhantes. De sorte que podemos dizer, com toda a razão, que a moderação consiste nessa concórdia, harmonia natural entre o superior e o inferior quanto à questão de saber quem deve mandar, tanto na cidade como no indivíduo.
Glauco — Estou de pleno acordo contigo.
Sócrates — Temos assim três virtudes que foram descobertas na nossa cidade: sabedoria, coragem e moderação para os chefes; coragem e moderação para os guardas; moderação para o povo. No que diz respeito à quarta, pela qual esta cidade também participa na virtude, que poderá ser? E evidente que é a justiça.

A REPÚBLICA – PLATÃO

Adimanto discursa a Sócrates sobre a justiça e a injustiça

— Acreditas, Sócrates, que a questão foi suficientemente desenvolvida?
Sócrates — E por que não?
Adimanto — O ponto essencial foi omitido.
Sócrates — Pois bem! De acordo com o provérbio, que o irmão socorra o irmão! Se Glauco esqueceu algum ponto, ajuda-o. No entanto, ele disse o suficiente para me pôr fora de combate e na impossibilidade de defender a justiça.
Adimanto — Desculpa inútil. Ouve mais isto. Com efeito, é preciso que eu exponha a tese contrária à que Glauco defendeu, a tese daqueles que elogiam a justiça e censuram a injustiça. Ora, os pais recomendam aos filhos que sejam justos e assim fazem todos os que são responsáveis por almas, elogiando não a justiça em si mesma, mas a reputação que ela acarreta, a fim de que aquele que parece justo consiga, por causa dessa reputação, os cargos, as alianças e todas as outras vantagens que Glauco enumerou como ligadas a uma boa fama. E essas pessoas levam ainda mais longe os benefícios da aparência. Falam como o bom Hesíodo e Homero. Com efeito, o primeiro diz que, para os justos, os deuses fazem com que:

Os carvalhos carreguem bolotas nos altos ramos
e abelhas no tronco;
acrescenta que, para eles,
as ovelhas se dobram ao peso do velo.

E que tenham muitos outros bens semelhantes. O segundo utiliza mais ou menos a mesma linguagem. Fala de alguém como:

de um rei irrepreensível que, temendo os deuses,
observa a justiça; e para ele, a terra negra produz
trigo e cevada, árvores vergadas sob o peso dos frutos;
o rebanho cresce e o mar oferece os seus peixes.

Museu e seu filho, da parte dos deuses, concedem aos justos recompensas ainda maiores. Conduzindo-os aos Campos Elísios, introduzem-nos no banquete dos virtuosos, onde, coroados de flores, os fazem passar o tempo a embriagar-se, como se a mais bela recompensa da virtude fosse uma embriaguez eterna. Outros prolongam as recompensas concedidas pelos deuses; dizem, com efeito, que o homem piedoso e fiel aos seus juramentos revive nos filhos dos seus filhos e na sua posteridade. E assim, e em termos parecidos, que fazem o elogio da justiça. Quanto aos ímpios e injustos, mergulham-nos na lama do Hades e os condenam a transportar água num crivo; durante a vida, os condenam à infâmia, e todos esses castigos que Glauco enumerou a propósito dos justos que parecem injustos são aplicados aos maus; não conhecem outros. Tal é a sua maneira de elogiar a justiça e censurar a injustiça.

Além disso, Sócrates, ouve outra concepção da justiça e da injustiça desenvolvida pelo povo e pelos poetas. Todos são unânimes em celebrar como boas a temperança e a justiça, mas as consideram difíceis e penosas; a intemperança e a injustiça, ao contrário, parecem-lhes agradáveis e de fácil domínio, somente vergonhosas na óptica da opinião pública e da lei; as ações injustas, dizem eles, são mais proveitosas do que as justas, no conjunto, e aceitam de bom grado proclamar os maus felizes e honrá-los, quando são ricos ou dispõem de algum poder; ao contrário, desprezam e olham com desdém para os bons que são fracos e pobres, embora reconhecendo que são melhores que os outros. Mas, de todos estes discursos, os mais estranhos são os que fazem acerca dos deuses e da virtude. Os próprios deuses, dizem eles, reservaram muitas vezes aos homens virtuosos o infortúnio e uma vida miserável, ao passo que concediam aos maus a sorte contrária. Por seu lado, sacerdotes mendigas e adivinhos vão às podas dos ricos e os convencem de que obtiveram dos deuses o poder de reparar as faltas que eles ou os seus antepassados cometeram, por meio de sacrifícios e encantamentos, com acompanhamento de prazeres e festas; se se quer prejudicar um inimigo por uma módica quantia, pode-se causar dano tanto ao justo como ao injusto, por intermédio das suas evocações e fórmulas mágicas, dado que, segundo afirmam, convencem os deuses a se colocarem a seu serviço. Em apoio a todas essas assertivas, invocam o testemunho dos poetas. Uns falam da facilidade do vício:

Para o mal em bandos nos encaminhamos
facilmente: o caminho é suave e ele mora pato;
mas diante da virtude os deuses colocaram suor e trabalho.

Os outros, para provar que os homens podem influenciar os deuses, alegam estes, vemos de Homero:

Os próprios deuses deixam-se dobrar;
e, pelo sacrifício e devota prece,
as libações e das vítimas a fumaça,
o homem aplaca-lhes a ira
quando infringiu as suas leis e pecou.

E produzem grande quantidade de livros de Museu e Orfeu, descendentes, dizem eles, de Selene e das Musas. Regulam os seus sacrifícios por esses livros e convencem nao apenas os simples cidadãos, mas também as cidades, de que se pode ser absolvido e purificado dos crimes, em vida ou depois da morte, por intermédio de sacrifícios e festas a que chamam mistérios. Estas práticas os livram dos males do outro mundo, mas, se as desprezarmos, esperam-nos terríveis suplícios.

Todos estes discursos, amigo Sócrates, e muitos outros que se fazem sobre a virtude, o vício e a estima que lhes dedicam os homens e os deuses, que efeito cremos que produzem na alma do jovem dotado de bom caráter que os ouve e é capaz, saltando de uma opinião para outra, de extrair daí uma resposta a esta pergunta: o que se deve ser e que caminho se deve seguir para atravessar a vida da melhor maneira possível? É provável que diga a si próprio, com Píndaro: Escalarei, pela justiça ou por tortuosos ardis, uma muralha mais alta, para aí me consolidar e passar a minha vida? Conforme aquilo que se diz, se eu for justo sem o parecer, não tirarei disso nenhum proveito, mas sim aborrecimentos e prejuízos evidentes; se eu for injusto, mas gozando de uma reputação de justiça, dirão que levo uma vida divina.
Portanto, visto que a aparência, como o demonstram os sábios, violenta a verdade e é senhora da felicidade, para ela devo tender inteiramente. Como fachada e cenário, devo criar ao meu redor uma imagem de virtude e imitar a raposa do muito sábio Arquiloco, animal astuto e rico em artimanhas. “Mas”, dir-se-á, “não é fácil esconder-se sempre quando se é mau”. Realmente, não, responderemos, e também nenhuma grande empresa é fácil; no entanto, se queremos ser felizes, devemos seguir o caminho que nos é traçado por esses discursos. Para não sermos descobertos, formaremos associações e sociedades secretas, e existem mestres de persuasão para nos ensinarem a eloquência pública e judiciária; graças a estes auxílios, convencendo aqui, violentando acolá, venceremos sem incorrer em castigo. “Mas”, argumentar-se-á, “não é possível escapar ao olhar dos deuses nem violentá-los.” Se eles não existem ou se não se ocupam dos problemas humanos, devemos preocupar-nos em escapar-lhes? E, se existem e se ocupam de nós, apenas os conhecemos por ouvir dizer e pelas genealogias dos poetas; ora, estes pretendem que são suscetíveis, por meio de sacrifícios, devotas preces ou oferendas, de se deixar dobrar e é preciso acreditar nestas duas coisas ou em nenhuma. Portanto, se é preciso acreditar, seremos injustos e lhes ofereceremos sacrifícios com o produto das nossas injustiças. Com efeito, se fôssemos justos, estaríamos isentos de castigo por eles, mas renunciaríamos aos benefícios da injustiça; ao contrário, sendo injustos, teremos esses benefícios e, por intermédio de preces, escaparemos ao castigo das nossas faltas e dos nossos pecados. “Mas no Hades”, dir-se-á, “sofreremos as penas das injustiças cometidas neste mundo, nós ou os filhos dos nossos filhos.” Mas, meu amigo, responderá o homem que raciocina, os mistérios podem muito, assim como os deuses libertadores, a crer nas grandes cidades e nos filhos dos deuses, poetas e profetas, que nos revelam estas verdades.

Por que motivo havemos de continuar a preferir a justiça à extrema injustiça, que, se a praticarmos com fingida honestidade, nos permitirá triunfar junto dos deuses e junto dos homens, durante a vida e depois da morte, como o afirmam a maior parte das autoridades e as mais eminentes? Depois do que foi dito, será ainda possível, Sócrates, consentir em honrar a justiça quando se dispõe de alguma superioridade, de alma ou de corpo, de riquezas ou de nascimento, e não rir ao ouvi-la louvar? Deste modo, se alguém estiver em condições de provar que mentimos e de se dar suficientemente conta de que a justiça é o melhor dos bens, será indulgente e não se encolerizará contra os homens injustos; sabe que, exceto aqueles que, sendo de natureza divina, sentem aversão pela injustiça, e aqueles que se abstêm porque receberam as luzes da ciência, ninguém é justo por vontade própria, mas que é apenas a covardia, a idade ou qualquer outra fraqueza que leva a censurar a injustiça, quando se é incapaz de a cometer. A prova é clara: com efeito, entre as pessoas que estão neste caso, a primeira que receber o poder de ser injusto será a primeira a usá-lo, na medida das suas possibilidades. E tudo isto não tem outra causa senão a que nos empenhou, ao meu irmão e a mim, nesta discussão, Sócrates, para te dizermos: “Ó admirável amigo, entre vós todos que pretendeis ser os defensores da justiça, a começar pelos heróis dos primeiros tempos cujos discursos chegaram até nós, ainda ninguém censurou a injustiça nem tampouco louvou a justiça de outro modo, exceto pela reputação, pelas honras e recompensas que a elas estão vinculadas; quanto ao fato de estarem uma e outra, por seu próprio poder, na alma que as possui, ocultas aos deuses e aos homens, ninguém, quer em verso, quer em prosa, jamais demonstrou suficientemente que uma é o maior dos males do espírito e a outra, a justiça, o seu maior bem. Com efeito, se nos falassem todos assim desde o começo e se, desde a infância, nos convencessem desta verdade, não precisaríamos nos defender mutuamente da injustiça, mas cada um de nós seria o melhor guarda de si mesmo, por causa do temor de, se fosse injusto, coabitar com o maior dos males”.

Tudo isso, Sócrates, e talvez mais, Trasímaco ou qualquer outro poderia dizê-lo a respeito da justiça e da injustiça, invertendo os seus respectivos poderes de forma deplorável, parece-me. Quanto a mim — pois não quero esconder-te nada —, foi com o desejo de te ouvir sustentar a tese contrária que envidei, tanto quanto possível, todos os meus esforços neste discurso. Por isso, não te limites a provar-nos que a justiça é mais forte que a injustiça; mostra-nos os efeitos que cada uma produz por si mesma na alma onde se encontra e que fazem que uma seja um bem e a outra, um mal. Coloca de lado as reputações que nos proporcionam, como te aconselhou Glauco. Se, com efeito, não colocares de lado, de um e de outro lado, as verdadeiras reputações e lhes adicionares as falsas, diremos que não aprecias a justiça, mas a aparência, que não censuras a injustiça, mas a aparência, que recomendas ao homem injusto que se esconda e que aceitas, da mesma forma que Trasímaco, que a justiça é um bem alheio, vantajoso para o mais forte, enquanto a injustiça é útil e vantajosa a si mesma, mas nociva ao mais fraco.

Dado que reconheceste que a justiça pertence à classe dos maiores bens, aqueles que devem ser procurados pelas suas consequências e muito mais por eles mesmos, como a visão, a audição, a razão, a saúde e todas as coisas que são verdadeiros bens devido à sua natureza e não segundo a opinião, louva, portanto, na justiça o que ela tem em si mesma de vantajoso para aquele que a possui e condena na injustiça o que ela tem de prejudicial; quanto às recompensas e à reputação, deixa que outros as louvem. Eu, do meu lado, aceitaria que outro louvasse a justiça e condenasse a injustiça desta maneira, elogiando e condenando a reputação e as recompensas que acarretam, mas não aceitarei que tu o faças, a não ser que me ordenes, visto que passaste toda a tua vida a analisar esta única questão. Não te contentes, pois, em provar-nos que a justiça é mais poderosa que a injustiça, mas demonstra-nos também, pelas consequências que cada uma delas produz em seu possuidor, ignoradas ou não pelos deuses e pelos homens, que uma é um bem e a outra, um mal.

PLATÃO – A REPÚBLICA – livro II

Glauco elogia a vida do injusto pretendendo ouvir Sócrates censurá-la e elogiar a justiça

Ainda não ouvi ninguém falar da justiça e da sua superioridade sobre a injustiça como o desejaria: gostaria de ouvir sendo elogiada em si mesma e por ela mesma. E é principalmente de ti que espero esse elogio. E por isso que, aplicando todas as minhas forças, elogiarei a vida do injusto e, ao fazê-lo, mostrarei de que maneira pretendo que censures a injustiça e elogies a justiça.

Começarei por dizer o que geralmente se entende por justiça e qual é a sua origem; em segundo lugar, que aqueles que a praticam não o fazem por vontade própria, por considerá-la uma coisa necessária, e não um bem; em terceiro lugar, que têm razão para agirem assim, dado que a vida do injusto é muito melhor do que a do justo, como afirmam. Quanto a mim, Sócrates, não compartilho esta opinião. No entanto, sinto-me embaraçado, pois tenho os ouvidos cheios dos argumentos de Trasímaco e mil outros. Ainda não ouvi ninguém falar da justiça e da sua superioridade sobre a injustiça como o desejaria: gostaria de ouvir sendo elogiada em si mesma e por ela mesma. E é principalmente de ti que espero esse elogio. E por isso que, aplicando todas as minhas forças, elogiarei a vida do injusto e, ao fazê-lo, mostrarei de que maneira pretendo que censures a injustiça e elogies a justiça.

O que geralmente se entende por justiça e qual é a sua origem

Os homens afirmam que é bom cometer a injustiça e mau sofrê-la, mas que há mais mal em sofrê-la do que bem em cometê-la. Por isso, quando mutuamente a cometem e a sofrem e experimentam as duas situações, os que não podem evitar um nem escolher o outro julgam útil entender-se para não voltarem a cometer nem a sofrer a injustiça. Daí se originaram as leis e as convenções e considerou-se legítimo e justo o que prescrevia a lei. É esta a origem e a essência da justiça: situa-se entre o maior bem — cometer impunemente a injustiça — e o maior mal — sofrê-la quando se é incapaz de vingança. Entre estes dois extremos, a justiça é apreciada não como um bem em si mesma, mas porque a impotência para cometer a injustiça lhe dá valor. Com efeito, aquele que pode praticar esta última jamais se entenderá com ninguém para se abster de cometê-la ou sofrê-la, porque seria louco. É esta, Sócrates, a natureza da justiça e a sua origem, segundo a opinião comum.

Aqueles que a praticam não o fazem por vontade própria, por considerá-la uma coisa necessária, e não um bem

Agora, que aqueles que a praticam agem pela impossibilidade de cometerem a injustiça é o que compreenderemos bem se fizermos a seguinte suposição. Concedamos ao justo e ao injusto a permissão de fazerem o que querem; sigamos-los e observemos até onde o desejo leva a um e a outro. Apanharemos o justo em flagrante delito de buscar o mesmo objetivo que o injusto, impelido pela necessidade de prevalecer sobre os outros: é isso que a natureza toda procura como um bem, mas que, por lei e por força, é reduzido ao respeito da igualdade. A permissão a que me refiro seria especialmente significativa se eles recebessem o poder que teve outrora, segundo se conta, o antepassado de Giges, o Lídio. Este homem era pastor a serviço do rei que naquela época governava a Lídia. Cedo dia, durante uma violenta tempestade acompanhada de um terremoto, o solo fendeu-se e formou-se um precipício perto do lugar onde o seu rebanho pastava. Tomado de assombro, desceu ao fundo do abismo e, entre outras maravilhas que a lenda enumera, viu um cavalo de bronze oco, cheio de pequenas aberturas; debruçando-se para o interior, viu um cadáver que parecia maior do que o de um homem e que tinha na mão um anel de ouro, de que se apoderou; depois partiu sem levar mais nada. Com esse anel no dedo, foi assistir à assembleia habitual dos pastores, que se realizava todos os meses, para informar ao rei o estado dos seus rebanhos. Tendo ocupado o seu lugar no meio dos outros, virou sem querer o engaste do anel para o interior da mão; imediatamente se tomou invisível aos seus vizinhos, que  falaram dele como se não se encontrasse ali. Assustado, apalpou novamente o anel, virou o engaste para fora e tomou-se visível. Tendo-se apercebido disso, repetiu a experiência, para ver se o anel tinha realmente esse poder; reproduziu-se o mesmo prodígio: virando o engaste para dentro, tomava-se invisível; para fora, visível. Assim que teve a certeza, conseguiu juntar-se aos mensageiros que iriam ter com o rei. Chegando ao palácio, seduziu a rainha, conspirou com ela a morte do rei, matou-o e obteve assim o poder. Se existissem dois anéis desta natureza e o justo recebesse um, o injusto outro, é provável que nenhum fosse de caráter tão firme para perseverar na justiça e para ter a coragem de não se apoderar dos bens de outrem, sendo que poderia tirar sem receio o que quisesse da ágora, introduzir-se nas casas para se unir a quem lhe agradasse, matar uns, romper os grilhões a outros e fazer o que lhe aprouvesse, tornando-se igual a um deus entre os homens. Agindo assim, nada o diferenciaria do mau: ambos tenderiam para o mesmo fim. E citar-se-ia isso como uma grande prova de que ninguém é justo por vontade própria, mas por obrigação, não sendo a justiça um bem individual, visto que aquele que se julga capaz de cometer a injustiça comete-a. Com efeito, todo homem pensa que a injustiça é individualmente mais proveitosa que a justiça, e pensa isto com razão, segundo os partidários desta doutrina. Pois, se alguém recebesse a permissão de que falei e jamais quisesse cometer a injustiça nem tocar no bem de outrem, pareceria o mais infeliz dos homens e o mais insensato àqueles que soubessem da sua conduta; em presença uns dos outros, elogiá-lo-iam, mas para se enganarem mutuamente e por causa do medo de se tomarem vítimas da injustiça. Eis o que eu tinha a dizer sobre este assunto.

Eles têm razão por agirem assim, dado que a vida do injusto é muito melhor do que a do justo

Agora, para fazermos um juízo da vida dos dois homens aos quais nos referimos, confrontemos o mais justo com o mais injusto e estaremos em condição de julgá-los bem; de outro modo não o conseguiríamos. Mas como estabelecer esta confrontação? Assim: não tiremos nada ao injusto da sua injustiça nem ao justo da sua justiça, mas consideremo-los perfeitos, cada um em sua modalidade de vida. Em primeiro lugar, que o injusto aja como os artesãos hábeis — como o piloto experiente, ou o médico, distingue na sua arte o impossível do possível, empreende isto e abandona aquilo; se se engana em algum ponto, é capaz de corrigir o erro —, tal como o injusto se dissimula habilmente quando realiza alguma má ação, se quer ser superior na injustiça. Daquele que se deixa apanhar deve-se fazer pouco caso, porque a extrema injustiça consiste em parecer justo não o sendo. Portanto, deve-se conceder ao homem perfeitamente injusto a perfeita injustiça, não suprimir nada e permitir que, cometendo os atos mais injustos, retire deles a maior reputação de justiça; que, quando se engana em alguma coisa, é capaz de corrigir o erro, de falar com eloquência para se justificar se um dos seus crimes for denunciado, e usar de violência nos casos em que a violência for necessária, ajudado pela sua coragem, o seu vigor e os seus recursos em amigos e dinheiro. Diante de tal personagem coloquemos o justo, homem simples e generoso, que quer, de acordo com Esquilo, não parecer, mas ser bom. Tiremos-lhe esta aparência. Se, com efeito, parecer justo, receberá, como tal, honrarias e recompensas; saber-se-á então se é pela justiça ou pelas honrarias e as recompensas que ele é assim. Para isso, é preciso despojá-lo de tudo, exceto de justiça, e fazer dele o oposto do anterior. Sem que cometa ato injusto, que tenha a maior reputação de injustiça, a fim de que a sua virtude seja posta à prova, não se deixando enfraquecer por uma má fama e suas consequências; que se mantenha inabalável até a morte, parecendo injusto durante a vida toda, mas sendo justo, a fim de que, chegando ambos aos extremos, um da justiça, outro da injustiça, possamos julgar qual é o mais feliz.

Sócrates — Oh, meu caro Glauco! Com que energia estás limpando, tal qual estátuas, esses dois homens, para os submeteres ao nosso julgamento!

Glauco — Faço o melhor que posso. Agora, se eles são como acabo de os apresentar, julgo não ser difícil descrever o gênero de vida que os espera. Portanto, digamo-lo; e, se esta linguagem for demasiado rude, lembra-te, Sócrates, que não sou eu quem fala, mas aqueles que situam a injustiça acima da justiça. Eles dirão que o justo, tal como o representei, será açoitado, torturado, acorrentado, terá os olhos queimados, e que, finalmente, tendo sofrido todos os males, será crucificado e saberá que não se deve querer ser justo, mas parecê-lo. Assim, as palavras de Esquilo aplicar-se-iam muito mais exatamente ao injusto; porque, na realidade, dirão: é aquele cujas ações estão de acordo com a verdade e que, não vivendo para as aparências, não quer parecer injusto, mas sê-lo:

“No sulco profundo de seu espírito ele colhe a seara dos felizes projetos.

Em primeiro lugar, governa na sua cidade, graças ao seu aspecto de homem justo; em seguida, arranja mulher onde lhe apraz, constitui associações de prazer ou de negócios com quem lhe agrada e tira proveito de tudo isso, porque não tem escrúpulos em ser injusto. Se entra em conflito, público ou privado, com alguém, prevalece sobre o adversário; por este meio enriquece-se, ajuda os amigos, prejudica os inimigos, oferece aos seus deuses sacrifícios e presentes com prodigalidade e magnificência e concilia, muito melhor que o justo, os deuses e os homens a quem quer agradar, sendo, por conseguinte, mais agradável aos deuses do que o justo. Deste modo, dizem eles, Sócrates, os deuses e os homens proporcionam ao injusto uma vida melhor que ao justo.

A República, Platão, Livro II

Os três tipos de bens que buscamos, segundo Glauco falando a Sócrates em “A República” L II, de Platão

1º tipo de bens

Glauco — Não te parece que existe uma espécie de bens que buscamos não objetivando as suas consequências, mas porque os amamos em si mesmos, como a alegria e os prazeres inofensivos, que, por isso mesmo, não têm outro efeito que não seja o deleite daquele que os possui?

Sócrates — Sim, acredito sinceramente que existem bens dessa espécie.

2º tipo de bens

Glauco — E não existem bens que amamos por si mesmos e também por suas consequências, como o bom senso, a visão, a saúde? Com efeito, tais bens nos são preciosos por ambos os motivos.

Sócrates — Sim.

3º tipo de bens

Glauco — Mas não vês uma terceira espécie de bens como a ginástica, a cura de uma doença, o exercício da arte médica ou de outra profissão lucrativa? Poderíamos dizer destes bens que exigem boa vontade; nós os buscamos não por eles mesmos, mas pelas recompensas e as outras vantagens que proporcionam.

Sócrates — Concordo que essa terceira espécie existe. Mas aonde queres chegar?

Glauco — Em qual dessas espécies tu colocas a justiça?

O melhor dos bens, segundo Sócrates

Sócrates — Na mais bela, creio, na dos bens que, por si mesmos e por suas consequências (2º tipo), deve amar aquele que quer ser plenamente feliz.

O melhor dos bens, na opinião da maioria dos homens

Glauco — Não é a opinião da maioria dos homens, que põem a justiça no nível dos bens penosos que é preciso cultivar pelas recompensas e distinções que proporcionam (3º tipo), mas que devem ser evitados por eles mesmos, porque são difíceis.

Sócrates — Eu sei que é essa a opinião da maioria. E por isso que, desde há muito, Trasímaco censura esses bens e elogia injustiça. Mas, segundo parece, eu tenho a cabeça dura.

Giges, o Lídio – o mito do anel

Glauco, discursando a Sócrates, em certo ponto expõe uma opinião sobre a natureza e a origem da justiça, e sobre aqueles que a praticam: – “Escuta, então, o que eu vou expor-te em primeiro lugar: qual é a natureza e a origem da justiça.”“Aqueles que a praticam, agem pela impossibilidade de cometerem a injustiça”. Para explicar essa opinião, ele apresenta um mito sobre um homem, teoricamente injusto, chamado Giges, que comete injustiça ao descobrir poderes mágicos. Então Glauco propõe uma suposição sobre o mito afirmando que um homem justo descobrindo os mesmos poderes mágicos praticaria também a mesma injustiça.

Opinião de Glauco sobre a natureza e a origem da justiça

Sócrates — Claro que me convém. Com efeito, de que assunto um homem sensato apreciaria falar e ouvir falar com mais frequência?
Glauco — A tua observação é excelente. Escuta, então, o que eu vou expor-te em primeiro lugar: qual é a natureza e a origem da justiça. Os homens afirmam que é bom cometer a injustiça e mau sofrê-la, mas que há mais mal em sofrê-la do que bem em cometê-la. Por isso, quando mutuamente a cometem e a sofrem e experimentam as duas situações, os que não podem evitar um nem escolher o outro julgam útil entender-se para não voltarem a cometer nem a sofrer a injustiça. Daí se originaram as leis e as convenções e considerou-se legítimo e justo o que prescrevia a lei. E esta a origem e a essência da justiça: situa-se entre o maior bem — cometer impunemente a injustiça — e o maior mal — sofrê-la quando se é incapaz de vingança. Entre estes dois extremos, a justiça é apreciada não como um bem em si mesma, mas porque a impotência para cometer a injustiça lhe dá valor. Com efeito, aquele que pode praticar esta última jamais se entenderá com ninguém para se abster de cometê-la ou sofrê-la, porque seria louco. E esta, Sócrates, a natureza da justiça e a sua origem, segundo a opinião comum. Agora, que aqueles que a praticam agem pela impossibilidade de cometerem a injustiça é o que compreenderemos bem se fizermos a seguinte suposição. Concedamos ao justo e ao injusto a permissão de fazerem o que querem; sigamo-los e observemos até onde o desejo leva a um e a outro. Apanharemos o justo em flagrante delito de buscar o mesmo objetivo que o injusto, impelido pela necessidade de prevalecer sobre os outros: é isso que a natureza toda procura como um bem, mas que, por lei e por força, é reduzido ao respeito da igualdade. A permissão a que me refiro seria especialmente significativa se eles recebessem o poder que teve outrora, segundo se conta, o antepassado de Giges, o Lídio.

Este é o mito descrito por Glauco, segundo Platão em A República II

Este homem era pastor a serviço do rei que naquela época governava a Lídia. Cedo dia, durante uma violenta tempestade acompanhada de um terremoto, o solo fendeu-se e formou-se um precipício perto do lugar onde o seu rebanho pastava. Tomado de assombro, desceu ao fundo do abismo e, entre outras maravilhas que a lenda enumera, viu um cavalo de bronze oco, cheio de pequenas aberturas; debruçando-se para o interior, viu um cadáver que parecia maior do que o de um homem e que tinha na mão um anel de ouro, de que se apoderou; depois partiu sem levar mais nada. Com esse anel no dedo, foi assistir à assembleia habitual dos pastores, que se realizava todos os meses, para informar ao rei o estado dos seus rebanhos. Tendo ocupado o seu lugar no meio dos outros, virou sem querer o engaste do anel para o interior da mão; imediatamente se tomou invisível aos seus vizinhos, que falaram dele como se não se encontrasse ali. Assustado, apalpou novamente o anel, virou o engaste para fora e tomou-se visível.
Tendo-se apercebido disso, repetiu a experiência, para ver se o anel tinha realmente esse poder; reproduziu-se o mesmo prodígio: virando o engaste para dentro, tomava-se invisível; para fora, visível. Assim que teve a certeza, conseguiu juntar-se aos mensageiros que iriam ter com o rei. Chegando ao palácio, seduziu a rainha, conspirou com ela a morte do rei, matou-o e obteve assim o poder.

Para ampliar o conhecimento sobre o assunto, tomei a liberdade de acrescentar nesta postagem, parte do artigo Nova interpretação da passagem 359d da República de Platão, de Luiz Maurício Bentim da Rocha Menezes, publicado na Kriterion – Revista de Filosofia, nos critérios da  Licença Creative Commons.

Exposição do Problema

O que queremos atentar com este trabalho é o caráter complexo de Gyges que fez com que se desenvolvessem diversas histórias a seu respeito, sendo a mais famosa aquela que conta a maneira como ele chegou ao poder. Sua fama percorreu o mundo grego influenciando tanto seus contemporâneos como aqueles que posteriormente vieram. A lírica grega desenvolvida entre os séculos VII e VI deixou, nos fragmentos que nos restaram, um precioso tesouro a respeito de Gyges da Lídia, que posteriormente veio a servir de base tanto para os historiadores como para os filósofos que dele falaram.

A primeira fonte que temos a seu respeito é de Arquíloco de Paros, que assim nos fala sobre ele:

ο µοι τ Γύγεω το πολυχρύσου µέλει,
ο
δ’ ελέ πώ µε ζλος, οδ’ γαίοµαι
θε
ν ργα, µεγάλης δ’ οκ ρέω τυραννίδος·
απόπροθεν γάρ
στιν φθαλµν µν.
Não me preocupam as coisas de Gyges, rico em ouro,
Nem ainda me persegue a cobiça, nem invejo
As obras dos deuses, ou amor pela grande tirania;
Isto longe está dos meus olhos.(1)

Arquíloco que viveu entre 680-640 a.C.(2) foi contemporâneo de Gyges, que teria reinado entre 682-644 a.C.(3). Tal fragmento além de ser o primeiro a tratar de Gyges, parece também ter sido o primeiro a utilizar no grego o termo “tirania”. Segundo Ure, a palavra tirania não é grega, mas pode ser de origem lídia(4). Para Adrados, a palavra designa o poder absoluto dos monarcas orientais(5). De acordo com Euphorion (séc. III a.C.), Gyges foi o primeiro a ser chamado de tirano(6). Tal declaração pode ser apenas uma inferência de Hippias de Élis, que disse não ter Homero usado a palavra τύραννος, mas seu uso somente aparece com Arquíloco (FHG, II, fr.7, p.62).

O fr. 19W indica o poder de Gyges, entre riqueza e posses, que faz dele o senhor da Lídia e tirano da Ásia. Apesar de o poema estar na primeira pessoa, sabemos que Arquíloco não se coloca como falante, mas atribui o dito ao personagem Kháron, conforme nos informa Aristóteles:

κα τν Χάρωνα τν τέκτονα ν τ άµβ ο ρχή
ο
µοι τ Γύγεω
e Kháron, o carpinteiro, em iambo, assim começa:
Não a mim as coisas de Gyges(7)

O uso de uma personagem para dizer algo sobre outro é um método original da crítica de Arquíloco. Segundo West argumenta, há um particular tipo de poesia que os antigos chamam de iambo para usar personagens imaginários e situações(8).

Outros poetas líricos anteriores a Heródoto comprovam a historicidade de Gyges sendo estes Alcman (fl. 652 a.C.), Mimnermo (fl. 632 a.C.) e Hipponax (fl. 540 a.C.). É interessante notarmos que Mimnermo compôs versos elegíacos da batalha entre Smyrna contra Gyges e os Lídios, e parece ter escrito uma Smyrneida, infelizmente perdida(9). Também podemos encontrar um poema referente a Anacreonte que muito se parece como o que Arquíloco escreveu a respeito de Gyges:

ο µοι µέλει τ Γύγεω,
το
Σαρδίων νακτος·
ο
δ’ ελέ πώ µε ζλος
ο
δ φθον τυράννοις.
Não me preocupam as coisas de Gyges,
Senhor de Sardis,
Nem me persegue a cobiça,
Nem invejo aos tiranos.(10)

No Greek Anthology, encontramos um poema semelhante atribuído Anacreonte, mudando em sua estrutura as linhas 3 e 4, apesar de manter dentro do fragmento a coerência quanto a riqueza e à tirania:

ο µοι µέλει τ Γύγεω,
το
Σαρδίων νακτος,
ο
θ’ αρέει µε χρυσός,
ο
κ ανέω τυράννους.
Não me preocupam as coisas de Gyges,
Senhor de Sardis,
Nem me captura o ouro,
Nem louvo os tiranos.
(11)

Ressaltamos que o que aqui se diz de Anacreonte foi produzido posteriormente à morte do poeta no período helenístico e atribuído ao poeta de forma pseudepigráfica. Esse material se encontra reunido na obra conhecida como Anacreontea. De qualquer maneira, estes, assim como os demais fragmentos dos outros poetas, demonstram a repercussão do lídio Gyges entre os gregos.

Heródoto nos conta a história de Gyges da seguinte maneira(12): Candaules, o soberano da Lídia, oferece a Gyges, seu guarda pessoal, a permissão para que este veja sua mulher nua e, assim, possa comprovar que ela é a mais bela. Pois, segundo diz Candaules, “os homens confiam menos em seus ouvidos do que em seus olhos”(13) Mesmo dizendo-se persuadido [peíthomai] pelas palavras de Candaules, de que sua mulher é a mais bela, Gyges é obrigado a ver para comprovar tal fato. Escondido atrás da porta do quarto, Gyges vê a rainha nua e quando se preparava para se retirar, acabou sendo visto por ela sem que ele assim percebesse. Entendendo o ocorrido e percebendo que se tratava de obra de Candaules, a rainha nada fala e aguarda. No dia seguinte, a rainha chama Gyges em sua presença e apresenta a este dois caminhos [dyôn hodôn]: ou mata o soberano ou morre(14). Este para evitar a morte escolhe matar o soberano e assim toma para si a mulher e a soberania [gynaíka kaì tèn basileíen].(15)

 

É interessante notarmos que as fontes anteriores a Heródoto são todas líricas, o que demonstra uma tradição entre os poetas líricos de narrar acontecimentos dos quais ouviram falar. A interpretação histórica da passagem 359d, segundo entendemos, deve levar em conta não só Heródoto como também toda essa poesia lírica anterior a este e que afirma a fama de Gyges entre os gregos.

 Uma Nova Interpretação da Passagem

O estudo da passagem escolhida em Platão apresenta uma série de dificuldades, como foi demonstrado através da apresentação das duas interpretações acima. No entanto, para o tratamento da mesma, ambas se demonstraram insuficientes em seus argumentos. Para resolver tal problema propomos uma nova interpretação da passagem, mas antes devemos analisar em que ponto as interpretações anteriores são defectíveis.

Para demonstrar os problemas da interpretação histórica utilizaremos as explicações de Slings(41) sobre a passagem 359d1 e a crítica que faz ao ponto de vista histórico:

i) O anel é sempre chamado ‘Anel de Gyges’, como na passagem 612b. Comentários posteriores a Platão mantêm o termo. Um comentário ao mss A [τν κατ Γύγην τν Λυδν στορίαν κα τν δακτύλιον] deixa de fora o antepassado e também o comentário ao mss F [περ τς το Γύγου σφενδόνης]. A exceção é apenas em Proclo e serve apenas para provar que os textos ADF já existiam na Antiguidade.

ii) Não nos parece que Platão estava preocupado com a genealogia lídia, mas podemos tentar manter que ‘Anel de Gyges’ é um termo curto para ‘Anel do ancestral de Gyges’. No entanto, outros elementos da história, como o assassinato do soberano e a cooperação da rainha, são ditos sobre Gyges ele mesmo, e não sobre seu bisavô, que tem o mesmo nome.

iii) το Λυδο não pode aqui se referir a Kroisos, mesmo que Heródoto tenha se referido a ele diversas vezes como Λυδός. Neste contexto, το Λυδο deveria significar ‘o presente soberano da Lídia’, o que não faria sentido. No contexto da passagem, Λυδός não poderia se referir a Kroisos por excelência.

iv) Não é coincidência que a palavra lídia transcrita como γύγης, realmente significou ‘avô; antepassado’. Isto era conhecido pelos gregos e aparece no Lexicon de Hesychius: γ972 (Latte) γύγαι· πάπποι.

Hesychius viveu no séc. V d.C. e é conhecido por ter compilado um léxico de palavras gregas incomuns e pouco conhecidas. Por ter vivido na mesma época que Proclo (que também era do séc. V d.C.), acreditamos que a inserção do προγόν a passagem 359d1 é tardia e provavelmente desta época, influenciada pelo léxico de Hesychius. Parece que na época de Platão a palavra γύγης seria facilmente associada com a palavra πάππος, no entanto, com a perda progressiva de seu significado, a inserção de προγόν foi utilizada para rememorar tal raiz etimológica. Concordamos com Slings que a inserção de τ προγόν seria um erro em relação ao texto primitivo. Ast em sua edição da República corrige a passagem retirando o τ e προγόν da passagem, mas mantendo o genitivo intacto [Γύγου το Λυδο], o que não dá conta da inserção. Parece-nos que a melhor maneira de corrigir o texto seria a explicação de Slings que assim coloca como sendo a passagem original: Γύγ τ Λυδ. Dessa forma, entraria em harmonia com a passagem 612b, mantendo Gyges como único possuidor do anel no texto platônico, assim como também estaria de acordo com a posterior inclusão dos termos τ e προγόν sem prejuízo para a interpretação da passagem 359d(47).

  Artigo recebido em 23/2/2011 e aprovado em 4/7/2011.

 1- Fr. 19W. A tradução é nossa.
2- Para a data aproximada de Arquíloco nos baseamos em JACOBY, F. “The Date of Archilochos”, The Classical Quarterly, v. 35, n.3, p. 97-109, jul.-oct. 1941.
3- A data comumente aceita pelos estudiosos é de 687-652 a.C., principalmente depois dos estudos de GELZER, H. “Das Zeitalter des Gyges”, RhM, v. 30, p. 230-268, 1875. No entanto, concordamos com os estudos de SPALINGER, Anthony J., “The Date of the Death of Gyges and its Historical Implications”, JAOS, v. 98, n. 4, p. 400-409, oct.-dec., 1978. Spalinger em seu texto aponta para o fato de que a morte de Gyges só é apontada no Prisma A dos anais de Assurbanipal. Tal Prisma data de 643/2 a.C., o que faz Spalinger calcular a morte de Gyges por volta de 644 a.C. Para calcular a data inicial do reinado de Gyges, nos baseamos na duração dita por Heródoto do reinado de Gyges, trinta e oito anos.
4- URE, P. N. The Origen of Tyranny. Cambridge: Cambridge University Press, 1922, p. 134.
5- ADRADOS, F. R. Líricos Griegos: Elegiacos y Yambógrafos Arcaicos, v.1. Madrid: Consejo Superior de Investigaciones Científicas, 1999, nota 2, p. 54.
6- MÜLLER, C. Fragmenta Historicum Graecorum, vol. III. Paris: Editore Ambrosio Firmin Didot, 1849, fr. 1, p. 72. Demais citações de Müller serão abreviadas por FHG, indicando-se em seguida volume, fragmento ou/e página.
7- ARISTÓTELES. Arte Retórica, 1418b30-31. Utilizamos para o grego a edição de W. D. Ross, Aristotelis Ars Rhetorica (Oxford: Clarendon Press, 1959). A tradução é nossa.
8- WEST, Martin. Studies in Greek Elegy and Iambus. (Untersuchungen zur antiken Literatur und Geschichte, Band 14) Berlin and New York: Walter de Gruyter, 1974, p. 22-39.
9- Frs. 13W e 13aW.
10- Anacreontea 8W. A tradução é nossa.
11- Greek Anthology, XI.47.1-4. A tradução é nossa.
12- HERODOTO. Histórias, I.8-15. Demais citações a Heródoto serão abreviadas por Hdt., indicando em seguida livro e parte. Utilizamos para o grego o texto estabelecido por Carolus Hude, Herodoti Historiae, Tomes I e II, (Oxford: Oford University Press, 1927).
13- Hdt. I.8.2.
14- Hdt. I,11.2-3.
15- Hdt. I,12.2.
16- PLATÃO. República, 359b-360b. Utilizamos aqui a tradução de Maria Helena da Rocha Pereira A República (Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001).
17- Utilizamos aqui o texto grego da República estabelecido por S. R. Slings, Platonis Rempvblicam (Oxford: Oxford University Press, 2003).
18- Cf. ADAM, James. The Republic of Plato. Cambridge: Cambridge University Press, 1979, p. 126-7,
41- SLINGS, S. R., “Critical Notes on Plato’s Politeia II”, Mnemosyne, v. 17, fasc. 3-4, p. 381-383, 1989.
47- Feitas as modificações, o texto poderia ser assim traduzido: “terem a faculdade que se diz ter sido concedida a Gyges, o Lídio” ou com a posterior inclusão dos termos “ao antepassado lídio, Gyges”.

Sócrates e Trasímaco, diálogo sobre o que é justiça

Sócrates — Tens razão quanto ao fato de que me instruo com os outros, mas estás enganado ao pretender que não lhes pago na mesma moeda. Pois eu pago na medida em que posso. Ora, não posso senão aplaudir, porque não possuo riquezas. Mas a alegria com que o faço, quando julgo que alguém fala bem, tu a conhecerás logo que me tenhas respondido; porque eu julgo que falarás bem.
Trasímaco — Ouve, então. Eu digo que a justiça é simplesmente o interesse do mais forte. Então, que esperas para me aplaudir? Vais-te recusar!
Sócrates — Em primeiro lugar, deixa que eu compreenda o que dizes, porque ainda não entendi. Pretendes que justiça é o interesse do mais forte. Mas como entendes isso, Trasímaco? Com efeito, não pode ser da seguinte maneira: Se Polidamas é mais forte do que nós e a carne de boi é melhor para conservar suas forças, não dizes que, também para nós, mais fracos do que  ele, esse alimento é vantajoso e ao mesmo tempo, justo? (Polidamas: atleta de enorme compleição; vencedor dos Jogos Olímpicos de 408).
Trasímaco — És um cínico, Sócrates. Tomas as minhas palavras por onde podes atacá-las melhor!
Sócrates — De forma alguma, nobre homem. Mas exprime-te mais claramente.
Trasímaco — De acordo! Tu sabes que, entre as cidades, umas são tirânicas, outras democráticas, outras aristocráticas.
Sócrates — Logicamente que sei.
Trasíxnaco — Portanto, o setor mais forte, em cada cidade, é o governo?
Sócrates — Sim.
Trasfmaco — E cada governo faz as leis para seu próprio proveito: a democracia, leis democráticas; a tirania, leis tirânicas, e as outras a mesma coisa; estabelecidas estas leis, declaram justo, para os governados, o seu próprio interesse, e castigam quem o transgride como violador da lei, culpando-o de injustiça. Aqui tens, homem excelente, o que afirmo: em todas as cidades o justo é a mesma coisa, isto é, o que é vantajoso para o governo constituído; ora, este é o mais forte, de onde se segue, para um homem de bom raciocínio, que em todos os lugares o justo é a mesma coisa: o interesse do mais forte.
Sócrates — Agora compreendo o que dizes. Procurarei estudá-lo. Portanto, também tu, Trasímaco, respondeste que aquilo que é vantajoso é justo, depois de me teres proibido de dar essa resposta, acrescentando, contudo: o interesse “do mais forte”.
Trasímaco — Uma pequena adição, talvez?
Sócrates — Ainda não é evidente que seja grande; mas é evidente que é necessário examinar se falas verdade. Reconheço que o justo é algo vantajoso; mas tu acrescentas à definição que é o interesse do mais forte; por mim, ignoro-o: preciso analisá-lo.
Trasímaco — Analisa-o.
Sócrates — Assim farei. Agora, diz-me: não julgas ser justo obedecer aos governantes?
Trasímaco — Julgo.
Sócrates — Mas os governantes são sempre infalíveis ou passíveis de se enganarem?
Trasímaco — E evidente que são passíveis de se enganarem.
Sócrates — Logo, qúando elaboram leis, fazem-nas boas e más?
Trasímaco — É assim que eu penso.
Sócrates — As boas leis são aquelas que instituem o que lhes é vantajoso e as más o que lhes é desvantajoso?
Trasímaco — Sim.
Sócrates — Mas o que eles instituíram deve ser obedecido pelos governados; é nisto que consiste a justiça?
Trasímaco — Com certeza.
Sócrates — Logo, na tua opinião, não apenas é justo fazer o que é vantajoso para o mais forte, mas também o contrário, o que é desvantajoso.
Trasímaco — Que estás dizendo?!
Sócrates — O que tu mesmo dizes, penso; mas examinemos melhor. Não concordamos que, às vezes, os governantes se enganam quanto ao que é o melhor, impondo determinadas leis aos governados? E que, por outro lado, é justo que os governados obedeçam ao que lhes ordenam os governantes? Não concordamos?
Trasímaco — Sim.
Sócrates — Então, acreditas também justo fazer o que é desvantajoso para os governantes e para os mais fortes, quando os governantes, inadvertidamente, dão ordens que lhes são prejudiciais, porquanto tu afirmas ser justo que os governados façam o que ordenam os governantes. Portanto, sábio amigo Trasímaco, não decorre necessariamente que é justo fazer o contrário daquilo que dizes? Com efeito, ordena-se ao mais fraco que faça o que é prejudicial ao mais forte.
Polemarco — Por Zeus, Sócrates, isso é claríssimo!
Clitofonte — Se ao menos testemunhasses por ele…
Polemarco — E quem necessita de testemunho? Trasímaco reconhece que às vezes os governantes fazem leis que lhes são prejudiciais e que é justo que os governados obedeçam a tais leis.
Clitofonte — Com efeito, Polemarco, Trasímaco afirmou ser justo que sejam obedecidas as ordens dadas pelos governantes.
Polemarco — De fato, Clitofonte, Polemarco considerou justo o que é vantajoso para o mais forte. Ao enunciar estes dois princípios, reconheceu também que, às vezes, os mais fortes dão aos mais fracos e aos governados ordens que são prejudiciais a eles mesmos. Destas declarações decorre que a justiça é tanto a vantagem como a desvantagem do mais forte.
Clitofonte — Mas ele definiu como vantagem do mais fone o que o mais forte crê ser vantajoso para ele; é isso que o mais fraco tem de fazer e foi isso que Trasímaco considerou justo.
Polemarco — Ele não se expressou desse modo!
Sócrates — Isso não importa, Polemarco. Porém, se agora Trasímaco se expressa assim, admitamos que é assim que o entende. Diz-me, Trasímaco: entendes por justiça o que parece vantajoso para o mais forte, quer isso lhe seja vantajoso, quer não? Podemos dizer que te expressas assim?
Trasíinaco — De forma alguma. Acreditas que julgo aquele que se engana o mais forte, no momento em que se engana?
Sócrates — Assim acreditava quando tu reconheceste que os governantes não são infalíveis, mas que podem enganar-se.
Trasímaco — És um difamador, Sócrates, quando discutes. Por acaso consideras médico aquele que se engana em relação aos doentes, no mesmo instante e enquanto se engana? Ou calculador aquele que comete um erro de cálculo, no preciso momento em que comete o erro? Não. E um modo de falar, acredito, quando dizemos: o médico se enganou, o calculador e o escriba se enganaram. Mas julgo que nenhum deles, na medida em que é o que o denominamos, jamais se engana; de modo que, para falar com precisão, visto que queres ser preciso, nenhum artesão se engana. Aquele que se engana o faz quando a ciência o abandona, no instante em que não é mais artesão; assim, artesão, sábio ou governante, ninguém se engana no exercido das suas funções, apesar de todos dizerem que o médico se enganou, que o governante se enganou. Portanto, admito que te tenha respondido há pouco neste sentido; mas, para me expressar de forma mais exata, o governante, enquanto governante, não se engana, não comete um erro ao fazer passar por lei o seu maior interesse, que deve ser realizado pelo governado. Deste modo, como no mído, afirmo que a justiça consiste em fazer o que é vantajoso para o mais forte.
Sócrates — Que seja, Trasímaco. Pareço-te um difamador?
Trasímaco — Exatamente.
Sócrates — Achas que te inquiri como fiz, com premeditação, para te prejudicar na discussão?
Trasímaco — Com toda a certeza. Mas não terás êxito, porque não poderás esconder-se para me prejudicar, nem me dominares pela violência na disputa.
Sócrates — Eu nem sequer o tentarei, homem bem-aventurado! Porém, para que isso não aconteça, define claramente se entendes no sentido vulgar ou no sentido exato, de que acabas de falar, os termos governante, mais forte, para vantagem de quem será justo que o mais fraco trabalhe.
Trasímaco — Entendo o governante no sentido exato da palavra. Para isso, tenta prejudicar-me ou caluniar-me, se puderes. Mas não és capaz!
Sócrates — Crês que sou louco a ponto de tentar tosquiar um leão ou caluniar Trasímaco?
Trasímaco — A verdade é que tentaste, embora inutilmente!
Sócrates — Chega com este palavreado! Mas diz-me: o médico, no sentido exato do termo, de que falavas ainda há pouco, tem por objetivo ganhar dinheiro ou tratar os doentes? Mas fala-me do verdadeiro médico.
Trasímaco — Tem por objetivo tratar os doentes.
Sâcrates — E o piloto? O verdadeiro piloto é chefe dos marinheiros ou marinheiro?
Trasímaco — Chefe dos marinheiros.
Sócrates — Não penso que se deva ter em conta o fato de navegar para que o denominemos marinheiro; de fato, não é por navegar que o denominamos piloto, mas devido à sua arte e ao comando que exerce sobre os marinheiros.
Trasímaco — Concordo.
Sócrates — Portanto, para o doente e o marinheiro, existe alguma vantagem?
Trasímaco — Sem dúvida.
Sócrates — E a arte não objetiva procurar e proporcionar a cada um o que é vantajoso para ele?
Trasímaco — Sim.
Sócrates — Mas, para cada arte, existe outra vantagem além de ser tão perfeita quanto possível?
Trasímaco — Qual é o sentido da tua pergunta?
Sócrates — Este. Se me perguntasses se é suficiente ao corpo ser corpo ou se tem necessidade de outra coisa, responder-te-ia: Certamente que tem necessidade de outra coisa. Para isso é que a arte médica foi inventada: porque o corpo é defeituoso e não lhe é suficiente ser o que é. Por isso, para lhe proporcionar vantagens, a arte organizou-se’. Parece-te que tenho ou não razão?
Trasímaco — Tens razão.
Sócrates — Mas então a medicina é defeituosa? Geralmente, uma arte exige certa virtude — como os olhos a visão ou as orelhas a audição, pelo fato de que estes órgãos necessitam de uma arte que examine e lhes proporcione a vantagem de ver e ouvir? E nessa mesma arte existe algum defeito? Cada arte exige outra arte que examine o que lhe é vantajoso, e esta, por sua vez, outra semelhante, e assim até ao infinito? Ou examina ela própria o que lhe é vantajoso? Ou não precisa nem dela própria nem de outra para remediar a sua imperfeição? Pois nenhuma arte apresenta defeito ou imperfeição e não deve procurar outra vantagem exceto a do indivíduo a que se aplica: ela própria, quando verdadeira, está isenta de mal e é pura enquanto se mantiver rigorosa e totalmente de acordo com a sua natureza. Analisa, tomando as palavras no sentido exato de que falavas. É assim ou não?
Trasímaco — Parece-me que sim.
Sócrates — Portanto, a medicina não objetiva a sua própria vantagem, mas a do corpo.
Trasímaco — Certamente.
Sócrates — Nem a arte equestre a sua própria vantagem, mas a dos cavalos; nem, em geral, qualquer arte tem por objeto a sua própria vantagem — pois não necessita de nada —, mas a do indivíduo a que se aplica.
Trasímaco — E assim que me parece.
Sócrates — Mas, Trasímaco, as artes governam e dominam o objeto sobre o qual se exercem.
Ele concordou comigo neste ponto, embora a muito custo.
Sócrates — Portanto, nenhuma ciência procura nem prescreve a vantagem do mais forte, mas a do mais fraco, que lhe é sujeito. Também concordou comigo neste ponto, mas só depois de ter procurado uma contestação; quando cedeu, eu lhe disse:
Sócrates — Portanto, o médico, na medida em que é médico, não objetiva nem prescreve a sua própria vantagem, mas a do doente? Com efeito, reconhecemos que o médico, no sentido exato da palavra, governa o corpo e não é homem de negócios. Não reconhecemos?
Ele concordou.
Sócrates — E que o piloto, no sentido exato da palavra, lidera os marinheiros, mas não é marinheiro?
Trasímaco — Foi assim que o reconhecemos.
Sócrates — Consequentemente, um tal piloto, um tal governante, não objetivará e não prescreverá a sua própria vantagem, mas sim a do marinheiro, do indivíduo que ele governa.
Ele concordou com grande dificuldade.
Sócrates — Sendo assim, Trasímaco, nenhum governante, seja qual for a natureza da sua autoridade, na medida em que é governante, não objetiva e não ordena a sua própria vantagem, mas a do indivíduo que governa e para quem exerce a sua arte; é com vista ao que é vantajoso e conveniente para esse indivíduo que diz tudo o que diz e faz tudo o que faz.
Estávamos neste ponto da discussão e era claro para todos que a definição da justiça tinha sido virada do avesso, quando Trasímaco, em lugar de responder, gritou:
— Tu tens ama, Sócrates?
Sócrates — O quê? Não seria mais apropriado responderes do que me fazeres tal pergunta?
Trasímaco — E que ela não te deixa babar e não te assoa o nariz quando necessário, visto que não aprendeste a diferenciar os carneiros do pastor.
Sócrates — Por que dizes isso?
Trasímaco — Porque crês que os pastores e os vaqueiros objetivam o bem dos seus carneiros e dos seus bois e os engordam e tratam tendo em vista outra coisa para além do bem dos seus patrões e deles mesmos. E, da mesma maneira, acreditas que os governantes das cidades, os que são realmente governantes, olham para os seus súditos como se olha para carneiros e que objetivam, dia e noite, tirar deles um lucro pessoal. Foste tão longe no conhecimento do justo e da justiça, do injusto e da injustiça, que ignoras que a justiça é, na realidade, um bem alheio, o interesse do mais forte e daquele que governa e a desvantagem daquele que obedece e serve; que a injustiça é o oposto e comanda os simples de espírito e os justos; que os indivíduos trabalham para o interesse do mais forte e fazem a sua felicidade servindo-o, mas de nenhuma maneira a deles mesmos. Aqui tens, ó muito simples Sócrates, como é necessário encarar o caso: o homem justo é em todos os lugares inferior ao injusto. Em primeiro lugar, no comércio, quando se associam um ao outro, nunca descobrirás, ao dissolver-se a sociedade, que o justo ganhou, mas que perdeu; em seguida, nos negócios públicos, quando é preciso pagar contribuições, o justo paga mais do que os seus iguais, o injusto menos; quando, ao contrário, trata-se de receber, um não recebe nada, o outro muito. E, quando um e outro ocupam algum cargo, acontece que o justo, mesmo que não haja outro prejuízo, deixa, por negligência, que os seus negócios domésticos periclitem e não tira da função pública nenhum proveito, por causa da sua justiça. Além disso, incorre no ódio dos parentes e conhecidos, ao recusar servi-los em detrimento da justiça; quanto ao injusto, é exatamente o contrário. Pois entendo como tal aquele de quem falava há pouco, o que é capaz de se sobrepor aos outros; examina-o bem, se quiseres saber até que ponto, no particular, a injustiça é mais vantajosa do que a justiça. Mas irás compreendê-lo mais facilmente se fores até a injustiça mais perfeita, a que leva ao ápice da felicidade o homem que a comete e ao ápice da infelicidade os que a sofrem e não querem cometê-la. Esta injustiça é a tirania que, por fraude ou violência, se apodera do bem alheio: sagrado, profano, particular, público, e não por partes, mas na totalidade. Para cada um destes delitos, o homem que se deixa apanhar é punido e coberto das piores ignomínias — com efeito, essas pessoas que agem por partes são consideradas sacrílegas, traficantes de escravos, arrombadores de moradias, espoliadores, ladrões, conforme a injustiça cometida. Mas quando um homem, além da fortuna dos cidadãos, se apodera das suas pessoas e os escraviza, em vez de receber esses nomes ignominiosos, e considerado feliz e afortunado, não apenas pelos cidadãos, mas também por todos aqueles que sabem que ele cometeu a injustiça em toda a sua extensão; com efeito, não receiam cometer a injustiça os que a reprovai»: receiam ser vítimas dela. Por isso, Sócrates, a injustiça levada a um alto grau é mais forte, mais livre, mais digna de um senhor do que a justiça e, como eu dizia a princípio, a justiça significa o interesse do mais forte e a injustiça é em si mesma vantagem e lucro.

Depois de falar dessa maneira, Trasímaco pretendia retirar-se, após ter, como um banhista, inundado os nossos ouvidos com o seu impetuoso e abundante discurso. Mas os assistentes não o deixaram partir e forçaram-no a permanecer para justificar as suas palavras. Eu próprio insisti com ele, dizendo-lhe:
— Ó divino Trasímaco, depois de nos teres feito um tal discurso, pensas em ir embora, antes de demonstrares suficientemente ou ensinares se isso é assim ou diferente? Crês que é tarefa fácil definir a regra de vida que cada um de nós deve seguir para viver da maneira mais proveitosa?
Trasímaco — Por acaso eu penso que é de outra maneira?
Sócrates — E o que parece. Ou então não te preocupas conosco e não te importa que levemos uma vida pior ou melhor, na ignorância do que tu pretendes saber. Mas, meu caro, dá-te ao incômodo de nos instruir também: não farás um mau investimento se nos fizeres teus devedores, numerosos como somos. Com efeito, se queres saber o que penso, não estou convencido e não creio que a injustiça seja mais vantajosa do que a justiça, mesmo quando há a liberdade de praticá-la e não se é impedido de fazer o que se quer. Mesmo que um homem, meu caro, seja injusto e tenha o poder de praticar a injustiça por fraude ou à força: nem por isso estou convencido de que tire daí mais proveito que da justiça. Talvez este seja também o sentimento de outros entre nós, e não somente o meu; convence-nos, portanto, homem divino, de maneira satisfatória, de que fazemos mal em preferir a justiça à injustiça. (Todo esse discurso de Trasíxnaco é uma paródia da linguagem dos solistas.)
Trasímaco — E como eu haveria de te convencer, se não o consegui com o que já disse? Que mais posso fazer? Será necessário que enfie os meus argumentos na tua cabeça?
Sócrates — Por Zeus, basta! Em primeiro lugar, mantém-te nas posições assumidas, ou, se as mudares, terás de fazê-lo com clareza e não nos enganes. Vês agora, Trasímaco — para voltar ao que dissemos —, que, depois de teres apresentado a definição do verdadeiro médico, não achaste que devias revelar rigorosamente a do verdadeiro pastor. Pensas que, como pastor, ele engorda os seus carneiros não objetivando seu maior bem, mas, como um glutão que pretende dar um festim, objetivando a boa carne ou, como um comerciante, objetivando a venda, e não como um pastor. Mas a arte do pastor objetiva unicamente o maior bem do indivíduo a que se aplica — já que ele próprio está suficientemente provido das qualidades que asseguram a sua excelência, enquanto se mantém de acordo com a sua natureza de arte pastoril. Pelo mesmo motivo, eu supunha há pouco que éramos obrigados a reconhecer que todo governo, enquanto governo, objetiva unicamente o maior bem dos indivíduos que governa e dos quais é responsável, quer se trate da população de uma cidade, quer de um particular. Mas tu crês que os governantes das cidades, os que governam realmente, o fazem com prazer?
Trasímaco — Se creio? Por Zeus, tenho certeza!
Sócrates — Mas como, Trasímaco?! Não notaste que ninguém concorda em exercer os outros cargos por eles mesmos, que, ao contrário, se exige uma retribuição, porque não é ao próprio que o seu exercício aproveita, mas aos governados? E responde a isto: não se diz sempre que uma arte se diferencia de outra por ter um poder diferente? E, homem bem aventurado, não responde contra a tua opinião, para que possamos avançar!
Trasímaco — Mas é nisso que ela se diferencia.
Sócrates — E cada um de nós não procura conseguir um certo benefício particular e não comum a todos, como a medicina a saúde, a pilotagem a segurança na navegação e assim por diante?
Trasímaco — Sem dúvida.
Sócrates — E a arte do mercenário, o salário, dado que reside aí o seu próprio poder? Confundes a medicina com a pilotagem? Ou, para definir as palavras com rigor, como propuseste, se alguém recupera a saúde governando um navio, porque é vantajoso para ele navegar, denominarás por isso medicina a sua arte?
Trasímaco — Claro que não.
Sócrates — Mas como! Denominarás medicina a arte do mercenário porque o médico, ao curar, ganha salário?
Trasímaco — Não.
Sócrates — Não afirmamos que cada arte objetiva um beneficio particular?
Trasímaco — Afirmamos.
Sócrates — Portanto, se todos os artesãos se beneficiam em comum de um certo lucro, é evidente que acrescentam à sua arte um elemento comum de que auferem lucro?
Trasímaco — E o que parece.
Sócrates — E nós declaramos que os artesãos ganham salário porque adicionam à sua arte a do mercenário.
Reconheceu-o a custo.
Sócrates — Portanto, não é da arte que exerce que cada um retira esse proveito que consiste em receber um salário; mas, examinando com rigor, a medicina cria a saúde e a arte do mercenário proporciona o salário, a arquitetura edifica a moradia e a arte do mercenário, que a acompanha, proporciona o salário, e assim todas as outras artes: cada um trabalha na obra que lhe é própria e aproveita ao indivíduo a que se aplica. Porém, se não recebesse salário, tiraria o artesão proveito da sua arte?
Trasímaco — Acredito que não.
Sócrates — E sua arte deixa de ser útil quando ele trabalha gratuitamente?
Trasímaco — A meu ver, não.
Sócrates — Então, Trasímaco, é evidente que nenhuma arte e nenhum comando provê ao seu próprio benefício, mas, como dizíamos há instantes, assegura e objetiva o do governado, objetivando o interesse do mais fraco, e não o do mais forte. Eis por que, meu caro Trasímaco, que eu dizia há pouco que ninguém concorda de bom grado em governar e curar os males dos outros, mas exige salário, porque aquele que quer exercer convenientemente a sua arte não faz e não objetiva, na medida em que objetiva segundo essa arte, senão o bem do governado; por estas razões, é necessário pagar um salário aos que concordam em governar, seja em dinheiro, honra ou castigo, se porventura se recusarem.
Glauco — Que queres dizer com isso, Sócrates? Eu conheço os dois outros tipos de salários, mas ignoro o que entendes por castigo dado na forma de salário.
Sócrates — Então não conheces o salário dos melhores, aquilo pelo qual os mais virtuosos governam, quando se resignam a fazê-lo. Não sabes que o amor à honra e ao dinheiro é considerado coisa vergonhosa e, efetivamente, o é?
Glauco — Sei.
Sócrates — Devido a isso, os homens de bem não querem governar nem pelas riquezas nem pela honra; porque não querem ser considerados mercenários, exigindo abertamente o salário correspondente à sua função, nem ladrões, tirando dessa função lucros secretos; também não trabalham pela honra, porque não são ambiciosos. Portanto, é preciso que haja obrigação e castigo para que aceitem governar — é por isso que tomar o poder de livre vontade, sem que a necessidade a isso obrigue, pode ser considerado vergonha — e o maior castigo consiste em ser governado por alguém ainda pior do que nós, quando não queremos ser nós a governar; é com este receio que me parecem agir, quando governam, as pessoas honradas, e então assumem o poder não como um bem a ser usufruído, mas como uma tarefa necessária, que não podem confiar a outras melhores que elas nem a iguais. Se surgisse uma cidade de homens bons, é provável que nela se lutasse para fugir do poder, como agora se luta para obtê-lo, e tornar-se-ia evidente que, na verdade, o governante autêntico não deve visar ao seu próprio interesse, mas ao do governado; de modo que todo homem sensato preferiria ser obrigado por outro do que preocupar-se em obrigar outros. Portanto, de forma alguma concordo com Trasímaco, quando afirma que a justiça Significa o interesse do mais forte. Mas voltaremos a este ponto mais tarde; dou uma importância muito maior ao que diz agora Trasímaco: que a vida do homem injusto é superior à do justo. Que partido tomas, Glauco? Qual destas asserções te parece mais verdadeira?
Glauco — A vida do homem justo parece-me mais proveitosa.
Sócrates — Ouviste a relação que Trasímaco fez dos bens ligados à vida do injusto?
Glauco — Ouvi, mas não me convenci.
Sócrates — Queres então que o convençamos, se conseguirmos encontrar o meio, de que ele não está na verdade?
Glauco — Como não haveria de querer?
Sócrates — Se, juntando as nossas forças contra ele e opondo argumento a argumento, relacionarmos os bens que a justiça proporciona, se, por seu turno, ele replicar, e nós também, será preciso contar e avaliar as vantagens citadas por uma e outra parte em cada argumento e iremos precisar de juizes para decidir; se, ao contrário, como há pouco, debatermos a questão até conseguirmos um mútuo acordo, nós seremos conjuntamente juizes e advogados.
Glauco — É verdade.
Sócrates — Qual destes dois métodos preferes?
Glauco — O segundo.
Sócrates — Então, Trasímaco, voltemos ao começo e responde-me. Acreditas que a injustiça total é mais proveitosa do que a justiça total?
Trasímaco — Com certeza, e já expliquei por que razões.
Sócrates — Muito bem, mas da maneira que entendes essas duas coisas, denominas uma virtude e a outra, vício?
Trasímaco — Sem dúvida.
Sócrates — E é a justiça que denominas virtude e a injustiça, vício?
Trasímaco — E o que dou a entender, encantadora criatura, quando digo que a injustiça é proveitosa e a justiça não o é?
Sócrates — Como é, então?
Trasímaco — O contrário.
Sócrates — A justiça é um vício?
Trasímaco — Não, mas uma nobre simplicidade de caráter.
Sócrates — Então a injustiça é perversidade de caráter?
Trasímaco — Não, é prudência.
Sócrates — Será, Trasímaco, que os injustos te parecem sábios e bons?
Trasímaco — Sim, aqueles que são capazes de cometer a injustiça com perfeição e de submeter cidades e povos. Pensas, talvez, que me refiro aos gatunos? Sem dúvida, tais práticas são rendosas, enquanto não são descobertas; mas não merecem menção ao lado das que acabo de indicar.
Sócrates — Percebo perfeitamente o teu raciocínio, mas o que me surpreende é que classifiques a injustiça com a virtude e a sabedoria, e a justiça com os seus opostos.
Trasímaco — Mas é exatamente assim que as classifico.
Sócrates — Isto é grave, camarada, e não é fácil saber o que se pode dizer. Se, com efeito, admitisses que a injustiça é proveitosa, admitindo ao mesmo tempo, como alguns outros, que é vício e coisa vergonhosa, poderíamos responder-te invocando as noções correntes sobre o assunto; mas, evidentemente, tu dirias que ela é bela e forte e conceder-lhe-ias todos os atributos que nós concedemos à justiça, visto que ousaste compará-la com a virtude e a sabedoria.
Trasímaco — Adivinhas muito bem.
Sócrates — Contudo, não devo recusar-me a continuar com este exame enquanto puder acreditar que falas seriamente. E que me parece, realmente, Trasímaco, que não é caçoada da tua parte e que estás exprimindo a tua verdadeira opinião.
Trasímaco — Que importância tem que seja ou não a minha opinião? Limita-te a refutar-me.
Sócrates — De fato, não tem importância. Mas responde a mais isto: parece-te que homem justo procura prevalecer de algum modo sobre outro o homem justo?
Trasímaco — Jamais, pois não seria educado e simples como é.
Sócrates — Nem mesmo numa ação justa?
Trasímaco — Nem assim.
Sócrates — Mas ele pretenderia prevalecer sobre o homem injusto e pensaria ou não fazê-lo justamente?
Trasímaco — Pensaria e o pretenderia, mas não poderia.
Sócrates — Não foi isso que perguntei: quero saber se o justo não teria nem a pretensão nem o desejo de prevalecer sobre o justo, mas apenas sobre o injusto.
Trasímaco — Assim é.
Sócrates — E o injusto pretenderia prevalecer sobre o justo e sobre a ação justa?
Trasímaco — Como não, se ele pretende prevalecer sobre todos?
Sócrates — Então, prevalecerá sobre o homem injusto e sobre a ação injusta e se empenhará em prevalecer sobre todos?
Trasímaco — Isso mesmo.
Sócrates — Resumindo: o justo não prevalece sobre o seu semelhante, mas sobre o seu contrário; o injusto prevalece sobre o seu semelhante e o seu contrário.
Trasímaco — Excelentemente expresso.
Sócrates — Porém, o injusto é sábio e bom, ao passo que o justo não é nem uma coisa nem outra?
Trasímaco — Excelente, também.
Sócrates — Como conseqüência, o injusto assemelha-se ao sábio e ao bom, e o justo não se lhes assemelha?
Trasímaco — Como poderia ser diferente? Sendo o que é, ele se assemelha aos seus semelhantes e o outro não se lhes assemelha.
Sócrates — Muito bem. Portanto, cada um é tal como aqueles a que se assemelha?
Trasímaco — Quem pode duvidar?
Sócrates — Que seja, Trasímaco. Agora, não afirmas que um homem é músico e que outro não o é?
Trasímaco — Afirmo.
Sócrates — Qual dos dois é conhecedor e qual não é?
Trasímaco — Certamente, o músico é conhecedor e o outro não é.
Sócrates — E um não é bom nas coisas de que é conhecedor e o outro não o é?
Trasímaco — Certamente.
Sócrates — Mas a respeito da medicina não é assim?
Trasímaco — E assim.
Sócrates — Agora, crês, excelente homem, que um músico que afim a sua lira, esticando ou soltando as cordas, pretende prevalecer sobre um músico ou ter vantagem sobre ele?
Trasímaco — Não, não creio.
Sócrates — Mas quererá prevalecer sobre um homem ignorante em música?
Trasímaco — Sim, com certeza.
Sócrates — E o médico? Ao prescrever alimento e bebida, quererá prevalecer sobre um médico ou sobre a prática médica?
Trasímaco — Certamente que não.
Sócrates — E sobre um homem que ignora a medicina?
Trasímaco — Sim.
Sócrates — Mas percebes, a respeito da ciência e da ignorância em geral, se um conhecedor qualquer parece querer prevalecer, com atos ou com palavras, sobre outro conhecedor e não agir como o seu semelhante no mesmo caso.
Trasímaco — Talvez seja necessário que seja assim.
Sócrates — Mas, da mesma forma, não quererá o ignorante prevalecer sobre o conhecedor e o ignorante?
Trasímaco — Talvez.
Sócrates — Ora, o conhecedor é sábio?
Trasímaco — E.
Sócrates — E o sábio é bom?
Trasímaco — E.
Sócrates — Portanto, o homem sábio e bom não quererá prevalecer sobre o seu semelhante, mas sobre aquele que não se assemelha a ele, sobre o seu oposto.
Trasímaco — Aparentemente.
Sócrates — Ao passo que o homem mau e ignorante quererá prevalecer sobre o seu semelhante e o seu oposto.
Trasímaco — Pode ser.
Sócrates — Mas, Trasímaco, o nosso homem injusto não prevalece sobre o seu oposto e o seu semelhante? Não o disseste?
Trasímaco — Disse.
Sócrates — E não é verdade que o justo não prevalecerá sobre o seu semelhante, mas sim sobre o seu oposto?
Trasímaco — É verdade.
Sócrates — Então, o justo assemelha-se ao homem sábio e bom e o injusto, ao homem mau e ignorante.
Trasímaco — Pode ser.
Sócrates — Mas nós havíamos afirmado que cada um deles é igual àquele a que se assemelha.
Trasímaco — De fato, afirmamos.
Sócrates — Logo, o justo é bom e sábio e o injusto, ignorante e mau.
Trasímaco concordou com tudo isto, não tão facilmente como o meu relato, mas contra sua vontade e a muito custo. Suava abundantemente, tanto mais que fazia muito calor — e foi então que, pela primeira vez, vi Trasímaco enrubescer! E quando concordamos que a justiça é virtude e sabedoria e a injustiça vício e ignorância, prossegui:
Sócrates — Consideremos isto definido. Mas afirmamos que a injustiça tem também a força. Não te lembras, Trasímaco?
Trasímaco — Lembro-me, mas não me agrada o que acabas de afirmar e sei como refutar. Contudo, se eu usar da palavra, com certeza dirás que estou fazendo um discurso. Por isso, deixa-me falar à vontade ou, se queres interrogar-me, interroga-me; e eu, como se faz com as velhas que contam histórias, dir-te-ei “seja!’ e te aprovarei ou desaprovarei com a cabeça.
Sócrates — Mas, pelo menos, nao respondas contra a tua opinião.
Trasímaco — Farei como quiseres, já que não me deixas falar. Que mais queres?
Sócrates — Nada, por Zeus! Faz como preferires; vou interrogar-te.
Trasímaco — Interroga.
Sócrates — Far-te-ei a mesma pergunta que há pouco, para podermos continuar a discussão: o que é a justiça em comparação com a injustiça? Com efeito, foi dito que a injustiça é mais poderosa do que a justiça; mas agora, se a justiça é sabedoria e virtude, conclui-se facilmente, penso eu, que ela é mais poderosa do que a injustiça, visto que a injustiça é ignorância. Já ninguém pode ignorá-lo. No entanto, não é de uma maneira tão simples, Trasímaco, que pretendo abordar o assunto, mas do ponto de vista seguinte: existe cidade injusta que tente sujeitar ou tenha sujeitado outras cidades, mantendo um grande número delas em escravidão?
Trasímaco — Com certeza. E é assim que procederá a melhor cidade, a mais perfeitamente injusta.
Sócrates — Eu sei que era esta a tua tese. Mas a tal propósito considero o seguinte ponto: uma cidade que se torna senhora de outra cidade poderá fazê-lo sem intermédio da justiça ou será obrigada a recorrer a ela?
Trasímaco — Se, como dizias há pouco, a justiça for sabedoria, recorrerá a ela; mas, se for como eu dizia, utilizará a injustiça.
Sócrates — Estou feliz, Trasímaco, por não aprovares ou desaprovares com um gesto de cabeça e responderes tão bem.
Trasímaco — Faço-o para te agradar.
Sócrates — Muito amável da tua parte. Mas, por favor, responde ainda a isto: achas que uma cidade, um exército, um bando de salteadores ou de ladrões, ou qualquer outra associação que persegue em comum um objetivo injusto, poderia levar a cabo qualquer empresa se os seus membros violassem entre si as normas da justiça?
Traslmaco — Certamente que não.
Sócrates — E se observassem as normas? Não seria melhor?
Trasfmaco — Com certeza.
Sócrates — Portanto, Trasímaco, a injustiça faz nascer entre os homens dissensões, ódios e brigas, enquanto a justiça alimenta a concórdia e a amizade. Concordas?
Trasímaco — Assim seja! Não quero entrar em discussão contigo.
Sócrates — Estás se portando muito bem, excelente homem. Mas responde a esta pergunta: se é próprio da injustiça provocar o ódio em todo lugar onde acontece, aparecendo em homens livres ou escravos, não fará que eles se odeiem, briguem entre si e sejam impotentes para empreender seja o que for em comum?
Trasfmaco — Sem dúvida.
Sócrates — E se a injustiça surgir em dois homens? Não ficarão divididos, cheios de rancor, inimigos um do outro e dos justos?
Trasímaco — Ficarão.
Sócrates — E se, maravilhoso amigo, a injustiça surgir em um único homem, ela perderá o seu poder ou o manterá intato?
Trasímaco — Penso que o manterá intato!
Sócrates — Portanto, não parece possuir o poder, seja qual for o lugar em que ela surja, cidade, tribo, exército ou sociedade, de tornar primeiramente cada um deles incapaz de agir de acordo consigo próprio, devido às dissensões e contendas que causa, e, em seguida, de torná-lo inimigo de si mesmo, do seu oposto e do justo?
Trasímaco — Sem dúvida.
Sócrates — E creio que, num único homem, a injustiça produzirá os mesmos efeitos que está na sua natureza produzir; em primeiro lugar, tomará esse homem incapaz de agir, provocando nele a rebeldia e a discórdia; em seguida, irá transformá-lo em inimigo de si mesmo e dos justos. Não é?
Trasímaco — E.
Sócrates — Mas, meu amigo, os deuses não são justos?
Trasímaco — Que seja!
Sócrates — Portanto, também entre os deuses, o injusto será inimigo, e o justo amigo.
Trasímaco — Regozija-te sem receio com os teus argumento: não te contradirei, para não provocar o ressentimento da assembleia.
Sócrates — Então, continuemos! Alimenta-me com o resto do festim, continuando a responder. Acabamos de concluir que os homens justos são mais sábios, melhores e mais poderosos do que os homens injustos, e que estes são incapazes de agir harmonicamente — e, quando dizemos que às vezes levaram a bom termo um assunto em comum, não é, de maneira nenhuma, a verdade, porque uns e outros não seriam poupados se tivessem sido totalmente injustos; por isso, é evidente que existia neles uma certa justiça que os impediu de se prejudicarem mutuamente, na época em que causavam dano às suas vítimas, e que lhes permitiu realizar o que realizaram; lançando-se em seus injustos empreendimentos, só em parte estavam pervertidos pela injustiça, visto que os inteiramente maus e os totalmente injustos são também inteiramente incapazes de fazer seja o que for. Eis como eu o compreendo, e não como tu supunhas no início. Agora, precisamos analisar se a vida do justo é melhor e mais feliz do que a do injusto: questão que tínhamos adiado para análise posterior. Ora, parece-me que isso é evidente, conforme aquilo que dissemos. No entanto, devemos analisar melhor o problema, pois não se trata de uma discussão a respeito de uma fflvialidade, mas sobre o modo como temos de regular a nossa vida.
Trasímaco — Então, analisa.
Sócrates — Assim farei. Diz-me: parece-te que o cavalo tem uma função?
Trasímaco — Sim, me parece.
Sócrates — Dirias, então, que é função do cavalo, ou de qualquer outra criatura, apenas o que pode ser feito por ele ou o que se faz melhor com ele?
Trasímaco — Não compreendo.
Sócrates — Explico-me melhor: tu podes enxergar sem ser com os olhos?
Trasímaco — Certamente que não.
Sócrates — E podes ouvir sem ser com os ouvidos?
Trasímaco — De forma alguma.
Sócrates — Portanto, podemos afirmar que são essas as funções desses órgãos.
Trasímaco — Sem dúvida.
Sócrates — Mas não podes podar uma videira com uma faca, um trinchete e muitos outros instrumentos?
Trasímaco — E por que não?
Sócrates — Mas com nenhum outro, creio eu, tão bem quanto com um podão, que existe para isso.
Trasímaco — Concordo.
Sócrates — Portanto, não afirmaremos que é essa a sua função?
Trasímaco — Por certo que afirmaremos.
Sócrates — Julgo que agora compreendes melhor o que eu dizia há pouco, quando te perguntava se a função de uma coisa não é o que ela pode fazer ou o que ela faz melhor do que as outras.
Trasímaco — Compreendo e creio que é realmente essa a função de cada coisa.
Sócrates — Ótimo. Mas bâo existe também uma virtude em cada coisa a que é atribuida uma função? Voltemos aos exemplos anteriores: os olhos possuem uma função?
Trasímaco — Possuem.
Sócrates — Então, possuem também uma virtude?
Trasímaco — Sim, possuem uma virtude.
Sócrates — Muito bem! As orelhas, dissemos nós, possuem uma função?
Trasímaco — Sim.
Sócrates — E, por conseguinte, também uma virtude?
Trasimaco — Também uma virtude.
Sócrates — Mas não acontece o mesmo com todas as coisas?
Trasímaco — Acontece.
Sócrates — Pois bem! Poderiam os olhos desempenhar bem a sua função se não possuíssem a virtude que lhes é própria ou se, em lugar dessa virtude, possuissem o vício contrário?
Trasímaco — Como poderiam? Queres, por acaso, dizer a cegueira, em vez da vista?
Sócrates — Qual é a sua virtude, pouco importa; ainda não to perguntei, mas apenas se cada coisa desempenha bem a sua função por virtude própria e mal pelo vício contrário.
Trasímaco — É como dizes.
Sócrates — Posto isto, os ouvidos, sendo privados da sua virtude própria, desempenharão mal a sua função?
Trasímaco — Sem dúvida.
Sócrates — Este princípio pode ser aplicado a todas as outras coisas?
Trasímaco — Julgo que sim.
Sócrates — Então, analisa agora isto: a alma não possui uma função que nada, a não ser ela, poderia desempenhar, como vigiar, comandar, deliberar e o resto? Podemos atribuir estas funções a outra coisa que não à alma e não temos o direito de dizer que elas lhe são peculiares?
Trasímaco — Não podemos atribuí-las a nenhuma outra coisa.
Sócrates — E a vida? Não afirmaremos que é uma função da alma?
Trasímaco — Com certeza.
Sócrates — Portanto, afirmaremos que a alma também possui a sua virtude própria?
Trasímaco — Afirmaremos.
Sócrates — Então, Trasímaco, a alma executará bem essas funções se for privada da sua virtude própria? Ou será impossível?
Trasímaco — Será impossível.
Sócrates — Em decorrência disso, é obrigatório que uma alma má comande e vigie mal e que uma alma boa faça bem tudo isso.
Trasímaco — É obrigatório.
Sócrates — Ora, não concluímos que a justiça é uma virtude e a injustiça, um vício da alma?
Trasimaco — Concluímos.
Sócrates — Por consegumte, a alma justa e o homem justo viverão bem e o injusto, mal?
Trasímaco — Assim parece, de acordo com o teu raciocínio.
Sócrates — Então, aquele que vive bem é feliz e afortunado e o que vive mal, o contrário.
Trasímaco — Não há dúvida.
Sócrates — Portanto, o justo é feliz e o injusto, infeliz.
Trasímaco — Que seja!
Sócrates — E não é vantajoso ser infeliz, mas ser feliz.
Trasímaco — Sem dúvida.
Sócrates — Por conseguinte, divino Trasímaco, jamais a injustiça é mais vantajosa do que a justiça.
Trasímaco — Que seja esse, Sócrates, o teu festim das festas de Béndis!
Sócrates — Tive-o graças a ti, Traslmaco, visto que recuperaste a calma e deixaste de ser rude comigo. No entanto, não me regalei o suficiente: por culpa minha, e não tua. Parece-me que fiz como os glutões, que se lançam avidamente sobre o prato que lhes entregam, antes de terem apreciado suficientemente o anterior; da mesma forma, antes de termos encontrado o que procurávamos inicialmente, a natureza da justiça, lancei-me numa discussão para analisar se ela é vício e ignorância ou sabedoria e virtude; tendo surgido em seguida outra hipótese, a de saber que a mjustiça é mais vantajosa do que a justiça, não pude evitar de ir de uma para outra, de modo que o resultado da nossa conversa é que não sei nada; porquanto, não sabendo o que é a justiça, ainda menos saberei se é virtude ou não e se aquele que a possui é feliz ou infeliz.

Os números de 2015

A equipe de estatísticas do WordPress.com prepararam um relatório para o ano de 2015 deste blog.

Aqui está um resumo:

O Museu do Louvre, em Paris, é visitado todos os anos por 8.5 milhões de pessoas. Este blog foi visitado cerca de 360.000 vezes em 2015. Se fosse o Louvre, eram precisos 15 dias para todas essas pessoas o visitarem.

Clique aqui para ver o relatório completo

Sócrates pergunta a Céfalo qual o maior proveito de sua fortuna

Sócrates — Diz-me, Céfalo, tu obtiveste por herança teus bens ou os conquistaste?
Céfalo — Quanto é que conquistei, Sócrates? Como comerciante, fiquei entre meu avô e meu pai. Meu avô, de quem possuo o mesmo nome, recebeu por herança uma fortuna quase igual à que tenho agora, e a aumentou. Enquanto meu pai, Lisânias, tomou-a menor do que é hoje. Eu ficarei satisfeito se não a deixar diminuída a estes jovens, e sim um pouco superior.
Sócrates — Perguntei-te isto porque pareceu-me que não estimas a riqueza em excesso, ao contrário daqueles que a adquirem com o próprio trabalho, os quais a prezam muito mais. Da mesma maneira que os poetas adoram seus versos, e os pais aos filhos, um comerciante preza sua riqueza por ser obra sua, e também por causa de sua utilidade, igualmente a todos os outros homens. Este é o motivo por que é difícil a convivência com eles, pois se interessam apenas pelo dinheiro.
Céfalo — Tens razão.
Sócrates — Diz-me mais uma coisa: qual foi o maior proveito que recebeste pelo fato de possuíres tão grande fortuna?
Céfalo — Se eu o dissesse, não conseguiria convencer muitas pessoas. Como tu sabes, Sócrates, quando alguém chega à idade em que toma consciência de que logo morrerá, surgem-lhe o temor e a preocupação a respeito de assuntos nos quais antes não pensava. Efetivamente, tudo o que se conta a respeito do Hades, onde serão expiados os atos maus praticados em vida, todas essas fábulas das quais até então ele fazia troça, agora aterrorizam sua alma, por temer que correspondam à verdade. E esse alguém — devido à debilidade da velhice, ou porque divisa agora com maior clareza as coisas do além — toma-se repleto de desconfianças e receios, inicia a fazer cálculos e a analisar se cometeu alguma injustiça com alguma pessoa. E aquele que encontrar em sua vida pregressa muitas maldades intimida-se, seja acordando numerosas vezes durante a noite, da mesma forma que as crianças, seja esperando alguma desgraça. Ao contrário, aquele que sabe não haver cometido injustiças sempre alimenta uma doce esperança, benévola ama da velhice, como declara Píndaro. São encantadoras as palavras deste poeta, ó Sócrates, a respeito de quem tiver levado uma existência justa e pura: a doce esperança que lhe acalenta o coração acompanha-o, qual amada velhice, a esperança que governa, mais que tudo, os espíritos vacilantes dos mortais.
Palavras maravilhosas. Devido a isto, tenho as riquezas em grande apreço, não para todos, mas somente para aqueles homens moderados e cautelosos. Jamais enganar alguém ou mentir, ainda que inadvertidamente, nem ser devedor, quer de
sacrifícios aos deuses, quer de dinheiro a uma pessoa, e depois falecer sem nada recear. Para isso, a riqueza é de grande serventia. Existem várias outras vantagens. Porém, mais do que tudo, á Sócrates, é por causa desta finalidade que eu considero a riqueza utilíssima para o homem judicioso.

PLATÃO – A REPÚBLICA – livro 1

Sócrates, Céfalo e Polemarco, diálogo sobre o que é justiça

Sócrates — As tuas são palavras maravilhosas, ó Céfalo. Mas essa virtude de justiça resume-se em proferir a verdade e em restituir o que se tomou de alguém, ou podemos dizer que às vezes é correto e outras vezes incorreto fazer tais coisas? Vê este exemplo: se alguém, em perfeito juízo, entregasse armas a um amigo, e depois, havendo se tomado insano, as exigisse de volta, todos julgariam que o amigo não lhe as deveria restituir, nem mesmo concordariam em dizer toda a verdade a um homem enlouquecido.
Céfalo — Estou de acordo.
Sócrates — Como vês, justiça não significa ser sincero e devolver o que se tomou.
Polemarco — Eu digo que sim, Sócrates, pelo menos se acreditarmos em Simônides.
Céfalo — Deixo-vos com este assunto, visto que preciso ir ternunar o sacrifício.
Polemarco — Quer dizer que eu não sou o teu herdeiro?
Céfalo (sorrindo) — Não há dúvida que sim. — E afastou-se para o seu sacrifício.
Sócrates — Explique-nos, já que és o herdeiro da discussão, que foi que disse Simônides de tão correto a respeito da justiça.
Polemarco — Que é justo devolver aquilo que devemos. Julgo ser esta asserção correta.
Sócrates — Evidentemente, é impossível não dar razão a Simônides, homem sábio e divino. Não obstante, tu, Polemarco, deves saber o signfficado do que ele diz, ao passo que eu o ignoro. Está claro que Simônides não se expressou a respeito do que falávamos, sobre restituir a uma pessoa algo do qual nos foi confiada a guarda, sendo que essa pessoa veio a perder a razão. Contudo, devemos ou não restituir um objeto do qual foi-nos confiada a guarda?
Polemarco — Claro que devemos.
Sócrates — Mas de forma alguma deve ser restituído se quem o reclamar tiver perdido a razão?
Polemarco — Com certeza.
Sócrates — Então, parece-me que Simônides quer dizer outra coisa quando afirma ser justo que restituamos o que devemos.
Polemarco — Certamente que se trata de outra coisa, por Zeus! Na opinião dele, deve-se fazer sempre o bem aos amigos, nunca o mal.
Sócrates — Compreendo. Não é lícito devolver a uma pessoa o ouro do qual ela nos confiou a guarda, se essa devolução lhe for prejudicial, e se os que o restituem forem seus amigos. É isto que quis dizer Simônides?
Polemarco — Exatamente.
Sócrates — E aos inimigos? Devemos restituir algo que por acaso estamos lhes devendo?
Polemarco — Com certeza. Pois, em meu entendimento, o que um inimigo deve a outro é, logicamente, o que lhe convém: o mal.
Sócrates — Logo, Simônides se expressou por enigmas, como usam fazer os poetas, ao declarar o que entendia por justiça. Aparentemente, para ele, é justo restituir a cada um o que lhe convém, considerando isso restituir o que é devido.
Polemarco — Perfeitamente.
Sócrates — Por Zeus! Portanto, se alguém lhe perguntasse: “ó Simônides, a quem e o que dá de devido e conveniente a arte que é denominada medicinal” Em teu entender, que resposta ele daria?
Polemarco — Evidentemente, que dá remédios, alimentos e bebidas aos doentes.
Sócrates — E a quem dá o que é devido e próprio a arte da culinária?
Polemarco — Temperos aos alimentos.
Sócrates — Certo. Agora, a quem e o que dá a arte que chamamos de justiça?
Polemarco — De acordo com o que afirmamos anteriormente, ela dá benefícios aos amigos e prejuízo aos inimigos.
Sócrates — Logo, o que Simônides entende ser justiça é ajudar os amigos e prejudicar os inimigos?
Polemarco — E o que me parece.
Sócrates — E quem tem mais possibilidade de ajudar os amigos que sofrem e prejudicar os inimigos, no que concerne a doença e a saúde?
Polemarco — O médico.
Sócrates — E aos navegantes, relativamente aos perigos numa viagem no mar?
Polemarco — O piloto.
Sócrates — E quanto ao homem justo? Em que circunstância como ele pode ajudar os amigos e prejudicar os inimigos?
Polemarco — Penso que seja na guerra, lutando contra uns e aliando-se aos outros.
Sócrates — Muito bem. Contudo, amigo Polemarco, o médico é inútil para as pessoas sadias.
Polemarco — Concordo.
Sócrates — E o piloto também o é para os que não estão navegando.
Polemarco — Claro.
Sócrates — E o homem justo, seria igualmente inútil para aqueles que não estão guerreando?
Polemarco — Com isto eu não concordo.
Sócrates — Portanto, a justiça é útil também durante a paz?
Polemarco — Sim.
Sócrates — Isto também vale para a agricultura, não é verdade?
Polemarco — E.
Sócrates — Para conseguirmos os produtos da terra?
Polemarco — Sim.
Sócrates — E, logicamente, também a arte do sapateiro?
Polemarco — Também.
Sócrates — Para podermos conseguir sapatos, certo?
Polemarco — Claro que sim.
Sócrates — Então, com qual objetivo de uso ou posse de que objeto a justiça é útil em tempo de paz?
Polemarco — Para os contratos comerciais, Sócrates.
Sócrates — Por contratos comerciais queres dizer as associações ou outro tipo de contrato?
Polemarco — As associações.
Sócrates — Sendo assim, quem é mais útil no jogo: o justo ou aquele que sabe jogar bastante bem?
Polemarco — Aquele que joga bem.
Sócrates — E quem é mais útil para assentar tijolos e pedras: o justo ou o pedreiro?
Polemarco — Lógico que o pedreiro.
Sócrates — Então, em qual associação julgas o justo mais útil que o pedreiro e o citarista, da mesma forma que o citarista o é em relação ao justo na arte da música?
Polemarco — Creio que nos assuntos monetários.
Sócrates — Exceção feita, talvez, Polemarco, para usar o dinheiro, como, por exemplo, na ocasião de adquirir ou vender um cavalo em sociedade. Nesse caso, seria mais útil um tratador de cavalos, não achas?
Polemarco — Parece-me que sim.
Sócrates — E a respeito de um navio, também é mais útil o construtor ou o piloto, concordas?
Polemarco — Sim.
Sócrates — Sendo assim, em qual circunstância, em que for necessário usar dinheiro ou ouro em sociedade, o homem justo é mais útil que qualquer outro?
Polemarco — Na circunstância de desejarmos fazer um depósito em segurança, Sócrates.
Sócrates — Mas isso significa: quando não utilizamos o dinheiro e preferimos deixá-lo imobilizado. Certo?
Polemarco — Sem dúvida.
Sócrates — Logo, a justiça só é útil quando o dinheiro for inútil?
Polemarco — Creio que sim.
Sócrates — Então, no caso de precisarmos guardar uma podadeira, a justiça é útil tanto do ponto de vista comum como particular; contudo, se precisarmos usá-la, é mais útil a arte de cultivar a vinha?
Polemarco — Parece que sim.
Sócrates — Tu concluis, portanto, que, se quisermos guardar um escudo e uma lira, sem usá-los, a justiça é útil; porém, se desejarmos nos servir deles, é mais útil a arte do soldado e do músico.
Polemarco — Necessariamente.
Sócrates — Por conseguinte, a respeito de todas as outras coisas, a justiça é inútil quando nos servimos dela e útil quando não nos servimos?
Polemarco — Penso que sim.
Sócrates — Logo, meu amigo, a justiça é muito pouco importante, se ela se aplica somente a coisas inúteis. Mas vamos examinar o seguinte: em um combate ou numa luta qualquer, o homem mais capaz de desferir golpes é também o mais capaz de se defender?
Polemarco — Sem dúvida.
Sócrates — E o mais capaz em preservar-se de uma doença não é também o mais capaz em transmiti-la secretamente?
Polemarco — Creio que sim.
Sócrates — Mas não é bom guarda de um exército aquele que furta aos inimigos os seus segredos e os seus planos?
Polemarco — Não resta dúvida.
Sócrates — Por conseguinte, o hábil guardião de uma coisa é também o hábil ladrão dessa mesma coisa.
Polemarco — Parece que sim.
Sócrates — Logo, se o homem justo é hábil em guardar dinheiro, o será também em furtá-lo.
Polemarco — Teu raciocínio leva a essa conclusão.
Sócrates — Portanto, o justo apresenta-se como uma espécie de ladrão, e penso que tu aprendeste isto com Homero. De fato, este poeta enaltece o avô materno de Ulisses, Autólico, dizendo que excedia a todos os homens no furto e no perjúrio. Logo, parece que a justiça, na tua opinião, na de Homero e Simônides, corresponde a uma determinada arte de furtar, porém a favor dos amigos e em prejuízo dos inimigos. Não era isso que tu dizias?
Polemarco — Claro que não! Não sei mais o que eu dizia. No entanto, continuo afirmando que a justiça se resume em ser útil aos amigos e prejudicial aos inimigos.
Sócrates — Mas tu chamas de amigos aqueles que os outros reputam honestos ou aqueles que o são dÉ verdade, apesar de não o parecerem, e da mesma forma os inimigos?
Polemarco — É natural apreciarmos os que julgamos honestos e detestar os que consideramos maus.
Sócrates — Mas os homens não podem se enganar, julgando honestas pessoas que não o são e vice-versa?
Polemarco — Sim, podem.
Sócrates — Logo, para os que se enganam, os honestos são inimigos e os desonestos, amigos?
Polemarco — Sem dúvida.
Sócrates — E, apesar disso, reputam justo ser útil aos desonestos e prejudicial aos honestos?
Polemarco — Parece que sim.
Sócrates — Contudo, os honestos e bons são justos e não têm capacidade de cometer injustiças.
Polemarco — Concordo.
Sócrates — Logo, de acordo com o teu raciocínio, é justo prejudicar os que não cometem injustiças.
Polemarco — De forma alguma, Sócrates, pois o teu raciocínio está errado.
Sócrates — Então, é justo prejudicar os maus e ajudar os bons?
Polemarco — Essa condusão é bem melhor que a precedente.
Sócrates — Então, para numerosas pessoas, Polemarco, que se enganaram a respeito dos homens, a justiça significará prejudicar os amigos — sendo que possuem amigos maus — e ajudar os inimigos — os quais, em verdade, são bons. E, sendo assim, afirmaremos o contrário do que imputávamos a Simônides.
Polemarco — Sem dúvida, parece que é isso mesmo. Mas façamos uma correção, pois corremos o risco de não havermos feito uma precisa definição de amigo e inimigo.
Sócrates — E de que maneira os definimos, Polemarco?
Polemarco — Amigo é aquele que parece honesto.
Sócrates — E de que maneira corrigiremos a definição?
Polemarco — Amigo é aquele que parece e realmente é honesto. Aquele que parece honesto, mas não é, apenas aparenta ser amigo, sem sê-lo. A definição é a mesma a respeito do inimigo.
Sócrates — Por conseguinte, de acordo com o teu raciocínio, amigo é o indivíduo bom e inimigo, o mau?
Polemarco — Exatamente.
Sócrates — Então, queres que acrescentemos ao que dissemos anteriormente a respeito da justiça que é justo ajudar o amigo e prejudicar o inimigo. Agora, devemos também afirmar que é justo ajudar o amigo bom e prejudicar o inimigo mau?
Polemarco — Precisamente. Dessa maneira parece-me bem explicado.
Sócrates — Logo, é peculiar ao justo prejudicar a quem quer que seja?
Polemarco — Não há dúvida de que devemos prejudicar os maus que são nossos inimigos.
Sócrates — E se fazemos mal aos cavalos, eles se tornam melhores ou piores?
Polemarco — Piores.
Sócrates — Relativamente à virtude dos cães ou à dos cavalos?
Polemarco — A dos cavalos.
Sócrates — Então, quanto aos cães a que fizermos mal, eles se tomarão piores em relação à virtude dos cães, e não à dos cavalos?
Polemarco — Exatamente.
Sócrates — E quanto aos homens a quem se faz mal, podemos também afirmar que se tomam piores conforme a virtude humana?
Polemarco — Isso mesmo.
Sócrates— Mas a justiça não é virtude especificamente humana?
Polemarco — Sim.
Sócrates — Por conseguinte, meu amigo, os homens contra quem se pratica o mal tornam-se obrigatoriamente piores.
Polemarco — Concordo.
Sócrates — Por acaso, é possível a um músico, por intermédio de sua arte, tomar outras pessoas ignorantes em música?
Polemarco — Isso é impossível.
Sócrates — E, por intermédio da arte eqüestre, pode um cavaleiro tomar outras pessoas incapazes de montar?
Polemarco — Também é impossível.
Sócrates — Mas, através da justiça, é possível que um justo tome alguém injusto? Ou, de forma geral, pela virtude, os bons podem transformar os outros em maus?
Polemarco — Não podem.
Sócrates — Realmente, creio que ao calor não é dado esfriar, e sim o contrário.
Polemarco — Justamente.
Sócrates — Nem à aridez é dado umedecer, mas o contrário.
Polemarco — Não há dúvida.
Sócrates — Nem ao homem bom ser mau, mas o contrário.
Polemarco — E o que parece.
Sócrates — Portanto, o homem justo é bom?
Polemarco — Evidentemente.
Sócrates — Então, Polemarco, não é adequado a um homem justo prejudicar seja a um amigo, seja a ninguém, mas é adequado ao seu oposto, o homem injusto.
Polemarco — Estás dizendo a pura verdade, Sócrates.
Sócrates — Por conseguinte, se alguém declara que a justiça significa restituir a cada um o que lhe é devido, e se por isso entende que o homem justo deve prejudicar os inimigos e ajudar os amigos, não é sábio quem expõe tais ideias. Pois a verdade é bem outra: que não é lícito fazer o mal a ninguém e em nenhuma ocasião.
Polemarco — Estou de pleno acordo.
Sócrates — Sendo assim, lutaremos juntos, tu e eu, contra quem imputar semelhante princípio a Simônides, a Bias, a Pítaco ou a qualquer outro homem sábio.
Polemarco — Associo-me com prazer à luta.
Sócrates — Sabes a quem atribuo a asserção de que é justo ajudar os amigos e prejudicar os inimigos?
Polemarco — A quem?
Sócrates — A Periandro, a Perdicas, a Xerxes, a Ismênio, de Tebas, ou a qualquer outro homem rico que se considerava assaz poderoso.
Polemarco — Eis uma grande verdade.
Sócrates — Porém, visto que nem a justiça nem o justo nos pareceram signfficar isso, como poderemos defini-los?

PLATÃO – A REPÚBLICA – livro 1

A Velhice, para Sócrates e Céfalo, segundo Platão

Sócrates — Em verdade, Céfalo, eu aprecio conversar com os velhos. Penso que devemos aprender com eles, pois são pessoas que nos antecederam num caminho que também iremos trilhar, para assim conhecermos como é: áspero e árduo ou tranquilo e cômodo. Com certeza, ser-me-ia agradável conhecer tua opinião, porquanto já alcançaste a fase da existência que poetas denominam “o limiar da velhice”. Como julgas este momento da tua vida?

Céfalo — Agrada-me, Sócrates, expressar meu pensamento. Cultivo o hábito de encontrar-me com pessoas da mesma idade. Muitos de nós lamentam-se, recordam os prazeres da juventude e, ao lembrar do amor, da bebida, da boa comida e de outros prazeres, atormentam-se como pessoas privadas de bens notáveis, que em outra época viviam bem e que, agora, nem ao menos vivem. Vários manifestam pesar pelas ofensas oriundas dos parentes e imputam à velhice a causa de tantos sofrimentos. Contudo, em meu modo de ver, Sócrates, eles se enganam a respeito da verdadeira causa de suas misérias, pois, se ela fosse realmente a velhice, também eu sentiria o mesmo desconforto, assim como todos aqueles que chegaram a esta fase da vida. Mas a verdade é que tenho encontrado velhos que se expressam de maneira muito diferente. Certa vez, indagaram ao poeta Sófocles, em minha presença:
— Qual é tua opinião a respeito do amor, Sófocles? Ainda te julgas capaz de amar?
E ele respondeu:
— Falemos baixo! Libertei-me do amor com o prazer de quem se liberta de um senhor colérico e truculento. Naquela época dei-lhe razão, e dou-lhe ainda hoje. Porque é bem verdade que a velhice nos proporciona repouso, livrando-nos de todas as paixões. Quando os desejos diminuem, a asserção de Sófocles revela toda a sua justeza. E como se nos libertássemos de inúmeros e enfurecidos senhores. No que diz respeito aos desgostos, aos aborrecimentos domésticos, estes têm apenas uma causa, Sócrates, que não é a velhice, mas o caráter dos homens. Se eles tiverem bom caráter e espírito equilibrado, a velhice não lhes será um fardo insuportável. Para os que não são assim, tanto a velhice quanto a juventude lhes serão desgostosas.

E eu (Sócrates), encantado com as suas palavras e desejoso de continuar a ouvi-lo, provoquei-o e disse-lhe:
— Eu creio, Céfalo, não serem muitos os que apoiam tuas ideias, porque julgam não ser teu caráter, porém a tua riqueza que te ajuda a tolerar bem a velhice. Com efeito, o dinheiro traz muitas compensações.

Céfalo — É verdade que não me apoiam. E têm certa razão, apesar de não ser tanta quanto creem. Existe muito de verdadeiro na resposta de Temfstocles ao indivíduo de Serifo que o insultou dizendo-lhe que era famoso por causa de sua pátria e não por causa de seus próprios méritos. Eu não teria me transformado num homem célebre, se tivesse nascido em Serifo, tampouco tu, se fosses ateniense. Do mesmo modo, àqueles que, não sendo ricos, se lamentam da velhice, poder-se-ia dizer que, se é verdade que um homem bom não pode ser totalmente feliz na velhice, também riqueza alguma poderá proporcionar a paz a um homem mau.

PLATÃO – A REPÚBLICA – livro 1

Cantata de Natal do Grupo ECBA – Igreja Bem Aventurança

CANTATA DE NATAL

GRUPO ECBA 2015

EMBAIXADORES DE CRISTO DA BEM AVENTURANÇA

Grupo infantil da Igreja Evangélica Pentecostal das Bem Aventuranças

Bairro Cruzeiro – Piraí – RJ

Edneia Pereira – Direção pastoral
Érica Barcellos – Produção e coordenação
Lilia Pereira – Cenografia
Juarez Barcellos – Direção musical

ROTEIRO

1- ENTRADA SOB LEITURA DE DOIS TEXTOS

AGORA DESPEDES

Cântico do Advento nº 5

Os meus olhos já viram a tua Salvação, a qual preparaste diante de todos os povos: luz para revelação aos gentios, e para glória do teu povo de Israel.

SAUDAÇÕES, MARIA

Cântico do Advento nº 1

Eis que conceberás e darás à luz um filho, a quem chamará pelo nome de Jesus.

2- CANTO COM UMA CANÇÃO POPULAR CONTEMPORÂNEA

VIM PARA ADORAR-TE

Autor: Tim Hughes

Versão em português: banda Adoração e Adoradores

Ré maior

Luz do mundo vieste á terra
Pra que eu pudesse te ver
Tua beleza me leva a adorar-te
Quero contigo viver

Vim para adorar-te
Vim para prostrar-me
Vim para dizer que és meu Deus

És totalmente amável
Totalmente digno
Tão maravilhoso para mim

Eterno rei, exaltado nas alturas.
Glorioso nos céus
Humilde vieste á terra que criaste
E por amor pobre se fez

Vim para adorar-te … (coro)

Eu nunca saberei o preço
Dos meus pecados lá naquela cruz (2 vezes)

Vim para adorar-te … (refrão)

3LEITURA DE DOIS TEXTOS

SAUDAÇÕES, MARIA

Cântico do Advento nº 1

Este será grande e será chamado Filho do Altíssimo; Deus, o Senhor, lhe dará o trono de Davi.

O PRÍNCIPE DA PAZ

Isaías 9

Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu; o governo está sobre os seus ombros; e o seu nome será: Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz.

4 CANTO COM UMA CANÇÃO TRADICIONAL

O PRIMEIRO NATAL

Autor: John Stainer – 1840

Lá maior

Ah! Um Anjo proclamou o Primeiro Natal
a uns pobres pastores ao céu de Belém
Lá nos campos a guardar os rebanhos do mal
numa noite tão fria e escura também

Natal, natal, natal, natal!
É nos nascido um rei divinal! (coro)

E de súbito no céu uma estrela surgiu
No oriente brilhou um estranho fulgor
E a terra percebeu essa luz que caiu
muitas noites ainda em exímio esplendor

Tendo visto á clara a luz dessa estrela sem par
Do oriente os pastores á foram seguir
A procura de um rei que devia chegar
Aos Judeus e as velhas promessas cumprir

Essa estrela apareceu e os pastores guiou
Na estrada que para Belém Os conduz
Afinal sobre Belém essa estrela parou
Mesmo acima da casa em que estava Jesus

E os magos com afã, e com grande temos
De joelhos entraram naquele lugar
Com ofertas liberais e de muito valor
Ouro, mirra e incenso vieram lhe dar

E com eles vamos nós, com sincero fervor
Dar louvores ao nosso sublime  Senhor
Que deixando os altos céus, a este mundo baixou
E, morrendo na cruz, nossas almas salvou


5 LEITURA DE UM TEXTO

GLÓRIA A DEUS NAS ALTURAS

Cântico do Advento nº 4

Glória a Deus nas maiores alturas, e paz na Terra entre os homens, a quem ele quer bem.

6 – CANTO DE UM HINO TRADICIONAL

SURGEM ANJOS PROCLAMANDO

Autor: desconhecido

Cantor Cristão – nº 79

Dó maior

Surgem anjos proclamando
Paz na Terra, e a Deus, louvor.
Vão seus hinos ecoando
Nas montanhas, ao redor.

Glória, glória a Deus nas alturas!
Glória, glória a Deus nas alturas! (coro)

Vão-se alegres os pastores
Ver o Infante celestial,
E acrescentam seus louvores
Ao louvor angelical.

Berço rude lhe foi dado,
Mas do céu lhe vem louvor.
Ele é o Salvador amado,
Bem merece o nosso amor.

Povos, tribos, celebrai-O !
“Glória a Deus”, também dizei.
De joelhos adorai-O;
Ele é o Cristo, o grande Rei !

REFERÊNCIAS

ANGELFIRE.COM – Metodista Cuiabá

BÍBLIA SAGRADA – edição revista e atualizada

CLARAVIEGASMIRANDA.BLOGSPOT.COM

LETRAS.MUS.BR

MÚSICA .COM.BR

NOVO CÂNTICO .COM.BR

VAGALUME.COM.BR

WIKIPÉDIA – A enciclopédia Livre

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Exemplos de atividades com danças para escolas

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

Segundo Carbonera e Carbonera (2008), um exemplo de atividade indicada para o Ensino Fundamental II, ou seja, para alunos do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental, usado no desenvolvimento do ritmo, inicia-se com os alunos organizados em blocos, com numero par de elementos em cada fileira, cada aluno segurando dois bastões de madeira (cabo de vassoura cortado 25 cm), determinado anteriormente com qual colega mais próximo será formado uma dupla durante o exercício. Posteriormente inicia-se a execução em quatro tempos, sendo que nos três primeiros tempos deve-se bater seu próprio bastão um no outro e no quarto tempo, bater no bastão do colega que esta de dupla, e aí faz variações o exercício em três tempos ou em dois; Cada aluno com um arco, disperso na quadra, em três tempos realizar dois passos, jogar o arco para cima e no quarto tempo pegar com a outra mão; Alunos dispersos na quadra, usar variados ritmos (rock, bolero, funk, sapateado, etc.) e se possível fazer uma montagem, unindo pequenos trechos de cada musica ou ritmo, sendo musicas lentas, moderadas e aceleradas.

Exercício para desenvolver a expressão corporal: incialmente divide-se a turma em grupos e, algumas sensações ou estados afetivos escritas antecipadamente em pedaços de papel (amor, ódio, calor, frio, fome, alegria, etc.), sorteie uma sensação para cada grupo, coloque uma música de ritmo moderado e peca para que todos ao mesmo tempo, criem movimentos individuais sobre a sensação que o grupo vivenciou. Em seguida cada grupo deve criar de três a quatro movimentos relativos à sensação do grupo e apresentara para o restante da turma; o próximo passo é unir os movimentos de todos os grupos e com auxilio do professor montar uma coreografia (CARBONERA E CARBONERA, 2008).

Ao escolher uma Dança Folclórica específica, não é preciso utilizar seus passos originais ou tradicionais, pois isso poderia tornar inviável e também requereria muita pesquisa para obter os detalhes típicos da dança escolhida. Cabe ao professor e aos próprios alunos criarem movimentos dentro do ritmo folclórico escolhido; o importante é desenvolver alguns elementos que associem os movimentos com a dança específica tendo como objetivo desertar no aluno o gosto por ritmos de raiz histórica relevante e a curiosidade por culturas diversificadas da nossa existência (FERREIRA, 2009).

Sobre as noções básicas das Danças Circulares observa-se que, inicialmente, há de se ordenar os alunos em círculos e com as mãos dadas, opcionalmente com a mão esquerda voltada para cima, palma da direita para baixo buscando por meio desse posicionamento de mãos, gerar um simbolismo dos atos de receber e doar, fechando-se em um circuito dançante (ANDRADA, 2014).

As Danças em Círculos são símbolos da unidade, totalidade, confiança e do apoio mútuo. Nelas, as atividades não são de competição, mas sim de cooperação, para promoção da interação entre os estudantes. A Dança Circular não está centralizada em um conteúdo representativo exclusivista, ela é diversificada na utilização de seu repertório, pois por meio dele, representa diversos povos e culturas. A Dança Circular pode ser aplicada no contexto da Educação Física Escolar como objeto de trabalho individual e em grupo (SECCO, OLIVEIRA E ALMEIDA, 2014).

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Como iniciar as aulas de dança nas escolas

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

O trabalho de Dança na Escola deve ser iniciado com as danças da atualidade, para motivar a participação dos alunos, fazendo com que eles realizem outros tipos de danças posteriormente (CARBONERA E CARBONERA, 2008).

Segundo Meirelles (2015), iniciar o trabalho fazendo um mapeamento da cultura corporal dos alunos pode ser uma boa forma. Conhecer as músicas e danças que eles gostam. Essa iniciativa serve como ponto de partida para o planejamento das aulas, no qual, as danças que os alunos já conhecem não devem ser ignoradas.

O professor empenhado no conhecimento dos contextos aos quais os alunos pertencem, busca também os propósitos de tais contextos se tornando um articulador, um interlocutor entre eles e o conhecimento em dança a ser desenvolvido na escola. Isso quer dizer que o professor atento ao conteúdo cultural que faz parte do cotidiano do aluno, pode utilizar esse mesmo conteúdo para facilitar a prática de suas aulas de Dança nas aulas de Educação Física Escolar. O professor pode também escolher e intermediar as relações entre as danças praticadas pelos alunos fora da escola, ou seja, seus repertórios pessoais e culturais, para utilizá-lo como facilitador na inserção de outros elementos da Dança que ainda não fazem parte de seus repertórios. Por exemplo: o rap, o funk, a dança de rua, e ainda seus movimentos pessoais, juntamente com as danças dos artistas de forma geral, tal como o mestre de capoeira, a passista, um coreógrafo contemporâneo, etc. Todo esse conhecimento pode ser trabalhado em sala de aula. O aproveitamento dessas danças e dessas manifestações dançantes, podem contribuir para que as aulas de Dança dentro do conteúdo programado pelo professor tenha maior aceitação (MARQUES, 2007).

Existem Danças com conteúdo relacionado com a realidade social em que vivem os alunos dentro de suas comunidades. Ao estimular a identificação das relações entre os personagens dessas danças, o tempo delas e a construção coletiva dos espaços de representação e das coreografias que as envolvem, possibilita-se a organização de apresentações de produção e criação para a escola e também para as comunidades. É possível fazer avaliações individuais e coletivas relacionadas às participações na produção e criação dessas apresentações (COLETIVO DE AUTORES, 1992).

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Conhecendo melhor os alunos

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

É preciso buscar a informação mais ampla possível sobre o aluno para que, por meio dela, o professor possa conhecê-lo melhor, e partindo desse conhecimento sobre ele, engajar-se na elaboração de novos projetos, buscar meios para redefinir os objetivos, empenhar-se na busca por variedade de conteúdos significativos e atraentes para os alunos, e, além disso, encontrar novas formas de avaliar que resultem na criação de novas propostas metodológicas capazes de inserir o aluno e envolvê-lo no contexto da aplicação do conteúdo, tendo com isso, o intuito de viabilizar a aprendizagem (BRASIL, 1998).

Com base nos conceitos estabelecidos nos Parâmetros Curriculares Nacionais é possível afirmar que a atuação do próprio aluno na sinalização dos horizontes que possibilitam visualizar os conteúdos favoráveis e passíveis de aprendizagem é indispensável, relevante e insubstituível:

Por mais que o professor, os companheiros de classe e os materiais didáticos possam, e devam contribuir para que a aprendizagem se realize, nada pode substituir a atuação do próprio aluno na tarefa de construir significados sobre os conteúdos da aprendizagem. É ele quem vai modificar, enriquecer e, portanto, construir novos e mais potentes instrumentos de ação e interpretação. (BRASIL, 1998, p. 72).

Tendo em prática essa busca por conhecer melhor o aluno, na aplicação da Dança Escolar, o professor deve valorizar as possibilidades expressivas de cada aluno. O professor deve ter a liberdade para permitir ao aluno expressar de forma espontânea essas possibilidades e, não apenas isso, mas deve também, favorecer o surgimento delas. O professor na busca por conhecer melhor o aluno deve abandonar a formação técnica formal, pois, ela pode vir a distanciar o aspecto verdadeiramente educacional da prática da Dança Escolar. Ferreira (2009) defende que é o desenvolvimento prático de variados tipos de dança, com suas movimentações específicas, porém, sem ênfase nas técnicas formais de danças tradicionais como o balé clássico, danças modernas, como o jazz, ou de danças contemporâneas baseadas na rigidez e na tensão técnica do balé clássico. O professor deve trabalhar a Dança na aula de Educação Física Escolar possibilitando a variedade de experimentações corporais que desenvolvam diversas habilidades de execução, expressão e interpretação.

O professor que trabalha com Dança na Educação Física Escolar deve exercitar, constantemente, sua criatividade para que ele consiga, partindo disso, organizar o conteúdo e os conhecimentos a serem transmitidos aos alunos. Ele deve também organizar o tempo escolar destinado a cada atividade a ser desenvolvida proporcionando adequação às necessidades de cada atividade para que o aproveitamento do conteúdo seja pleno e seu desenvolvimento não seja interrompido (FERREIRA, 2009).

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Desenvolvendo a Dança Escolar no Ensino Fundamental II

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

O professor de Educação Física deve estar ciente de que a criança do Ensino Fundamental II tem a necessidade de viver experiências que possibilitem o despertamento e aprimoramento de sua criatividade e capacidade interpretativa. Isso se dá por meio de atividades que favoreçam a sensação de alegria, utilizando-se de aspecto lúdico, para que a partir daí, ela possa retratar e canalizar o seu humor, seu temperamento, em fim, seu comportamento de maneira geral através da liberdade de movimento, expressão e desenvolvimento. Essas experiências podem ser desenvolvidas por meio da Dança aplicada na Educação Física Escolar (CARBONERA E CARBONERA, 2008).

Para o ensino da dança, há que se considerar que o seu aspecto expressivo se confronta, necessariamente, com a formalidade da técnica para sua execução, o que pode vir a esvaziar o aspecto verdadeiramente expressivo. Nesse sentido, deve-se entender que a dança como arte não é uma transposição da vida, senão sua representação estilizada e simbólica. Mas, como arte, deve encontrar os seus fundamentos na própria vida, concretizando-se numa expressão dela e não numa produção acrobática. (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 58).

A Dança tem um universo de possibilidades de aplicação tal, que oferece aos educadores uma flexibilidade muito ampla na utilização da Dança na aula de Educação Física Escolar. A variedade de estilos dançantes e de movimentos ligados a esses estilos proporcionam combinações de números expressivos colocando diante do professor um grande leque de conteúdo a ser ensinado na instituição escolar. (NASCIMENTO, 2011).

Leite (2012, p.33) afirma que “a Dança no ambiente escolar não deve priorizar a realização de movimentos corretos e perfeitos”, mas deve ter como base a aplicação dos elementos técnicos simplificados sem ter a excelência na prática da dança como objetivo de resultado imposto ao aluno. Deve ainda estimular e proporcionar a prática da improvisação e da busca por movimentos livres onde o aluno seja também criador dos movimentos e da dança e não apenas mero reprodutor de ensinamentos repetitivos e desgastantes que acabam por desestimular o aluno a praticar a Educação Física por meio da Dança Escolar.

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Resgate cultural pela dança

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

A Dança promove um resgate ao conhecimento cultural por estar ligada às origens étnicas, por representar povos e tribos antigas, por manifestar costumes e tradições dos homens nas mais diversas épocas ao longo da história, portanto, por estar ela intimamente envolvida nas manifestações culturais humanas desde todos os tempos e ao mesmo tempo ser uma linguagem de fácil entendimento e totalmente atualizada (NASCIMENTO, 2011).

“Faz-se necessário o resgate da cultura brasileira no mundo da dança através da tematização das origens culturais, sejam do índio, do branco ou do negro, como forma de despertar a identidade social do aluno no projeto de construção da cidadania.” (COLETIVOS DE AUTORES, 1992, p. 59).

Uma das maneiras de se pôr em prática esse resgate cultural por meio da Dança aplicada nas aulas de Educação Física Escolar, é inserir as danças folclóricas no contexto das aulas, pois o conhecimento do folclore inserido no contexto da Dança Escolar é atividade física, formativa e atividade de socialização, uma vez que favorece o desenvolvimento dos aspectos da personalidade, da valorização de convívio em grupo e de preservação de elementos culturais de importância histórica no conhecimento das origens de povos, tribos e raças. Portanto, é um trabalho de extrema importância dentro da Educação Física Escolar, porque mostra aos alunos a existência de um patrimônio cultural e histórico que carece de preservação para que as gerações vindouras também possam ter acesso a essas informações de forma prática e objetiva como deve ser na aplicação da Dança Folclórica nas aulas de Educação Física Escolar (FERREIRA, 2009).

A dança atende também como promotora de uma vida social integrada e saudável, isto pelos meios já mencionados neste estudo. Mas, além de todos os fatores que respondem ao que é e para quê serve a Dança, já descritos anteriormente nesta pesquisa, pode-se afirmar que ela desperta outros interesses por elementos que norteiam a dança, como o visual, destacado nas coreografias, e o auditivo, centrado nas músicas. Esses elementos, tanto os ensinados nas aulas escolares, quanto os trazidos pelos alunos como exemplos de conhecimentos adquiridos em seus ambientes familiares ou em outros convívios, devem ser valorizados. Esses elementos norteadores somados aos princípios elementares da Dança, ou seja, aos movimentos corporais, proporcionam a melhora na autoestima da criança e promovem a inclusão escolar, pois valorizam os costumes e os ambientes das comunidades onde a criança está inserida (FERREIRA, 2009).

Com base nos diversos pontos destacados até aqui neste estudo pode-se afirmar que a Dança aplicada na Educação Física Escolar proporciona ao ser humano o educar-se e, consequentemente, preparar-se para viver melhor cada dia por meio do ato de dançar. E isso dentro de um contexto pedagogicamente acompanhado (CATIB, TREVISAN E SCHWARTZ, 2009).

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O que é e para quê serve a dança

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

Considera-se a dança uma expressão representativa de diversos aspectos da vida do homem. Pode ser considerada como linguagem social que permite a transmissão de sentimentos, emoções da afetividade vivida nas esferas da religiosidade, do trabalho, dos costumes, hábitos, da saúde, da guerra etc. (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 58).

É comum o entendimento de que a dança é uma das mais divertidas maneiras para ensinar, entender e desenvolver o potencial do corpo humano de forma prática e objetiva principalmente quando os alunos são crianças. Enquanto os alunos se movimentam dançando, o professor tem a possibilidade de ensinar-lhes diversos aspectos inerentes à Educação Física, tais como a noção de espaço, o desenvolvimento físico, a sociabilidade e a noção rítmica, pois no relacionamento entre os alunos em aula, eles passam a conviver com a necessidade de respeitar o espaço do colega que também deve estar engajado no mesmo espírito coletivo da Dança. Além disso, os alunos passam a perceber dentro da linguagem corporal da Dança, uma forma mais alegre e divertida para expressar seus mais diversos sentimentos e até mesmo seus conhecimentos culturais adquiridos no meio onde vivem, sejam eles relativos à Dança, ou não. Tudo isso contribui para enriquecimento do aluno de forma individual e coletiva, pois colabora para a quebra de barreira como a timidez e auxilia no combate à baixa autoestima (LEITE, 2012).

A aplicação da Dança nas Aulas de Educação Física Escolar abre espaço para que o homem se expresse através de seus movimentos mais primitivos e contemporâneos ao mesmo tempo, onde as emoções mais comuns passíveis de manifestações cotidianas sejam incluídas no processo de aprendizagem, e, como afirma Bisse (1999, p.63), “não sejam excluídas pelo processo de racionalismo instrumental desenvolvido na escola e na sociedade em geral”.

A Dança aplicada na Educação Física Escolar serve para tornar o ser humano mais sensível às práticas de seus atributos naturais assumindo necessariamente o papel de coordenadora dos valores que norteiam esses atributos para que os mesmos regulem tais práticas ordenada e democraticamente tanto nos aspectos individuais, quanto coletivos (BISSE, 1999).

O ser humano exerce diferentes maneiras de se compreender o mundo, e para expressar essas diferentes formas de interpretação do mundo o homem utiliza-se de variedades de linguagens. A Dança é uma das linguagens para a compreensão cognitiva do mundo utilizada a milhares de anos conforme já descrito anteriormente neste estudo, portanto, seu emprego nas aulas de Educação Física Escolar oferece aos alunos uma possibilidade riquíssima para a prática dessa compreensão do mundo. Os alunos expressam sua compreensão do mundo e de si próprios, por meio dos movimentos corporais dentro da concepção de belo, e para isso, extraem de si o que há de mais puro e sincero (BISSE, 1999).

Para Sócrates, um dos grandes filósofos gregos, descrito por seu discípulo Platão em Leis VII, a Dança era considerada como a atividade que tinha as características necessárias para a formação do cidadão por completo. Para ele, a Dança daria proporções corretas ao corpo, proporcionaria vivência cotidiana com boa saúde, e, além disso, seria ótima para auxiliar na prática da reflexão estética e filosófica. Por isso deveria fazer parte da educação grega (MAGALHÃES, 2005).

A Dança é um rico conteúdo a ser ensinado nas aulas de Educação Física Escolar, tanto pela variedade de possibilidades, quanto pelo valor cultural agregado a ela. Segundo Nascimento (2011, p.12), “através dela permitimos aos alunos expressar seus desejos, expectativas e necessidades”.

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A Dança nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

Levar a Dança para o ensino nas escolas é um dos objetivos expostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais, juntamente com as artes visuais, a música, e o teatro.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte têm como objetivo levar a Dança para as aulas de Educação Física Escolar, bem como as artes visuais, a música e o teatro para serem aprendidos na escola, na busca de proporcionar ao aluno maior contato com artes que até então não eram aprendidas nas escolas. Neste contexto, a Dança se aproxima diretamente com a educação Física Escolar, por ser esta uma arte que se utiliza do movimento do corpo físico humano para sua prática, o que a classifica dentro da prática dessa disciplina como um elemento de extrema utilidade tendo em vista seu amplo leque de possibilidades de movimentação do corpo (BRASIL, 1998).

A Educação Física Escolar, dentro do que está proposto nos Parâmetros Curriculares Nacionais, é a área do conhecimento que tem a capacidade de introduzir e integrar os alunos numa cultura corporal do movimento ordenado, que pode ter como finalidade finalidades: o lazer, a expressão de sentimentos, a valorização dos afetos e das emoções, além da busca pela manutenção e melhoria da saúde. Portanto, a Dança, atendendo a esses requisitos práticos, está inserida no plano da Educação Física Escolar. A Dança aplicada nas aulas de Educação Física pressupõe um rompimento com a maneira tradicional para que os conteúdos que favorecem os alunos que já têm aptidões sejam passados dentro de um eixo estrutural de ação pedagógica que valorize o princípio da inclusão, buscando uma perspectiva metodológica de ensino e aprendizagem que tenham como objetivo o desenvolvimento da capacidade do aluno em participar das atividades, a valorização da prática da parceria nas atividades em grupo, a percepção da necessidade de interagir socialmente, o conhecimento e o respeito aos valores e princípios democráticos, bem como o exercício de seus direitos e deveres dentro desse contexto. Dessa maneira é possível acreditar que os alunos do Ensino Fundamental II (objeto deste estudo), assim como todos os demais, terão a oportunidade de usufruir da riqueza de movimentos e valores culturais oferecidos pela Dança. E dentro desse contexto de valorização do aluno, da ação pedagógica e da inserção de outros mecanismos de ensino, pode-se afirmar que há uma busca em benefício do exercício crítico da cidadania (BRASIL, 1998).

A partir dos anos 1980, o panorama pedagógico da Educação Física escolar passou a sofrer intensas transformações quanto às metodologias e formas pedagógicas utilizadas, uma vez que, até então, apresentava-se essencialmente sob as vertentes: tecnicista, esportivista e biologicista. Desde então, coexistem na área da educação física inúmeras tendências pedagógicas com base em abordagens e concepções, que visam uma tentativa de rompimento com os modelos tradicionais, além de diversificar, humanizar e democratizar a prática docente nessa área (CATIB, TREVISAN E SCHWARTZ, 2009).

 DA Dança foi incluída nos Parâmetros Curriculares Nacionais no ano de 1997 e foi reconhecida no Brasil como uma forma de conhecimento a ser aplicada nas aulas escolares, sendo ela uma rica fonte de prática de movimentos corporais alinhado a um conjunto de valores culturais. Portanto, ela vem sendo aplicada nas aulas de Educação Física Escolar em território nacional atendendo a essa inclusão nos PCN (MARQUES, 2007).

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Dança nas Aulas de Educação Física Escolar

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

A dança dentro de um contexto escolar se apresenta como uma alternativa de experiência lúdica que se mostra muito construtiva, pois está ao alcance de todos, tendo em vista que seu instrumento central é o corpo humano com seus movimentos. A escola não deve ter a intenção de formar bailarinos, mas sim de proporcionar ao aluno um contato mais efetivo e intimista com a possibilidade de se expressar criativamente com o movimento corporal dentro de um conjunto de normas técnicas básicas avaliadas pedagogicamente (CARBONERA E CARBONERA, 2008).

A Dança encontra na escola uma estrutura favorável à sua prática, ainda que com aplicações básicas voltadas para a prática da Educação Física Escolar, sem aprofundamento técnico.

De acordo com Marques a escola não é o único lugar para que se aprenda a dança com qualidade, profundidade, compromisso, amplitude e responsabilidade, no entanto, ela é hoje um lugar privilegiado para que isso aconteça. E talvez não deva ser o único lugar para o aprendizado artístico, uma vez que, no contexto escolar, ela será parte de uma disciplina dentro de um conjunto mais amplo de conteúdo a ser ensinado pela escola (MARQUES, 2007).

Dentro do contexto do ensino de Dança nas aulas de Educação Física Escolar Carbonera e Carbonera (2008) contribuem ao afirmar que a possibilidade de compreender o corpo por meio da dança e, ao paralelamente, estabelecer múltiplas relações com outras áreas do conhecimento analisando, discutindo, refletindo e contextualizando seu papel na contemporaneidade, necessariamente passa a ser o campo de atuação de quem trabalha com seres humanos, principalmente daqueles que trabalham com educação, em que a multiplicidade cultural e física presentes nas salas de aula exige acompanhamento pedagógico constante para que o resultado da aplicação da Dança nas Aulas de educação Física Escolar seja saudável e favorável ao aluno.

Para Ferreira (2009) a prática da Dança na Educação Física Escolar não pode ser unicamente objeto de recreação, utilizada em festas e eventos públicos com objetivo de preencher um roteiro de apresentações, ou tão pouco, ser simplesmente voltada para o exercício de habilidades motoras, mas deve cuidar do equilíbrio psíquico, para que o aluno possa expressar-se criativa e espontaneamente, externando suas particularidades culturais dentro de uma manifestação coletiva.

A Dança aplicada na Educação Física Escolar tem papel essencial nas atividades lúdicas e pedagógicas, despertando no aluno uma relação concreta dele com o mundo. Proporcionando maior relação com o meio onde vive e, consequentemente, ampliando sua percepção com o mesmo (LEITE, 2012).

Ferreira (2009) esclarece que, em relação ao papel pedagógico da Dança Escolar, deve-se considerar sua atuação integrada à Educação Física, portanto, tratando-se da uma Dança aplicada às aulas de Educação Física Escolar. E dentro desse contexto pedagógico, ela deve visar o aumento da autoestima, o combate ao estresse, a melhoria da postura corporal, além de auxiliar na aquisição e manutenção da saúde, aptidão social, mental, psíquica e física. Fazendo com que a Dança na educação física Escolar tenha uma atuação muito mais ampla e ofereça um resultado proveitoso ao aluno nos mais diversos pontos e aspectos de sua vida.

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Danças Contemporâneas – Histórico da Dança

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

Dentro do termo contemporâneo encontra-se variedade de interpretações, porém alguns conceitos parecem apresentar maior lucidez ao conduzirem um raciocínio explicativo voltado para a lógica temporal, ou seja, associando o termo a um conjunto mais amplo de manifestações artísticas de Dança produzidas atualmente. Portanto, afirmando que “Dança contemporânea é tudo aquilo que se faz hoje dentro dessa arte. Não importa o estilo, a procedência, os objetivos nem a sua forma. É tudo aquilo que é feito em nosso tempo, por artistas que nele vivem” (FARO, 1986, p. 124).

Teve início no século XIX o movimento contra a formalização do aprendizado da Dança. Havia duas correntes de ensino da Dança, uma moderna surgindo com elementos conceituais novos, e outra, tradicional acadêmica voltada para a formalização rígida e técnica do balé clássico. Essas duas correntes passam divergências por questões estruturais em suas teorias fundamentais filosóficas para as quais são exigidas aos professores competências diferenciadas para o ensino da arte em questão (NANNI, 1995).

Segundo Bisse (1999), o declínio do balé se percebia claramente já no início do século XX, quando não era mais possível encontrar os grandes e tradicionais balés na França, na Itália, nem mesmo em outros países da Europa, somente na Rússia sob a proteção do Czar permanecia o balé clássico em sua essência original. Abria-se espaço, portanto, para as novas manifestações corporais, nas quais a técnica mecânica clássica era questionada e substituídas para permitir novos conceitos de dança no senário artístico da época.

Há tendência a se afirmar que a dança contemporânea surgiu na década de 60 como uma forma de protesto ou rompimento com a cultura clássica até então predominante. Na década de 1980, houve um período de intensas inovações e experimentações que muitas vezes beiravam a total desconstrução da arte, em fim a dança contemporânea começou a se definir procurando desenvolver uma linguagem própria, todavia, permaneça algumas vezes com evidente referência ao ballet clássico (CARBONERA E CARBONERA, 2008).

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As Danças Medievais e o Balé Clássico – História da Dança

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

Na Idade Média, as danças populares usavam movimentos livres, nos quais os participantes poderiam criar movimentos livres durante a dança. As coreografias nessas danças apenas orientam os movimentos conjuntos para que os participantes possam dividir o momento da dança. Os passos são contextualizados juntamente com a emoção proporcionada pela dança, podendo ser copiados e reutilizados em outras festividades. Ao dançar uma carola pode-se criar um passo novo e introduzi-lo no calor do momento. Todos os participantes criam e reproduzem movimentações corporais, sem distinção (SOUZA, 2009).

Os especialistas em danças medievais são praticamente unânimes em apontar que as danças de salão, que floresceram entre a nobreza europeia, descendem diretamente das danças populares. Ao serem transferidas do chão de terra das aldeias para o chão de pedra de castelos medievais, essas danças foram modificadas; abandonou-se o que nelas havia de pouco nobre, nos “loures”, nas “alemandas” e nas “sarabandas” dançados pelas classes que se julgavam superiores (FARO, 1987, p. 31).

Novas regras dentro da dança da corte ligadas a uma nova postura possibilitam e exigem mudanças de atitudes corporais. Passa-se então a construir um novo corpo através destas novas regras, dando origem a uma nova concepção estética ligada diretamente com a força e com a rigidez dos movimentos (SOUZA, 2009).

Segundo Bisse (1999) os balés da corte foram criados a partir das danças populares, que inicialmente, na época de Luís XIII, era um ótimo meio de propaganda, se tornou uma maneira de afirmar o princípio monárquico. Esses balés eram uma cerimônia de adoração ao Rei. O balé da corte, inicialmente era um baile que se organizava tendo centro temático um ato dramático. Somente a partir do século XVII, na França, que o balé foi transformado, principalmente quando Luís XIV fundou a Academia Real de Dança e de Música, com o propósito de restabelecer a dança em toda sua perfeição. Para isso, ela precisava ser trabalhada por profissionais, e isso veio a acontecer a partir de 1681. Então foram criadas as bases do balé clássico internacional, que veio a ser extraordinariamente projetada.

Puoli (2010) destaca que a história do ballet teve início na Itália e depois, com a chegada dos Medicis na França, fortaleceu-se também nesse país. Esse período do ballet romântico vai de 1830 até aproximadamente 1870 e depois a Dança passou a declinar na Europa. Porém, na Rússia, devido ao patrocínio do czar, esse declínio não ocorreu. Então, o centro mundial da dança mudou-se de Paris para São Petersburgo. A Rússia se tornou atraente para muitos bailarinos e coreógrafos franceses que migraram para trabalhar na sede do balé.

O balé em seu apogeu alcançou todas as cortes europeias, e ganhou novo impulso na Rússia principalmente pelo interesse dos governantes pela nova arte, o que fez com que o país se tornasse um refúgio temporário de bailarinos franceses e italianos que buscavam trabalho (FARO, 1986).

Segundo Souza (2009) o Balé Clássico como é conhecido atualmente mantém-se imutável em seu aspecto coreográfico, tanto quanto, em sua formação estrutural rígida acadêmica, na qual os bailarinos são submetidos às técnicas mecanicistas, dentro da mesma lógica de tensões entre os indivíduos participantes. Sobre a manutenção de elementos técnicos dentro da estrutura do balé, Magalhães (2005) afirma que algumas das técnicas utilizadas na Dança dos gregos se mantêm até os dias de hoje dentro do balé clássico, uma delas é a meia ponta, ou releve, absorvido pelo balé de corte e mais tarde pela técnica clássica. Existem muitos documentos épicos que podem dar alguma noção sobre a técnica de Dança usada pelos gregos.

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Danças Primitivas e Religiosas – Histórico da Dança

Autora: Érica Ferreira de S. B. de Paula – Profª de Educação Física

As primeiras manifestações de danças praticadas pelo homem foram tipicamente imitativas, nelas, os dançarinos simulavam os acontecimentos que almejavam que viesse a se tornar realidade. Os homens daquela época acreditavam que forças misteriosas estariam conspirando contra sua realização (COLETIVO DE AUTORES, 1992).

DANÇAS PRIMITIVAS E RELIGIOSAS

Magalhães afirma que figuras gravadas em paredes de cavernas e grutas, que datam de até 1000 anos, para muitos arqueólogos, podem representar imagens de seres humanos dançando. Por exemplo, a figura encontrada na parede da gruta Gabillou na Dordonha, perto de Mussidan, na França (MAGALHÃES, 2005).

Uma das imagens mais antigas representando a dança, data do Mesolítico a aproximadamente 8300 A.C, descoberta na caverna de Cogul, localisada na província de Lérida, na Espanha. Há ainda, outra imagem observada que representa grupos com cultura identificada com a da Idade da Pedra. Esse é o caso dos bushmen da África do Sul, figurando pessoas dançando em torno de animais que seriam sacrificados. Dança semelhante é executada pelos kurnai da Austrália meridional. Em ambos os grupos percebe-se a atividade de sobrevivência, neles a caça, provêm de uma dança ritualística. Nesses ritos há ainda outro elemento empregado, que são as máscaras, pois se acreditava que com o rosto coberto, podiam assimilar poderes místicos oriundos da divindade, por exemplo, a força do animal a ser abatido, ou a benevolência de algum espírito para a comunidade. As máscaras eram usadas também como ferramentas para expulsar demônios (MARIBEL, 1989).

A arqueologia esclarece sobre o passado da humanidade ao traduzir escritas de povos da antiguidade, e indica a existência da dança como parte integrante de cerimônias religiosas, levando a crer que a dança nasceu da religião, ou ainda, que ambas nasceram ao mesmo tempo (FARO, 1986).

Um exemplo típico entre as civilizações antigas, nas quais a dança tinha caráter sagrado, se destaca o Egito. Para os egípcios, a dança tinha um caráter extremamente ritualístico, como por exemplo, a adoração de divindades como Osíris, Isis e seu filho Horus – trindade básica da religião egípcia (NANNI, 2003).

As danças primitivas estavam extremamente ligadas à religião. Para elas a ligação entre o homem e o divino aconteceria por meio de suas danças.

Pode-se afirmar também que os gregos valorizaram a Dança desde os primórdios da civilização. Ela aparece em mitos, lendas, cerimônia, literatura e também como matéria obrigatória na formação do cidadão (MARIBEL, 1989).

Para os gregos a Dança era como um dom divino e ainda como um canal de comunicação entre os homens e os deuses, portanto a Dança estava no campo religioso com uso ritualístico (MAGALHÃES, 2005).

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Filósofos Pré-Socráticos

Dados biográficos básicos sobre quinze grandes pensadores que viveram um pouco antes, ou no tempo de Sócrates.

1. Tales de Mileto 625/4 – 558 A.C.

Natural da Jônia, Ásia Menor, de descendência Fenícia. Considerado o primeiro físico grego, buscava informação sobre a natureza em geral, tendo a água como princípio. Não se sabe se escreveu algum livro. Sua fonte de informação se dá por doxografias (Aristótoles, “Metafísica”, I, e “Da Alma”, e Simplício, “Física”.

2. Anaximandro de Mileto 610-547 A.C

Sucessor e discípulo de Tales. Suas áreas de atuação foram: geometria, matemática, astronomia e política. A fonte de informação sobre ele se dá por relatos da existência de fraguimentos de um livro chamado “Sobre A Natureza” de sua autoria, além de, doxografias (Aristóteles, “Física”, III, Aristótoles, “Meteorologia”, II, e Simplício, “Física”)

3. Anaxímenes de Mileto 585-528/5 A.C.

Discípulo e continuador de Anaximandro. Dedicou-se à meteorologia e foi o primeiro a afirmar que a lua recebe sua luz do sol. Escreveu uma obra em prosa, “Sobre a Natureza”.

4. Pitágoras de Samos 580/78-497/6 A.C.

Nasceu em Samos, mas pelo ano 540 A.C. foi para a Magna Grécia (sul da Itália). Não deixou nada escrito, entretanto, fundou em Crotona uma associação filosófica e religiosa, de doutrinas secretas, e com adeptos ativos na política. Eles provocaram uma revolta, Pitágoras teve que abandonar Crotona e se refugiar em Metaponto, onde morreu. Sua associação havia se estendido por Torento, Metaponto, Síbiris, Régio e Siracusa. O pitarogorismo exerceu profunda influência na filosofia grega. Posteriormente, Filonau e Arquitas, deram continuidade ao pitagorismo.

5. Xenófanes de Colofão 570-528 A.C.

Nasceu em Colofão, na Itália, porém, passou parte de sua vida na Silícia. Foi sábio, poeta e rapsodo (poeta e cantor popular que seguia de cidade em cidade). Escreveu em verso, em oposição aos filósofos de Mileto, que escreviam em prosa. Tornou-se famoso por atacar Hesíodo e Homero (poetas), e Tales, Pitágoras e Epimênides (Pensadores).

6. Heráclito de Éfeso 540-470 A.C.

Nasceu em Éfeso, cidade da Jônia, e era descendente do fundador da cidade. Desprezava a plebe, os antigos poetas, os filósofos de seu tempo e a religião. Escreveu um livro chamado “Sobre a Natureza”. Estabeleceu o ser permanente e a existência de lei universal e fixa regedora e fundamento de tudo – o Logos.

 7. Parmênides de Eléia 530-460 A.C.

Nasceu em Eléia, hoje chamada Vélia, na Itália, foi discípulo do pitagórico Aminías. Combateu a filosofia dos jônicos, com Zenão, em Atenas. Escreveu um poema filosófico, em verso: “Sobre a Natureza”.

8. Zenão de Eléia 504/5-? A.C.

Natural da Eléia, Itália, interveio na política, criando leis para a sua pátria. Foi prezo ao conspirar contra a tirania, foi torturado e morto por revelar seus comparsas. Escreveu, em prosa: “Discussões”, “Contra os Físicos”, “Sobre a Natureza”, e “Explicação Crítica de Empédocles”. Zenão defendeu o ser uno, contínuo e indivisível de seu mestre Parmanênides, contra o ser múltiplo, descontínuo e divisível dos pitagóricos. Desenvolveu argumentos complexos a respeito do movimento.

9. Melisso de Samos

Nasceu em Samos, ilha do Mar Egeu, foi filósofo e político grego importante. Derrotou os atenienses em 441 A.C. comandando ema esquadra. Escreveu um poema intitulado Sobre o Ser ou Sobre a Natureza. Era defensor de Parmênides, contra os pitagóricos e contra Empédocles.

10. Empédocles de Agrigento 490-435 A.C.

Natural da Colônia de Agrigento, na Silícia. Era um defensor da democracia, cientista, místico, alcmeônida, pitagórico e órfico. Escreveu dois poemas em jônico: “Sobre a Natureza” e “Purificações”. Atribuía-se possuir poderes mágicos. Ao princípio das coisas, atribui quatro elementos: fogo, terra, água e ar, substituindo a ideia perseguida pelos jônicos de princípio único. Misturava o ser imóvel de Parmênides com o ser em transformação de Heráclito. Considerava a influência do amor e do ódio como causas.

11. Filolau de Crotona

Pitagórico do sul da Itália, nascido em Crotona, em meados do século V A.C. Foi mestre de Demócrito e de Arquitas. Escreveu um livro sobre a doutrina pitagórica que influenciou muito o pensamento de Platão.

12. Arquitas de Tarento 400-365 A.C.

Pitagórico, discípulo de Filolau e amigo de Platão. Foi eleito governador de Tarento por sete vezes consecutivas. Dentre muitas obras perdidas que lhe são atribuídas, restam fragmentos de “Harmonia” e das “Diatribes”, ou Conversas, sobre matemática e música. “Os sons agudos se movem depressa, e os graves lentamente”.

13. Anaxágoras de Clazômenas 500-428 A.C.

Nasceu em Clazômenas, Jônia, Ásia Menor, e viveu aproximadamente trinta anos em Atenas, onde fundou a primeira escola filosófica. Foi discípulo de Péricles, dedicou-se à física, matemática, astronomia e a meteorologia. Para ele o sol era uma pedra incandescente, e não divindade, sendo acusado por isso em 431 A.C. Escreveu um livro “Sobre a Natureza”, do qual restam alguns fragmentos, e também, talvez, dois tratados, um sobre perspectiva, e outro, sobre a quadradura do círculo, além de livro de problemas.
Anaxágoras é considerado o filósofo pré-socrático que mais originou variedades de discussões e interpretações. Fundou uma escola também em Lâmpsaco, na Jônia, onde cunharam moedas com sua efígie e lhe fizeram epitáfios.

14. Leucipo de Mileto 500-430 A.C.

Nasceu em Mileto, ou Eléia, viveu na época dos sofistas, de Anaxágoras e de Sócrates. Leucipo foi considerado o criador da teoria dos átomos por Aristóteles. Ele foi autor de duas obras: “A Grande Ordem do Mundo” e “Sobre o Espírito”.

15. Demócrito de Abdera 460-370 A.C.

Discípulo de Leucipo e seu sucessor na Escola de Abdera, nasceu em Abdera, colônia Jônica da Trácia. Deixou aproximadamente noventa obras escritas, segundo Diógenes Laércio, restando apenas fragmentos de algumas, de conteúdo teórico e outras de conteúdo moral. É considerado o sistematizador da doutrina atomista.

Tosse com engasgo noturno

Juarez Barcellos - Jaqueira

Em meados de Fevereiro deste ano (2013) fui surpreendido por um sintoma noturno assustador que me levou a passar sete noites com medo de morrer. Inicialmente era só tosse causada por pigarro, mas rapidamente se transformou em engasgo assustador; passei a dormir sentado em cadeira e beber muita água, pois ela fazia descer da minha garganta alguma substância que causava tosse e, consequentemente, o engasgo. Numa noite fiquei tão tenso tentando controlar a tosse e o engasgo, que o medo de desmaiar passou a ser outra preocupação. Consultei-me com seis médicos, tomei xaropes de carbocisteína, maleato de dexclorfeniramina+betametasona, fiz nebulização, usei Decadrom injetável, fiz raio x dos pulmões , eletrocardiograma e ecocardiograma, assim descobri que tenho a válvula aorta bicúspide, mas isso não vem ao caso.

Dos seis médicos, três me recomendaram procurar um otorrino, e um deles diagnosticou doença do refluxo, aconselhou-me a consultar um gastroenterologista e alegou não poder receitar nenhum medicamento, pois naquele momento eu não estava em crise. Consultei-me com um gastro, ele me receitou omeprazou  (doze dupla|80mg/dia) depois de minha forte insistência e de afirmar que um clínico geral havia diagnosticado doença do refluxo, pois o mesmo afirmava que não eram sintomas de tal doença, então ele me encaminhou para um otorrinolaringologista e pediu uma endoscopia. Eu já estava tomando omeprazou há dois dias receitado por outro médico que confiou no diagnóstico dado pelo clínico, porém ainda não era a doze certa para o tratamento (doze dupla).

O otorrino afirmou imediatamente que eram sintomas de doença do refluxo (DRGE), mandou permanecer com com o omeprazol em doze dupla durante trinta dias, no mínimo, falou sobre a dieta que eu já estava fazendo, recomendou levantar um pouco a cabeceira da cama, fez uma vídeo laringoscopia, porém não teve boa visualização; então pediu uma tomografia computadorizada, pois a tosse fortíssima poderia ter causado algum dano. Nessa consulta tive a percepção de estar diante de um profissional competente, tanto pela capacidade técnica, quanto pela humildade de não subestimar o paciente, que, nos dias atuais, tem diante de si uma ferramenta de pesquisa extremamente democrática e riquíssima, que é a internet.

Concluindo: após uma semana fazendo uso do omeprazol em doze dupla (80 mg/dia, 40 pela manhã e 40 a tarde), não tive mais crise; tomei esta doze durante sessenta dias e estou a sessenta dias usando a 40 mg/dia (20 mg pela manhã e 20 mg a tarde). Mudei a forma de me alimentar, passei a fazer pequenas refeições a cada três horas  e não me deito antes de duas horas após ter feito uma refeição. Emagreci oito quilos em dois meses e ainda estou quatro quilos acima da minha média, todavia, posso desenvolver meus projetos em paz. 

Atualização em 09/08/2013: depois dos sessenta dias com 80mg (40 pela manhã e 40 a tarde) e noventa com 40mg (20 pela manhã e 20 a tarde), passeia usar somente 20mg a tarde. Não tive mais crise e estou muito bem.

Graças a Deus! Um agradecimento especial à minha esposa Érica por ter cuidado de mim!

Este relato é acessado todos os dias, por isso, decidi anexar parte de um estudo científico sobre o assunto para dar maior esclarecimento ao leitor. Leia atentamente:

DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO: revisão ampliada 

Ary NASI1, Joaquim Prado P. de MORAES-FILHO2 e Ivan CECCONELLO1  (p. 4 do arq. e 337 da obra)

Há tendência em tratar os pacientes com diagnóstico de esofagite com IBP*, em dose plena*, por 6 a 12 semanas. Alguns autores propõem administração de dose dobrada (o dobro da dose plena) para as esofagites de maior gravidade (graus III e IV de Savary-Miller ou C e D de Los Angeles).”

* IBP, sigla para Inibidores da bomba protônica (Omeprazol, Lansoprazol, Pantoprazol, Rabeprazol e Esomeprazol).

* IBP Dose plena diária: Omeprazol 40 mg // Pantoprazol 40 mg (quadro 2, p 4). Para ambos, a dose dobrada é 80 mg por dia. em duas tomadas, manhã e tarde,

“Em estudo baseado em revisão sistemática de literatura, todos os IBP foram melhores que a ranitidina e o placebo na cicatrização da esofagite.” 

“A história natural da DRGE ainda não é bem compreendida. De fato, embora os sintomas sejam crônicos e muitas vezes recorrentes, usualmente a esofagite não progride com o passar do tempo. Assim, apenas pequena proporção (menos de 15% dos pacientes sem esofagite ou com esofagite leve) progride para graus mais avançados da doença. Vale salientar que cerca de 80% dos pacientes com DRGE apresentam recidiva dos sintomas nos seis primeiros meses de interrupção do tratamento  medicamentoso. Nos casos em que é requerido o tratamento de manutenção, este deve ser feito utilizando-se IBP, empregando-se a dose mínima eficaz para controle dos sintomas.”

“O grande problema com o tratamento clínico da DRGE não é controlar os sintomas, mas sim manter os pacientes assintomáticos a longo prazo.”

“Visa o alívio dos sintomas, a cicatrização das lesões e a prevenção de recidivas e complicações. Do ponto de vista prático, objetiva-se reduzir o potencial agressivo do conteúdo gástrico, minimizando a agressão representada pelo ácido clorídrico do suco gástrico. Pode-se classificar a abordagem terapêutica em medidas comportamentais e farmacológicas, que deverão ser implementadas simultaneamente.” 

QUADRO 1 – Medidas comportamentais no tratamento da DRGE:

• Elevação da cabeceira da cama (15 cm).
• Moderar a ingestão dos seguintes alimentos, na dependência da correlação com os sintomas: gordurosos, cítricos, café, bebidas alcoólicas, bebidas gasosas, menta, hortelã, produtos de tomate, chocolate.
• Cuidados especiais para medicamentos potencialmente “de risco”: anticolinérgicos, teofilina, antidepressivos tricíclicos, bloqueadores de canais de cálcio, agonistas beta adrenégicos, alendronato.
• Evitar deitar-se nas 2 horas após as refeições.
• Evitar refeições copiosas.
• Redução drástica ou cessação do fumo.
• Reduzir o peso corporal (emagrecimento).

v. 43 – no.4 – out./dez. 2006 Arq Gastroenterol p.337 – Disciplinas de 1 Cirurgia do Aparelho Digestivo e Coloproctologia e 2 Gastroenterologia Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Felicidade a todos, espero que tenha contribuído.

Visite também:  http://drauziovarella.com.br/   http://www.abcdasaude.com.br/    http://saudedigestiva.blogspot.com.br/


Veja a postagem original (4 de junho de 2013) com mais de duzentos comentários:
https://juarezbarcellos.wordpress.com/2013/06/04/tosse-com-engasgo-noturno/
Leia também o relato da Isabel Amaro sobre a “tosse coqueluche”. Destaco em seu relato as três fases da doença e o fato de ser contagiosa:
https://juarezbarcellos.wordpress.com/2014/08/26/tosse-coqueluche/

Tosse com engasgo noturno

Juarez Barcellos - Jaqueira

Em meados de Fevereiro deste ano (2013) fui surpreendido por um sintoma noturno assustador que me levou a passar sete noites com medo de morrer. Inicialmente era só tosse causada por pigarro, mas rapidamente se transformou em engasgo assustador; passei a dormir sentado em cadeira e beber muita água, pois ela fazia descer da minha garganta alguma substância que causava tosse e, consequentemente, o engasgo. Numa noite fiquei tão tenso tentando controlar a tosse e o engasgo, que o medo de desmaiar passou a ser outra preocupação. Consultei-me com seis médicos, tomei xaropes de carbocisteína, maleato de dexclorfeniramina+betametasona, fiz nebulização, usei Decadrom injetável, fiz raio x dos pulmões , eletrocardiograma e ecocardiograma, assim descobri que tenho a válvula aorta bicúspide, mas isso não vem ao caso.

Dos seis médicos, três me recomendaram procurar um otorrino, e um deles diagnosticou doença do refluxo, aconselhou-me a consultar um gastroenterologista e alegou não poder receitar nenhum medicamento, pois naquele momento eu não estava em crise. Consultei-me com um gastro, ele me receitou omeprazou  (doze dupla|80mg/dia) depois de minha forte insistência e de afirmar que um clínico geral havia diagnosticado doença do refluxo, pois o mesmo afirmava que não eram sintomas de tal doença, então ele me encaminhou para um otorrinolaringologista e pediu uma endoscopia. Eu já estava tomando omeprazou há dois dias receitado por outro médico que confiou no diagnóstico dado pelo clínico, porém ainda não era a doze certa para o tratamento (doze dupla).

O otorrino afirmou imediatamente que eram sintomas de doença do refluxo (DRGE), mandou permanecer com com o omeprazol em doze dupla durante trinta dias, no mínimo, falou sobre a dieta que eu já estava fazendo, recomendou levantar um pouco a cabeceira da cama, fez uma vídeo laringoscopia, porém não teve boa visualização; então pediu uma tomografia computadorizada, pois a tosse fortíssima poderia ter causado algum dano. Nessa consulta tive a percepção de estar diante de um profissional competente, tanto pela capacidade técnica, quanto pela humildade de não subestimar o paciente, que, nos dias atuais, tem diante de si uma ferramenta de pesquisa extremamente democrática e riquíssima, que é a internet.

Concluindo: após uma semana fazendo uso do omeprazol em doze dupla (80 mg/dia, 40 pela manhã e 40 a tarde), não tive mais crise; tomei esta doze durante sessenta dias e estou a sessenta dias usando a 40 mg/dia (20 mg pela manhã e 20 mg a tarde). Mudei a forma de me alimentar, passei a fazer pequenas refeições a cada três horas  e não me deito antes de duas horas após ter feito uma refeição. Emagreci oito quilos em dois meses e ainda estou quatro quilos acima da minha média, todavia, posso desenvolver meus projetos em paz. 

Atualização em 09/08/2013: depois dos sessenta dias com 80mg (40 pela manhã e 40 a tarde) e noventa com 40mg (20 pela manhã e 20 a tarde), passeia usar somente 20mg a tarde. Não tive mais crise e estou muito bem.

Graças a Deus! Um agradecimento especial à minha esposa Érica por ter cuidado de mim!

Este relato é acessado todos os dias, por isso, decidi anexar parte de um estudo científico sobre o assunto para dar maior esclarecimento ao leitor. Leia atentamente:

DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO: revisão ampliada 

Ary NASI1, Joaquim Prado P. de MORAES-FILHO2 e Ivan CECCONELLO1  (p. 4 do arq. e 337 da obra)

Há tendência em tratar os pacientes com diagnóstico de esofagite com IBP*, em dose plena*, por 6 a 12 semanas. Alguns autores propõem administração de dose dobrada (o dobro da dose plena) para as esofagites de maior gravidade (graus III e IV de Savary-Miller ou C e D de Los Angeles).”

* IBP, sigla para Inibidores da bomba protônica (Omeprazol, Lansoprazol, Pantoprazol, Rabeprazol e Esomeprazol).

* IBP Dose plena diária: Omeprazol 40 mg // Pantoprazol 40 mg (quadro 2, p 4). Para ambos, a dose dobrada é 80 mg por dia. em duas tomadas, manhã e tarde,

“Em estudo baseado em revisão sistemática de literatura, todos os IBP foram melhores que a ranitidina e o placebo na cicatrização da esofagite.” 

“A história natural da DRGE ainda não é bem compreendida. De fato, embora os sintomas sejam crônicos e muitas vezes recorrentes, usualmente a esofagite não progride com o passar do tempo. Assim, apenas pequena proporção (menos de 15% dos pacientes sem esofagite ou com esofagite leve) progride para graus mais avançados da doença. Vale salientar que cerca de 80% dos pacientes com DRGE apresentam recidiva dos sintomas nos seis primeiros meses de interrupção do tratamento  medicamentoso. Nos casos em que é requerido o tratamento de manutenção, este deve ser feito utilizando-se IBP, empregando-se a dose mínima eficaz para controle dos sintomas.”

“O grande problema com o tratamento clínico da DRGE não é controlar os sintomas, mas sim manter os pacientes assintomáticos a longo prazo.”

“Visa o alívio dos sintomas, a cicatrização das lesões e a prevenção de recidivas e complicações. Do ponto de vista prático, objetiva-se reduzir o potencial agressivo do conteúdo gástrico, minimizando a agressão representada pelo ácido clorídrico do suco gástrico. Pode-se classificar a abordagem terapêutica em medidas comportamentais e farmacológicas, que deverão ser implementadas simultaneamente.” 

QUADRO 1 – Medidas comportamentais no tratamento da DRGE:

• Elevação da cabeceira da cama (15 cm).
• Moderar a ingestão dos seguintes alimentos, na dependência da correlação com os sintomas: gordurosos, cítricos, café, bebidas alcoólicas, bebidas gasosas, menta, hortelã, produtos de tomate, chocolate.
• Cuidados especiais para medicamentos potencialmente “de risco”: anticolinérgicos, teofilina, antidepressivos tricíclicos, bloqueadores de canais de cálcio, agonistas beta adrenégicos, alendronato.
• Evitar deitar-se nas 2 horas após as refeições.
• Evitar refeições copiosas.
• Redução drástica ou cessação do fumo.
• Reduzir o peso corporal (emagrecimento).

v. 43 – no.4 – out./dez. 2006 Arq Gastroenterol p.337 – Disciplinas de 1 Cirurgia do Aparelho Digestivo e Coloproctologia e 2 Gastroenterologia Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Felicidade a todos, espero que tenha contribuído.

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Leia também o relato da Isabel Amaro sobre a “tosse coqueluche”. Destaco em seu relato as três fases da doença e o fato de ser contagiosa:


Veja a postagem original (4 de junho de 2013) com mais de duzentos comentários: https://juarezbarcellos.wordpress.com/2013/06/04/tosse-com-engasgo-noturno/
Leia também o relato da Isabel Amaro sobre a “tosse coqueluche”. Destaco em seu relato as três fases da doença e o fato de ser contagiosa: